Especial Mulheres

Cacau encanta, fortalece e empodera mulheres no interior do ES

Presidente da Associação Mulheres do Cacau de Rio Bananal, Márcia Ribeiro, deixou de ser professora para assumir as terras da família

Márcia Ribeiro, presidente da Associação Mulheres do Cacau de Rio Bananal.
Foto: Márcia Ribeiro

“A cultura do cacau é muito gratificante para a mulher”. A afirmação é da presidente da Associação Mulheres do Cacau de Rio Bananal, Márcia Ribeiro, que deixou de ser professora de História para se dedicar à plantação e assumir as terras da família.

Quase quatro anos após plantar os primeiros 2.400 pés de cacau da propriedade, a agricultora vai começar a colher os frutos do seu trabalho rural.

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Cacau, a virada de chave na vida de mulheres do ES

O “boom” da produção, diz Márcia, será no ano que vem, mas a virada de chave na vida das mulheres que decidiram se dedicar ao cacau já aconteceu.

Crescida na área rural, Márcia se mudou para Vitória para lecionar e, 12 anos depois, voltou às origens com a missão de assumir as terras do pai.

Encantada pela produção de chocolate que via nas feiras de agropecuária que visitava, ela decidiu apostar no cacau, mesmo sendo o café a tradição da família.

Pé de cacau
Foto: Márcia Ribeiro

“Eu herdei o terreno do meu pai e queria muito mexer com cacau, porque é uma cultura que me despertava interesse pela questão do chocolate. Minha primeira paixão, na verdade, era o chocolate. Aí eu falei: ‘Por que não investir em uma cultura que a família não investe?'”, relata.

Ela então tomou coragem, plantou os pés do fruto e manteve a produção de café também, hoje responsável pela renda da família junto com a oficina e aposentadoria do marido.

Capital x roça

A agricultora revela que nem só para cuidar das terras ela deixou as salas de aula. Márcia queria ter tempo para cuidar do filho.

“Antes mesmo de eu ir para a roça, eu já tinha largado a sala de aula porque, para falar a verdade, depois que eu tive filho ficou meio complicado administrar a questão de filhos e outras coisas que a gente tinha”.

A escolha de Márcia foi de mais tempo com a família, de administrar os negócios sem abrir mão de cuidar do filho, hoje com 18 anos.

Para ela, hoje é mais fácil conciliar o cuidado com o trabalho na plantação. O filho já está crescido e não depende tanto de atenção materna. O desafio passou a ser outro:

“Só não é mais fácil por causa da escassez de mão de obra e falta de qualificação, principalmente na área do cacau. Ou seja, além de ter a mão de obra escassa, você não encontra mão de obra qualificada para isso”, afirma Márcia.

Já em relação ao fato de ser uma mulher comandando um negócio rural, ela disse que não sentiu dificuldades. Mas nem sempre é assim.

Cacau para empoderar mulheres

O que hoje é a Associação das Mulheres do Cacau, antes era um projeto que, nas palavras de Márcia, “buscava trazer mais empoderamento e visibilidade para as mulheres que estavam trabalhando na roça com a cultura do cacau”.

Mulheres do Cacau
Foto: Márcia Ribeiro

“Muitas mulheres, mesmo trabalhando na roça juntamente com seus maridos, muitas vezes não se sentiam representadas ali como donas, como produtoras, porque tudo era mais voltado para o homem. Quem ajuda, quem faz tudo é a mulher, mas quem sempre responde é o homem”.

Hoje reunindo mais de 50 mulheres em cinco municípios (Rio Bananal, Linhares, Colatina, São Roque do Canaã e Santa Teresa), a Mulheres do Cacau é esta porta de entrada para o conhecimento sobre o fruto.

Mulheres do Cacau.
Foto: Márcia Ribeiro

A Associação oferece cursos e firma parcerias com diversos orgãos, como o Incaper, para que as agricultoras sejam capazes de administrar a própria propriedade e divulgar o trabalho.

“A capacitação é muito importante para saber como plantar, adubar, podar, fermentar. Então os cursos ensinam como produzir com qualidade para que a gente tenha valor agregado e, com isso, um valor maior do nosso produto”, explica a presidente.

Márcia começou assim. Buscando cursos, tentando entender como produzir o cacau que no futuro se torna chocolate e se aprimorando. No meio do caminho, conheceu o grupo e foi convidada a se juntar.

A decisão de transformar em associação o que era um projeto se deu pelo crescimento do grupo. “O projeto teve muita visibilidade, vários parceiros que quiseram conhecer o projeto, ajudar. E daí surgu a ideia: ‘por que não criar uma associação?'”.

A agricultora conta que desta maneira é mais fácil conseguir recursos, emenda parlamentar, e participar de projetos que, “fora de uma associação, talvez, não oferecesse a mesma oportunidade”.

“Meu papel, como presidente e membro da associação, é sempre estar buscando trazer cursos voltados para a área do cacau e também outros cursos que são do interesse das mulheres, porque a maioria, além da cultura do cacau, mexe também com o café aqui”, relata Márcia.

Curso Mulheres do Cacau
Foto: Márcia Ribeiro

E o trabalho do grupo tem dado resultado. A presidente conta que a demanda das mulheres está aumentando e elas estão, cada vez mais, à frente das terras, buscando inclusive cursos técnicos.

Nem tudo são flores

Muitas associadas relatam que depois que entraram no grupo “melhoraram”, “até mesmo em relação à depressão”, conta Márcia.

“Agrega muito para a gente, traz desenvolvimento. Você cresce como pessoa, aumenta o conhecimento na área. De forma geral é muito bom e gratificante”.

“Mas nem tudo são flores”, conta a agricultora, que enfrenta muitos desafios.

O dia a dia, relata ela, é cansativo e pouco estimulante devido à falta de mão de obra. “Às vezes você precisa fazer algo na sua roça que é prioridade, mas não tem como fazer porque você não tem mão de obra”.

“Me agregou muito, me fortaleceu, mostra que quando a gente quer, a gente consegue. Mas, por outro lado, tem essa realidade do meio rural. É bom? É, mas também é muto sofrido”, desabafa Márcia.

Ela, apesar de feliz e grata, também se sente desgastada e um pouco decepcionada, “não com a cultura em si, mas com a agricultura”.

Julia Camim Editora de Política
Editora de Política
Atuou como repórter de política nos veículos Estadão e A Gazeta. Jornalista pela Universidade Federal de Viçosa, é formada no 13º Curso de Jornalismo Econômico