Economia

Comércio em Vitória aberto aos domingos: o que muda para o trabalhador?

Nova lei, sancionada esta semana, autoriza o funcionamento de estabelecimentos comerciais na Capital aos domingos. Veja o que dizem juristas, sindicato, CDL e Fecomércio

Foto: Thiago Soares/Folha Vitória

A Prefeitura de Vitória sancionou a lei 10.018, que autoriza o funcionamento de estabelecimentos comerciais da Capital aos domingos. 

A norma, publicada no Diário Oficial do Executivo municipal na última terça-feira (26), permite ainda que a abertura do comércio neste período ocorra sem a necessidade de convenção coletiva. Ou seja, a nova lei descarta a realização de reuniões entre os sindicatos para tratarem sobre a jornada de trabalho dos funcionários.

O texto, de autoria do presidente da Câmara da cidade, vereador Leandro Piquet (Republicanos), e sancionado pelo prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), deixa a cargo dos comerciantes a escolha de abrir ou não seus respectivos restabelecimentos aos domingos.

Justificativa do projeto sancionado pela prefeitura, Piquet afirma entender como retrocesso o não funcionamento de estabelecimentos comerciais, entre eles supermercados, aos finais de semana.

“A manutenção dos estabelecimentos fechados nos fins de semana se mostra como um retrocesso a ser superado, tanto do ponto de vista da necessidade dos consumidores, quanto do ponto de vista do potencial de movimentação da economia capixaba”, diz o vereador no texto do projeto.

Em outro trecho do documento, ele ressalta que a norma até então proposta deve levar em consideração os direitos conquistados pelos trabalhadores do setor, como, por exemplo, o descanso semanal remunerado.

“Consideramos que, desde que se resguardem os direitos trabalhistas assegurados por lei e conquistados pelos trabalhadores – dentre eles o direito ao descanso semanal remunerado -, consideramos ser de grande importância a capacidade de acompanhamento do poder público das demandas vindas dos próprios trabalhadores e das mudanças que os novos tempos nos impõem”, frisa o parlamentar.

Veja quais estabelecimentos comerciais são beneficiados pela lei:

Lojas, supermercados, farmácias, shoppings, varejistas de peixe varejistas de carnes frescas e caça, varejistas de frutas e verduras, varejistas de aves e ovos, varejistas de produtos farmacêuticos (farmácias, inclusive manipulação de receituário), comércio de artigos regionais nas estâncias hidrominerais, comércio em portos, aeroportos, estradas, estações rodoviárias e ferroviárias, comércio em hotéis, comércio em geral atacadistas e distribuidores de produtos industrializados, revendedores de tratores, caminhões, automóveis e veículos similares comércio varejista em geral e demais empreendimentos similares. 

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O que dizem especialistas sobre os direitos dos trabalhadores com a nova lei?

Especialistas da área do Direito foram ouvidos pela reportagem do Folha Vitória nesta quinta-feira (28) para explicarem se haverá alguma alteração nos direitos dos trabalhadores do comércio com a sanção da nova lei em Vitória.

Muitos trabalhadores acreditam que o trabalho aos domingos no comércio resulta automaticamente em valores pagos a mais no salário, ou seja, a chamada “dobra” nas horas trabalhadas.

O advogado Empresarial Flávio Fabiano explica, no entanto, que onde há autorização para a funcionamento dos estabelecimentos aos domingos, o trabalhadores são remunerados como se estivessem em uma jornada regular de trabalho, como de segunda a sexta-feira, por exemplo.

Ocorre que este mesmo trabalhador não poderá trabalhar sete dias seguidos, ou seja, a cada seis dias trabalhados, deverá receber uma folga em dia a ser combinado com o seu patrão.

Foto: Acervo pessoal
Flávio Fabiano explica sobre dias trabalhados, folgas e pagamento

“A norma que trata sobre as relações de trabalho, a CLT, determina que nos serviços que exijam trabalho aos domingos, com exceção quanto aos elencos teatrais, será estabelecida escala de revezamento, mensalmente organizada e constando de quadro sujeito à fiscalização”, pontua o jurista.

Ele continua: “Então, o trabalhador só poderá laborar dois domingos seguidos e terá direito ao descanso semanal remunerado no terceiro domingo. Caso não obtenha folga nesse terceiro domingo seguido trabalhado, terá direito ao recebimento do valor da hora trabalhada em dobro, nos termos do artigo 9º, da Lei n° 605, de 05 de janeiro de 1949, que prevê o ‘Repouso semanal remunerado e o pagamento de salário nos dias feriados civis e religiosos”, destaca o especialista.

Relações trabalhistas não mudarão imediatamente, diz jurista

O advogado Eduardo Sarlo, também especialista em Direito Empresarial, por sua vez, ressalta que, a princípio, a nova lei não muda de imediato as relações trabalhistas. De acordo com ele, o que foi decidido em convenção coletiva continua valendo. 

“A convenção coletiva é mais poderosa do que a lei. Ela sempre prevalece para beneficiar o empregado. Nada muda em relação aos trabalhadores. Embora a prefeitura tenha liberado o funcionamento do comércio neste ano, isso só vai servir como moeda de negociação na metade do ano que vem, quando ocorrer uma nova convenção coletiva”, afirma. 

Foto: Divulgação
Eduardo Sarlo: “A convenção coletiva é mais poderosa do que a lei”

Sindicato dos comerciários diz que não foi ouvido

Representantes do setor comercial repercutiram a sanção da nova lei pela Prefeitura de Vitória. Sindicato dos Empregados do Comércio do Espírito Santo (Sindicomerciários), por exemplo, se manifestou contrário à norma.

O presidente do Sindicomerciários, Rodrigo Rocha, avalia a lei com um retrocesso e diz não ter havido debate com os setores interessados.

“Essa lei não é necessária e pode, inclusive, gerar um retrocesso. Qual a vantagem dessa lei? Não foi feito um debate antes de sancionar. Nós não fomos chamados ou o sindicato patronal (Fecomércio)“, disse Rodrigo Rocha.

CDL avalia que lei dá liberdade aos comerciantes

Já o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Vitória, Rogerio Abranches Alcantara, diz avaliar como positiva a sanção do projeto de lei pela prefeitura, uma vez que, segundo ele, a norma dá “maior liberdade aos comerciantes”.

“Nós somos favoráveis a essa lei, pois ela dá maior liberdade para o comerciante que entende que o domingo é um dia produtivo no setor, principalmente quem trabalha nos ramos de turismo e shoppings. Antes, precisava de ter as negociações com os sindicatos laborais, havia penalização com custos adicionais do trabalho e imposições de regras. Isso dificultava, porque o comerciante não tinha muita liberdade”, afirma.

Ele ainda acrescenta que, mesmo com a autorização de trabalhar aos domingos, os trabalhadores do comércio continuarão com seus direitos preservados.

“É claro que o direito dos trabalhadores continua preservado, como pagar por hora extra e folga. O que acontecia era uma insegurança muito grande, porque a legislação não expressava diretamente sobre o trabalho aos domingos. Agora, tudo é uma questão de bom senso para todos os lados. O comerciante, agora, poderá olhar para essa data mais tecnicamente, sem ter o receio do sindicato fazer exigências e, eventualmente, fechar o estabelecimento”, assevera.

Por meio de nota encaminhada à imprensa, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Espírito Santo (Fecomércio-ES) informa que o horário de abertura é sempre definido pelas empresas. 

Ainda de acordo com a Fecomércio, pela convenção vigente, já é autorizado o trabalho aos domingos, e que, com a lei publicada, a autorização se mantém em Vitoria.