ES é o estado mais transparente do Brasil
Nos últimos meses, a produção de vacinas ganhou destaque ao redor do mundo. Não à toa, cerca de 200 imunizantes estão sendo testados e mais de um bilhão de doses já foram administradas em todo o planeta. Afinal, elas são a maior esperança de superarmos uma das maiores pandemias da história da humanidade. Nesse sentido, a velocidade da fabricação, distribuição e aplicação de doses é fundamental para evitar mais mortes e contaminações.
Mesmo assim, por endereçar a causa errada, a política pode influenciar negativamente nesses acontecimentos. Um exemplo disso é o apoio à renúncia de patentes ocorridas nos Estados Unidos. Já no Brasil, a discussão dessas medidas entrou em pauta no Supremo Tribunal Federal (STF), que declarou que a extensão de patentes é inconstitucional em caso de demora na análise dos pedidos pelo Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Industrial).
A coluna de hoje traz uma crítica à flexibilização da propriedade intelectual, e entrevista com Luciano Timm, um dos advogados mais renomados em relação ao tema do país e sócio do Carvalho, Machado e Timm Advogados.
A Astrazeneca e as vacinas da Johnson & Johnson (J&J) e da Sputnik, por exemplo, são patenteadas em diversos países do mundo. Apesar disso, bilhões de doses foram produzidas, aumentando a oferta global. Ao analisar esse fenômeno do ponto de vista econômico, as patentes promovem incentivo às inovações, uma vez que a exclusividade na produção garante lucro aos detentores do bem ou serviço, impedindo que outras empresas copiem suas ideias por tempo determinado.
Contudo, para o caso das vacinas essas implicações não se aplicam. Isso porque os imunizantes são reais, ao contrário de ideias e projetos patenteados. Nessa lógica, para produzi-las também são necessários insumos reais. Além disso, na economia, as vacinas são um exemplo de bem de externalidade positiva, ou seja, o consumo individual beneficia terceiros que não pagaram por ela. No caso da gripe influenza, estima-se que a cada quatro mil doses aplicadas, uma vida é salva.
Assim, mesmo que as empresas tenham ganhos consideráveis com a produção de vacinas, eles nem sempre são suficientes para incentivar o aumento da oferta. Em suma, os produtores estão lucrando pouco! Nesse contexto, eventuais subsídios podem ser uma alternativa.
Cobrir os custos de produção é a melhor solução para aumentar a oferta
Provavelmente, o brasileiro tem um trauma relacionado aos subsídios, uma vez que essa medida, colocada em prática diversas vezes, não rendeu frutos positivos. Basta olhar o caso das campeãs nacionais ou das indústrias automotiva e naval. Mas, o caso dos imunizantes é particular, pois as empresas possuem custos consideráveis de pesquisa e desenvolvimento, produção e distribuição mesmo com a chance da vacina não ser eficaz e aprovada para o uso. E esse pode ser um impasse para o aumento da disponibilidade de imunizantes.
Geralmente, os subsídios não são uma boa prática. Contudo, para imunizar a população mundial, essa política pode ser bem sucedida. Não é coincidência que os Estados Unidos sejam o segundo que mais vacinou no mundo, atendendo aproximadamente 76% da população, com 252 milhões de vacinados até o dia 6 de maio. O mandato de Donald Trump gastou cerca de US$ 15 bilhões cobrindo os custos de fabricantes, por exemplo. Por outro lado, o governo Biden pagou US$ 269 milhões à Merck para reformar suas fábricas para produzir a vacina J&J.
O advogado Luciano Timm criticou a decisão do STF. “Abre a porteira para ativismo judicial, cria insegurança jurídica e desestimula investimentos, um combo trágico para inovação”, afirma. “Mudar uma lei que já vigorava por mais de 25 anos, sem nenhum fato novo, com base em um princípio e conceito indeterminado, sem considerar qualquer possível consequência prática, é um erro; a decisão do STF não trará melhores incentivos à inovação”, complementa.
“Os ministros que conhecem um pouco mais de análise econômica do direito e consequencialismo votaram a favor das patentes, outros foram para o lado da justiça social e, até mesmo, um certo populismo. Ficou claro nos votos que os juízes pouco conhecem de pragmatismo, no fundo não há nenhum fundamento consistente para se anular a regra”, declarou.
O professor da FGV explica que a patente é um conceito jurídico “muito preciso”, e que não configura um monopólio do ponto de vista de Direito Concorrencial. “Os concorrentes podem desenvolver produtos e inovações alternativos, não à toa há tantas vacinas da Covid-19 em todo o mundo”, compara.
Perguntado sobre o que a decisão representa para investidores, Timm acredita que não se trata de uma boa sinalização mudar uma regra do jogo com ele em andamento. “Ao contrário de outros BRICs, como Rússia, China e Índia, que desenvolvem tecnologia e possuem, inclusive, patentes de medicamento para Covid-19, o Brasil depende de transferência, o que nos faz normalmente recebermos tecnologia de segunda linha e termos acesso à tecnologias defasadas. Isso ocorre porque como o ambiente regulatório aqui não é seguro, ficamos com a sobra. A decisão piora esse ambiente”, analisa.
Decisão não é o fim do mundo
A despeito das críticas, Timm explica que a regra de proteção dos 20 anos de patente ainda persiste, apesar de não ser mais a mesma proteção.
“A decisão sinaliza um supremo muito populista, insensível com o ambiente de negócios. É preciso haver propriedade intelectual como uma estrutura de incentivos a fim de compensar investimentos. O que as industrias tiveram de fazer para gerar as vacinas?”, questiona.
Por fim, a suprema corte brasileira gera insegurança, inclusive, sobre eventuais flexibilizações futuras da propriedade intelectual industrial no Brasil.
A coluna e o STF
Não é o propósito da Data Business criticar o STF semanalmente. Porém, ainda não houve uma única semana desde nossa estreia em que a corte não tenha ficado sem dar alguma “bola fora” em julgamentos que tragam prejuízos ao ambiente econômico.
As informações/opiniões aqui escritas são de cunho pessoal e não necessariamente refletem os posicionamentos do Folha Vitória