Economia

Entidade suspeita de desviar R$ 2 bi do INSS repassou a buffet e firma de viagem

A Polícia Federal já identificou empresas que receberam transferências fracionadas da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura, apontada como participante de fraudes no INSS

Polícia Federal faz operação contra fraude em benefícios do INSS
Investigação aponta que fraudes no INSS ocorriam com desvios a entidades específicas. Crédito: Divulgação / Polícia Federal

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) é suspeita de desviar R$ 2 bilhões de aposentados do INSS entre janeiro de 2019 e março de 2024. Os cálculos são da Polícia Federal (PF). Nesse sentido, os investigadores miram agora os beneficiários das supostas fraudes. Do mesmo modo, a Federal já identificou que uma agência de viagens, uma empresa de locação de estruturas para eventos e um buffet receberam transferências fracionadas da Contag.

As informações são a partir de uma análise detalhada do fluxo financeiro da Contag. Ou seja, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) alertou a PF sobre a saída de R$ 26.457.531,95 das contas da confederação para 15 pessoas físicas e jurídicas ligadas aos setores de turismo, alimentação e eventos, além de federações estaduais vinculadas à Contag. Além disso, a entidade fracionou as transferências, o que levantou suspeitas sobre os desvios no INSS.

A confederação afirmou que coordena mais de 3,8 mil sindicatos e que “sempre atuou com ética, responsabilidade e tem se empenhado ativamente no aperfeiçoamento da gestão e na fiscalização dos projetos e convênios que administra”.

As movimentações suspeitas levaram o juiz Frederico Botelho de Barros Viana, da 15.ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, a autorizar buscas na sede da Contag e nos endereços de empresas que receberam transferências da confederação. A PF cumpriu os mandados na última quarta-feira, durante a Operação Sem Desconto, que teve ainda participação da Controladoria-Geral da União (CGU).

A investigação identificou um esquema fraudulento de deduções indevidas em benefícios de aposentados e pensionistas do INSS.

Enriquecimento com descontos via INSS

Em sua decisão, o juiz afirmou que há “indícios seguros” de que “responsáveis pela Contag. Disse ainda que, entre 2019 e 2024, realizaram (e continuam promovendo) descontos associativos indevidos de milhares de aposentados e pensionistas do INSS. A ação pode ter ocasionado enriquecimento ilícito dos envolvidos, com possível ocultação de patrimônio e de movimentações financeiras”.

Outro dado levantou suspeitas da PF. Em novembro de 2023, o INSS autorizou o chamado desbloqueio em lote de descontos em pelo menos 34 mil pensões e aposentadorias. Tudo em benefício da Contag. A PF afirma que a decisão atendeu a pedido da própria entidade. “Foi com base em justificativas que se mostraram infundadas e contrárias à legislação”.

Os beneficiários do INSS podem aderir a associações civis e sindicatos e autorizar descontos mensais em seus contracheques para cobrir custos de filiação. Para isso, as entidades devem estar habilitadas no INSS e precisam receber autorização “prévia, pessoal e específica” de aposentados e pensionistas interessados.

Para a PF, o desconto em lote ignorou a exigência de autorização expressa dos aposentados. Nesse sentido, “não se orientou por evidências que pudessem demonstrar a real intenção do segurado quanto ao desbloqueio do benefício para desconto”.

Megaesquema de fraude

A Contag está na lista de entidades suspeitas de envolvimento em um megaesquema de descontos não autorizados em aposentadorias e pensões pagas pelo INSS.

As suspeitas levaram o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, a pedir demissão após afastamento do cargo por ordem judicial.

Segundo a investigação, servidores no INSS forneceram os dados dos aposentados, mediante o pagamento de propinas. As informações foram cadastradas em associações suspeitas, sem o conhecimento dos aposentados, para operar os descontos indevidos nos contracheques.

Gestão

Em nota, a Contag afirmou que coordena federações estaduais e sindicatos. As entidades “atuam na luta pela garantia, manutenção e ampliação de direitos de mais de 15 milhões de trabalhadores rurais agricultores e agricultoras familiares”.

A confederação diz ainda que “tem se empenhado ativamente no aperfeiçoamento da gestão e na fiscalização dos projetos e convênios que administra, sempre em conformidade com as normas legais”.

“Neste momento, a entidade reitera seu respeito às instituições democráticas e o compromisso com a legalidade em todas as suas ações, e se coloca à disposição para colaborar com as investigações em curso, defendendo a total transparência do processo investigatório e apuração devida dos fatos”.