Em meio aos problemas econômicos enfrentados pelo país, o economista Mario Vasconcelos acredita que o Espírito Santo sofrerá um impacto menor em relação aos outros estados graças à vocação de exportação que o Estado carrega.
Sua análise em relação à recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, a CPMF, é na verdade uma analogia: “A história é que fizeram uma grande festa para poucos e agora todos terão que pagar a conta”.
Para o economista, paralisar obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é um prejuízo, já que foram gastos recursos para iniciá-los.
Confira a íntegra da entrevista:
Folha Vitória – Como o senhor vê esse momento econômico?
Mario Vasconcelos – Se fala dessa reforma tributária há algum tempo. O governo está tentando aumentar o percentual para que venha para os estados. A alíquota é de 0,2% para CPMF. O governo chamou os governadores da base aliada para discutir e negociar para que parte da arrecadação federal voltem para os estados e municípios, principalmente as áreas de saúde e educação.
FV – Como deve ficar com esse possível retorno da CPMF?
MV – O governo convidou os governadores para reunião em Brasília para tentar negociar. Quando foi extinta, a eram cobrados 0,38% de CPMF. Então, a negociação teria sido de 0,2% permanecer com o governo federal e 0,18% voltariam para os estados, já que os estados estão numa situação ruim. O Rio Grande do Sul, por exemplo, está pagando salário de servidor parcelado. Como a atividade econômica está em processo de recessão, isso afeta as arrecadações federal, estadual e municipal. Mas não há simpatia dos parlamentares com o retorno da CPMF. Já foi difícil acabar… A outra CPMF era provisória e demorou 10 anos e essa que tem previsão para acabar daqui a quatro anos? Como é que fica? Não há simpatia por parte do Congresso Nacional pela aprovação da CPMF.
FV – Qual a avaliação que o senhor faz da atual conjuntura econômica do país?
MV – A economia está desacelerada, mas 0,2% é um imposto que vem em cascata. Ele vai incidir em cada processo da produção. Por exemplo, quem produz um veículo, compra pneu e paga CPMF, volante e também paga imposto. Quando for vender o veículo, toda a movimentação financeira deverá incidir no produto. Como é imposto em cascata ele vai aumentando. Se o processo de produção passar por 10 fases diferentes, haverá o pagamento de 0,2% em cada fase. É cumulativo. Vai chegar na ponta, na hora de vender, quase com mais de 2%. Então isso fará com que os preços aumentem. Por exemplo, um trabalhador que recebe R$ 2 mil e for sacar o salário de uma vez só. Ao incidir o percentual, ele pagará R$ 4 de CPMF.
FV – Essa nova proposta é um sinal de desequilíbrio por parte do Governo?
MV – O que o governo está propondo, não só com o CPMF, vai taxar bens de capital. Vender imóvel antes tinha imposto de 15%. Por exemplo, um imóvel que custa R$ 20 milhões, ele pagará 30% de imposto, ou seja, R$ 6 milhões só de imposto. O governo tem que equilibrar seu orçamento, tem que arranjar R$ 30 bilhões e vai cortar gastos em torno de R$ 26 bilhões.
FV – Cortar ministérios seria uma solução?
MV – A redução do gasto com ministérios e cargos comissionados chegaria a R$ 200 milhões, então, a solução mesmo foi atrasar obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O problema é que se paralisa o negócio ou faz devagar, aumenta-se os custos. Isso tudo é consequência do que se fez anteriormente. O governo foi gastando e agora tem que pagar a conta. A história é que fizeram uma grande festa para poucos e agora todos terão que pagar a conta.
FV – E acabou refletindo na economia?
MV – Nossa economia está paralisada. De acordo com dados do Ministério do Trabalho e do Emprego, de janeiro a julho o Espírito Santo fechou mais de 20 mil postos de trabalho. Para ser exato foram 20.300 postos de trabalho de janeiro a julho 2015. E, claro, esses cortes refletem na economia do Estado. Ao transitar em shoppings e lojas, nós vemos a movimentação, mas as lojas estão vazias, apesar das promoções.
FV – E quais as perspectivas?
MV – Não há perspectiva de resolver o problema rapidamente. Serão dois, três anos para começar a sair dessa crise. Minha expectativa é que se comece a resolver em 2017.
FV – Embora a crise esteja aí para todos verem, o Espírito Santo parece que está na contramão da crise, parece que tem atraído investimentos. O senhor concorda?
MV – O Espírito Santo é bom de investimento. O ES tem a sua atividade econômica voltada para o mercado exterior.
FV – Os aliados do governo afirmam que a crise é mundial. O senhor concorda?
MV – Ao contrário do que a presidente afirma, a economia mundial está se recuperando. A Europa também está em recuperação. A China tem previsão de crescimento. Quando a economia externa começa a dar sinais de melhoria, isso favorece os estados exportadores, como é o caso do Espírito Santo. Além disso, o dólar valorizado em relação ao real é fator estimulante às exportações, é bom para os exportadores.
FV – Como funciona esse mecanismo da economia?
MV – A economia interna (do ES) tem problema, mas é diferente de outros estados que não têm característica de exportador. O Espírito Santo tem vocação para o comércio internacional e eu entendo que seja o estado mais globalizado do Brasil. Por que digo isso? Porque mais de 50% da atividade econômica do Estado é voltada para o mercado externo.
FV – O problema da perda do Fundo de Desenvolvimento das Atividades Portuárias (Fundap) também tem agravado essa crise interna?
MV – A perda do Fundap ocorreu desde 2013, então, já deu tempo para o Estado e municípios realinharem seus orçamentos. Claro que já penalizou o Espírito Santo, que perdeu uma grande arrecadação.
FV – O que deve ser feito?
MV – Quando se reduz ganhos, devemos olhar nossas despesas. Tanto os estados como os municípios devem repensar seus gastos, enxugar suas máquinas. Alguns municípios têm muitas secretarias. Há câmaras com muitos vereadores. Tem que cortar. Gastos precisam ser reduzidos. Todos temos que cortar, devemos olhar onde cortar para poder passar pela crise e
sofrer menos com ela.
FV – Quais são as soluções?
MV – É preciso utilizar melhor suas receitas, como os royaties do petróleo. Tem que ser o mais racional possivel. É preciso priorizar em acabar com a corrupção em todos os níveis.
FV – O caso da Petrobras foi emblemático?
MV – Basta ver o que se desviou, quantas obras foram superfaturadas. A refinaria em Pernambuco, que inicialmente custaria R$ 2 bilhões de reais e acabou com R$ 20 bilhões de investimentos.
FV – Como o senhor analisa esse problema, em especial?
MV – O governo é apressado. Planeja pouco. Quando vai se implantar uma obra, é preciso se fazer um estudo criterioso. Do contrário, o que acontece? Fica uma obra cheia de penduricalhos porque o planejamento foi mal feito. Quando a obra é do setor privado, se gasta muito tempo sentado no escritório planejando e na hora de executar faz-se poucas modificações. O desperdício de recursos no setor público é grande, não se pode desperdiçar. Tudo é escasso… Tecnologia, mão de obra, recursos são escassos. Não tem em abundância, então, tem que se utilizar da melhor forma possível. Veja o exemplo da água. Todos achavam que era um bem inesgotável. Bastou parar de chover e a água ficou escassa.