Não é só a blusinha

Greve na Receita afeta empresas, consumidores, e arrecadação

Protestos de funcionários da Receita por aumento de salários começaram no final de novembro. Cerca de 75 mil remessas expressas estão paradas em terminais

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Lentidão na liberação de cargas por parte da Receita pode afetar indústria em breve. Crédito: Thiago Soares/Folha Vitória

Estragos que afetam consumidores, indústrias e a arrecadação. Tudo por culpa da greve e operação tartaruga dos analistas tributários e dos auditores da Receita Federal e do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), órgão do Ministério da Fazenda. Nesse sentido, o movimento já dura dois meses e meio. Os servidores pedem reajuste salarial.

Não são só as “blusinhas” importadas que estão com a entregas atrasadas. Do mesmo modo indústrias de todos os portes reclamam da falta de componentes e até a arrecadação pode sofrer um revés. Ao mesmo tempo em um momento em que governo busca recursos para aliviar o déficit fiscal.

Cerca de 75 mil remessas expressas de importação e exportação estão paradas nos terminais alfandegários, segundo estimativas das empresas do setor, relatadas pelo presidente da Frente Parlamentar de Livre Mercado (FPLM), o deputado federal Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP).

Hoje o tempo de liberação nas aduanas é de 14 dias para cargas normais e de sete dias para cargas expressas. Antes da paralisação, eram 5 dias ou até dois para liberação, segundo Dão Real, o presidente do Sindifisco, que representa os auditores fiscais.

Prejuízos à Receita e ao governo

Por causa da paralisação, o Carf deixou de pautar 1.120 processos tributários em janeiro. Do mesmo modo, isso pode representar uma perda na arrecadação potencial do governo de R$ 51 bilhões, caso a decisão seja favorável à Receita.

“Se nada mudar, em fevereiro a Receita deve deixar de julgar processos cuja arrecadação potencial é de quase R$ 94 bilhões”, prevê o presidente do Sindifisco.

Tanto as indústrias que importam componentes como as que exportam produtos acabados estão sendo afetadas, segundo Helcio Honda, diretor jurídico do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp).

Ele conta que recebe relatos de indústrias de todos os portes. Elas reduzem o ritmo de produção por falta de componentes importados retidos. “A situação vai chegar ao bolso do contribuinte, porque tudo é custo e alguém repassa”, diz Honda.

O que desencadeou a paralisação ?

A paralisação e a operação-padrão que envolvem cerca de 7 mil auditores fiscais e 6,5 mil analistas tributários em todo país começaram no dia 26 de novembro de 2024. A defasagem salarial de 27,46% entre janeiro de 2019 e dezembro de 2024 é o motivo do protesto. O percentual é de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). O piso salarial de um analista tributário é R$ 13 mil mensais. No caso de um auditor fiscal, o salário base é de R$ 20 mil.

Segundo o Sindireceita e o Sindifisco, que representam analistas tributários e auditores fiscais, o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI) descumpriu um acordo selado com a categoria.

O compromisso fechado com o MGI era de que até julho do ano passado seriam abertas negociações para reajustar os salários dos auditores fiscais e dos analistas tributários. “No entanto, o governo abriu negociações e fechou acordos com várias categorias do funcionalismo público. Contudo, nossa carreira ficou sem negociação”, afirmou o presidente do Sindireceita, Thales Freitas.

Questionado pela reportagem, o MGI informou que “o acordo com as entidades dos auditores fiscais da Receita Federal foi fechado em fevereiro de 2024, em uma mesa específica e temporária de negociação. A reunião tratou da regulamentação do bônus, com impacto financeiro para os servidores já em 2024 e pactuado até 2026″.

Já a Receita Federal informou, por meio de sua assessoria, que não vai comentar a questão.

Honda, do Ciesp, diz que a entidade enviou nota ao governo, alertando sobre os desdobramentos da paralisação. “O governo tem de resolver esse problema, tem de abrir um canal de negociação”, afirma o dirigente da indústria.