Artigo Ibef-ES

Arbitragem: um método que privilegia a autonomia da vontade das partes

Diferentemente dos processos judiciais tradicionais, a arbitragem permite que os envolvidos tenham um papel na definição das regras

Foto: Freepik.
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*Artigo escrito por Teuller Pimenta Moraes, advogado, jurídico interno da empresa Ghisolfi Logística e Transporte e membro do Comitê Especial de Tributação Empresarial do Ibef-ES e do Ibef Academy.

A arbitragem tem se consolidado como um dos métodos preferidos para a resolução de conflitos entre particulares, especialmente em contextos comerciais e empresariais. Essa preferência decorre, em grande parte, de sua capacidade de valorizar a autonomia das partes envolvidas no litígio.

Diferentemente dos processos judiciais tradicionais, a arbitragem permite que os envolvidos tenham um papel ativo na definição das regras e procedimentos, criando um ambiente mais flexível e adaptado às suas necessidades.

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No Direito brasileiro, há diversas formas de solucionar conflitos. Uma delas é a negociação, em que as partes dialogam diretamente para tentar chegar a um acordo.

Outra opção é recorrer a uma terceira pessoa que facilita a comunicação e busca ajudar as partes a encontrarem uma solução conjunta, conhecida como mediação ou conciliação. Caso as partes prefiram, podem levar a questão ao Poder Judiciário, no qual um juiz analisará o caso e tomará a decisão adequada, caracterizando o processo judicial.

Por fim, também é possível escolher que uma pessoa decida a questão de forma privada, sem a intervenção do Estado, sendo esta forma conhecida como arbitragem.

Arbitragem: sem juízes

A arbitragem, então, pode ser definida como um método privado para a resolução de disputas jurídicas, permitindo que as partes resolvam seus conflitos sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário (e sem a atuação de juízes).

Esse mecanismo é caracterizado pela sua voluntariedade: ninguém pode ser forçado a participar de um processo arbitral contra sua vontade.

Ao optar pela arbitragem, os envolvidos abrem mão de levar o caso ao Poder Judiciário, selecionando árbitros de sua confiança para tomar a decisão sobre a questão em disputa.

Embora a arbitragem já esteja presente na legislação brasileira há bastante tempo, seu uso se intensificou a partir de 1996, com a promulgação da Lei nº 9.307, conhecida como Lei de Arbitragem.

Atualmente, ainda mais pessoas e empresas têm feito uso da arbitragem. Dados da Câmara de Arbitragem Empresarial – Brasil (Camarb) apontam crescimento anual médio de 20% no número de arbitragens relacionadas a discussões laborais entre patrões e empregados, por exemplo.

Rapidez é um dos atrativos

Um dos maiores atrativos da arbitragem é a rapidez com que os conflitos são resolvidos. Em comparação com a morosidade característica do sistema judiciário brasileiro, a arbitragem se destaca por sua agilidade.

A partir do momento em que as partes escolhem os árbitros e definem um cronograma, o processo segue de forma célere, com a decisão sendo proferida em meses, e não em anos. Essa celeridade é especialmente relevante em disputas comerciais, em que o tempo de resolução impacta diretamente as operações e a viabilidade dos negócios.

Relacionado a isso, a arbitragem contribui também para a redução da sobrecarga do sistema judiciário, ao retirar das cortes um número considerável de casos. Isso permite que os tribunais possam se concentrar em questões que realmente demandam a intervenção do Estado.

Ao optar pela arbitragem, as partes não apenas encontram uma solução mais rápida para seus conflitos, mas também colaboram para a eficiência do sistema de justiça como um todo, fortalecendo o ambiente jurídico do país.

Processos arbitrais têm menor formalidade

Outro ponto chamativo é que os processos arbitrais são caracterizados por uma menor formalidade em comparação aos processos judiciais. Isso se traduz em menos burocracia e maior foco na resolução do conflito, permitindo que as partes e os árbitros construam um ambiente mais adequado para o diálogo e a busca por soluções.

A ausência de formalismos complexos favorece uma condução mais rápida das sessões, sem comprometer a qualidade da decisão.

A arbitragem também se destaca por garantir um alto nível de confidencialidade, o que é essencial em disputas que envolvem informações estratégicas e segredos comerciais. Enquanto os processos judiciais são, em regra, públicos, na arbitragem as partes podem optar por manter sigilo sobre os procedimentos e as decisões.

Isso evita a exposição de informações sensíveis ao mercado, preservando a reputação das empresas e permitindo que elas mantenham suas operações com discrição. A confidencialidade, portanto, não só protege os interesses das partes, mas também incentiva a utilização da arbitragem em contextos onde a privacidade é fundamental.

Um dos aspectos mais valorizados na arbitragem é a definitividade das decisões. As sentenças arbitrais, em regra, não são passíveis de recurso, o que evita o prolongamento do conflito em instâncias superiores e confere segurança jurídica às partes. Isso significa que uma vez proferida a decisão, ela é definitiva, garantindo estabilidade e previsibilidade.

Decisões arbitrais

Nesse ponto, vale destacar que o Judiciário tem, cada vez mais, validado as decisões arbitrais. Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça sobre pedido de anulação de sentenças arbitrais revelou que é necessária a comprovação de um vínculo forte e direto do árbitro com uma das partes, e bem como de alguma vantagem financeira, para que seja caracterizada quebra da imparcialidade no julgamento.

Na ocasião, a 3ª Turma do STJ manteve, em junho deste ano, a sentença arbitral proferida numa disputa milionária envolvendo duas empresas de serviços hospitalares. Foi a primeira decisão de uma turma do STJ em que a questão central analisada foi o dever de revelação (REsp 2101901).

A parte recorrente argumentou que o árbitro omitiu que o escritório de advocacia do qual faz parte presta serviços a uma terceira empresa de saúde, a qual possui relação comercial com a parte vencedora na arbitragem.

A ministra Nancy Andrighi, por sua vez, destacou que não foi comprovada relação societária entre as duas empresas e, mesmo que houvesse, isso por si só não seria suficiente para determinar a parcialidade do árbitro e consequente anulação da sentença arbitral.

Decisões nesse sentido reforçam a segurança jurídica da arbitragem no Brasil ao estabelecer que a nulidade de uma sentença arbitral não pode ser baseada em meras omissões, promovendo, em verdade, um comportamento de boa-fé por parte das figuras envolvidas.

O que se observa é o dever de curiosidade das partes ao aceitarem resolver seus problemas pela arbitragem. Isto é, antes da aceitação do árbitro, as partes têm o ônus de se informar a respeito de fatos públicos e de fácil acesso, podendo realizar pesquisas por conta própria para se assegurar do correto exercício do dever de revelação pelo árbitro. A liberdade de escolher traz consigo a responsabilidade da escolha!

Lei da arbitragem

Diante de tudo isso, é incontestável que a arbitragem é um método que prioriza a autonomia da vontade, pois permite que as partes envolvidas no conflito exerçam total controle sobre o processo de resolução, desde a escolha dos árbitros até a definição das regras que guiarão o procedimento.

Cita-se, como exemplo, o que dizem os artigos 2º e 13º da Lei da arbitragem, em seus parágrafos:

Art. 2º A arbitragem poderá ser de direito ou de eqüidade, a critério das partes.
§ 1º Poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública.

Art. 13. Pode ser árbitro qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes.
§ 1º As partes nomearão um ou mais árbitros, sempre em número ímpar, podendo nomear, também, os respectivos suplentes.
§ 2º Quando as partes nomearem árbitros em número par, estes estão autorizados, desde logo, a nomear mais um árbitro. Não havendo acordo, requererão as partes ao órgão do Poder Judiciário a que tocaria, originariamente, o julgamento da causa a nomeação do árbitro, aplicável, no que couber, o procedimento previsto no art. 7º desta Lei.
§ 3º As partes poderão, de comum acordo, estabelecer o processo de escolha dos árbitros, ou adotar as regras de um órgão arbitral institucional ou entidade especializada.

Essa característica fundamental faz com que a arbitragem seja um mecanismo altamente flexível e adaptado às necessidades específicas de quem opta por esse caminho. Os envolvidos não são meros expectadores, mas lhe são permitidos que exerçam um papel ativo na condução de seus processos.

Assim, ao combinar rapidez, flexibilidade, especialização e confidencialidade, a arbitragem se destaca como uma alternativa eficiente ao sistema judicial tradicional.

Em um cenário cada vez mais dinâmico e complexo, a possibilidade de escolher como e por quem serão resolvidas as disputas é um diferencial valioso, que tem impulsionado a popularidade da arbitragem entre empresas e indivíduos em todo o mundo.

Seja em litígios nacionais ou internacionais, a arbitragem oferece uma solução que alia segurança jurídica, eficiência e respeito à vontade das partes, sendo uma escolha ideal para quem busca agilidade e resultados justos em suas disputas.

Este texto expressa a opinião do autor e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo.