*Artigo escrito por Júlia Leite Coutinho, mestre em Contabilidade pela Fucape. Contabilista pela Fucape e advogada formada pela Ufes. Hoje atua na área de Finanças da ArcelorMittal e Conselheira do CQC de Economia do IBEF-ES.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anunciou uma medida significativa na última reunião ao decidir pela redução da taxa básica de juros, conhecida como Selic. A taxa, que estava em 13,25% ao ano, foi cortada para 12,75% ao ano.
Primeiramente, é importante destacar que a decisão foi unânime entre os diretores do Copom, o que indica um consenso sobre a necessidade de reduzir a taxa Selic para estimular a economia e controlar a inflação.
A justificativa apresentada pelo Copom é que essa redução é compatível com a estratégia de convergência da inflação para a meta estabelecida, que inclui os anos de 2024 e 2025.
Essa é a segunda redução consecutiva na Selic, o que a leva ao menor patamar dos últimos 16 meses.
Essa movimentação não foi uma surpresa para o mercado financeiro, pois o Copom já havia sinalizado anteriormente que poderia continuar reduzindo a taxa na mesma magnitude do corte adotado em agosto, ou seja, de 0,5 ponto percentual.
No comunicado divulgado após a reunião, o Copom também enfatizou a importância da serenidade diante do cenário econômico e destacou que, se o cenário esperado de desinflação e ancoragem das expectativas em torno da meta de inflação se confirmar, haverá novas reduções na Selic nas próximas reuniões.
Além disso, o Copom ressaltou que a execução das metas fiscais estabelecidas pelo governo federal desempenha um papel crucial no processo de ancoragem das expectativas de inflação e na condução da política monetária.
No cenário internacional, o Copom está atento à elevação das taxas de juros de longo prazo nos Estados Unidos e à perspectiva de menor crescimento na China, fatores que podem afetar as economias emergentes.
Paralelamente, a economia brasileira apresenta indicadores que sinalizam uma desaceleração da inflação, embora o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) tenha registrado uma alta de 4,61% nos 12 meses até agosto, o que indica uma pressão inflacionária.
É importante observar que houve uma desaceleração em relação ao período anterior. Isso demonstra que a inflação está sob controle e caminhando para níveis mais moderados.
Além disso, o Banco Central reconheceu a resiliência da atividade econômica brasileira, que demonstrou ser mais robusta do que as projeções iniciais.
No entanto, o Copom continua a antecipar um cenário de desaceleração nos próximos trimestres, indicando que estão atentos aos desdobramentos da economia e prontos para tomar medidas adicionais, caso necessário.
Brasil deixa o pódio de países com as maiores taxas de juros reais
Com essa redução, o Brasil ocupa a quarta posição no ranking de países com as maiores taxas de juros reais, que desconta a expectativa de inflação.
Esse ranking se baseia nas taxas básicas de juros dos países, considerando apenas os integrantes do G-20 e a União Europeia, que compõem cerca de 85% do Produto Interno Bruto (PIB) global.
A Argentina lidera esse ranking, com taxas de juros reais de 32,1%, seguida pela Rússia, com 7,9%, e pelo México, com 7,4%. O Brasil vem em seguida com taxa de 6,5%. Antes do corte da Selic, o Brasil estava em segundo lugar nessa lista.
Essa mudança no cenário reflete as políticas econômicas adotadas por cada nação para lidar com questões de inflação e crescimento.
O Brasil foi o primeiro país da América Latina a aumentar suas taxas de juros, antes de países como Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai.
Durante grande parte do período entre março do ano passado e maio deste ano, manteve a posição de país com a maior taxa de juros real do grupo analisado.
No entanto, a tendência mudou com os cortes nas taxas de juros ocorridos nos últimos meses. Essa compilação de dados foi elaborada pelo Valor Data, com base em informações do Boletim Focus do Banco Central.
O que isso significa para a economia e para o bolso dos brasileiros?
Para as empresas, a redução da Selic é vista como um estímulo para a atividade econômica e, consequentemente, os investimentos.
É preciso cautela nos reais impactos, tendo em vista que mesmo com a queda da Selic as taxas de juros para empresas ainda se mantêm em patamares relativamente elevados, girando em torno de 23%, segundo relatório de crédito do Banco Central.
Isso significa que os empréstimos para empresas continuam sendo custosos, o que pode impactar seus planos de expansão e de investimento.
Essa situação também impacta diretamente os consumidores brasileiros, uma vez que as taxas de juros mais altas tornam o crédito mais caro e inacessível para muitos, tornando o crédito mais acessível e barato para os brasileiros.
Com taxas mais baixas, os brasileiros podem encontrar condições mais favoráveis para adquirir bens de alto valor, como automóveis e imóveis, além de ser uma oportunidade para renegociar dívidas e reduzir os encargos financeiros.
Apesar da redução da Selic, as taxas de juros para pessoas físicas ainda são consideravelmente altas, com uma média de 58,5% ao ano. Isso torna o acesso ao crédito mais caro e restrito para os brasileiros, dificultando o consumo e a realização de projetos pessoais.
Em um cenário de redução da Selic, espera-se que o custo do crédito também diminua gradualmente, tornando os financiamentos e empréstimos mais acessíveis para a população.
De acordo com a pesquisa do IPC Maps, divulgada pelo jornal Valor Econômico em junho, as famílias brasileiras devem gastar cerca de 6,7 trilhões ao longo de 2023.
Esse montante representa uma alta real de apenas 1,5% em relação a 2022, o que indica um cenário de consumo menos aquecido. Essa projeção de consumo das famílias para 2023 coincide com dados calculados pela FGV, que prevê um aumento mais modesto de 2% no consumo
Os principais gastos das famílias em 2023 incluem habitação, com uma participação expressiva de 25,3%, seguido pelo gasto com veículo próprio, que representa 11,7% do total. Alimentação no domicílio também é um gasto relevante, com 9,2% de participação.
O motivo para essa alta menor do consumo das famílias é o contexto macroeconômico desfavorável ao consumo devido à inflação persistente, além do crédito mais caro e restrito para os consumidores.
Conclusão: desafios e oportunidades das taxas de juros na economia brasileira
A redução da Selic é uma resposta ao cenário de desaceleração dos preços e à resiliência da economia brasileira, mas também reflete a necessidade de cumprimento das metas fiscais do país.
O impacto dessa decisão nos juros cobrados de empresas e consumidores ainda será observado nos próximos meses, mas a expectativa é que essa medida contribua para um ambiente econômico mais favorável.
Em resumo, a decisão do Copom de reduzir a Selic é um passo importante na busca pela estabilidade econômica, mas o impacto concreto nas taxas de juros para empresas e consumidores dependerá de diversos fatores e será observado nos próximos meses.
Além disso, o cenário de consumo das famílias reflete a cautela diante do contexto macroeconômico desafiador, no qual a inflação e as taxas de juros ainda afetam o poder de compra e os hábitos de consumo dos brasileiros.