Artigo Ibef-ES

Menos abundância e mais escassez: o efeito das leis protecionistas

Leis protecionistas com tarifas, subsídios e cotas de importação podem levar à escassez e afetar a economia, aumentando a miséria

Foto: Freepik
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*Artigo escrito por Diana Mantovani, formada em Direito na Faculdade de Direito de Vitória (FDV), sócia fundadora da Diluz e membro do IBEF Academy.

“Que é melhor para o homem e para a sociedade: a abundância ou a miséria?”. Essa é a frase que o escritor liberal francês Frédéric Bastiat inicia o capítulo “Abundância, Miséria”, no livro “O que se vê e o que não se vê”.

De prontidão, a resposta é óbvia: a abundância é o melhor caminho. Com abundância há disponibilidade e acessibilidade de recursos materiais e imateriais em quantidades suficientes para atender às necessidades e aos desejos da população.

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Esses recursos podem incluir alimentos, água, energia, bens de consumo, educação, tempo livre, entre outros.

Leis protecionistas: tarifas e cotas de importação

No entanto, as atitudes do Estado brasileiro, muitas vezes, vão de encontro à ideia de abundância.

Ao implementar leis protecionistas que instituem tarifas e cotas de importação, subsídios governamentais e regulamentações excessivas para produtos importados, o Estado opta pelo caminho da miséria, já que limita a oferta de forma a encarecer os preços e restringir o acesso da população a uma variedade maior de bens e serviços.

Pela Lei da Oferta e Demanda, os preços de bens e serviços são determinados pelo mercado, baseado na interação entre a oferta – quantidade disponível de um bem ou serviço – e a demanda – quantidade que os consumidores estão dispostos a comprar esse bem ou serviço.

Consumidores competem pelos recursos limitados

Nesse sentido, em situações de escassez, a quantidade disponível de um bem ou serviço é limitada em relação à demanda.

Com menos disponibilidade, os preços tendem a subir, já que os consumidores competem pelos recursos limitados.

Já em situações de abundância, a quantidade de um bem ou serviço disponível é maior do que a demanda. Com mais disponibilidade, os preços tendem a cair, já que os consumidores têm mais opções e não precisam competir intensamente por um recurso abundante.

Nesse teor, para Bastiat:

O consumidor torna-se mais rico quanto mais ele compra todas as coisas a melhor preço. Ele compra coisas a melhor preço, na proporção em que elas se apresentem em abundância. Logo, a abundância o enriquece. E este raciocínio, estendido a todos os consumidores, conduziria à teoria da abundância.

Paradoxalmente, o papel do Estado na economia frequentemente inclui a implementação de leis e regulamentações que restringem a abundância de recursos e bens, por meio das políticas protecionistas.

Limitação da oferta disponível no mercado

De acordo com o recorrente discurso a favor dessas leis, estas são desenhadas para proteger indústrias nacionais, mas muitas vezes resultam em uma limitação da oferta disponível no mercado, pois impedem a livre concorrência.

Um exemplo notório e atual foi a “taxa da blusinha”, inserida no Projeto de Lei 914/2024, já aprovado pelo Senado Federal, que institui uma alíquota de 20% de imposto de importação federal em compras de até US$ 50 feitas por pessoas físicas.

Trata-se de uma carga tributária que encarece a entrada de produtos baratos no país, direcionado principalmente para pessoas de baixo poder aquisitivo. 

O argumento utilizado para que o Estado tomasse essa atitude foi a busca pelo tratamento isonômico entre produtos importados, sobre os quais eram cobrados apenas ICMS, enquanto indústria e varejistas brasileiros eram cobrados ICMS e impostos federais, o que provocava concorrência desleal entre tais produtores e comerciantes. 

Pessoas com menor poder aquisitivo são mais vulneráveis

Apesar do argumento de alcançar a isonomia ser válido, ao resolver tributar mais ainda os produtos importados, ao invés de deixar de tributar de impostos federais os produtos brasileiros, e, portanto, permitir que eles participem de forma mais ativa do jogo da concorrência, o Estado diminui a abundância desses produtos no Brasil.

Com isso, faz com que as pessoas de menor poder aquisitivo sejam as mais prejudicadas. 

Outro caso é a aplicação de altas tarifas de importação em produtos eletrônicos, que visa proteger a indústria nacional ao influenciar a produção interna, mas resulta em preços elevados para os consumidores e menor variedade de produtos disponíveis.

Também é possível citar a imposição de cotas de importação, como as que existem no setor automotivo, o que contribui para reduzir a competitividade e a variedade de opções para os consumidores. 

Um exemplo claro das consequências de políticas protecionistas mal planejadas pode ser observado na Argentina, especialmente nas últimas décadas.

Argentina implantou barreiras comerciais

Durante os governos de Cristina Kirchner, entre 2007 e 2015, o país implementou uma série de barreiras comerciais, como tarifas de importação elevadas e controles de câmbio, com o objetivo de proteger a indústria nacional.

No entanto, essas medidas, longe de trazer prosperidade, resultaram em escassez de produtos básicos, como eletrônicos e insumos industriais, além de inflação descontrolada.

A inflação acumulada no governo Kirchner atingiu 25% ao ano, em média, e chegou a mais de 40% em 2014, segundo Mises Brasil (2016).

Além disso, a proteção excessiva às indústrias locais reduziu a competitividade e a capacidade de inovação das empresas argentinas, fazendo com que os consumidores tivessem que pagar preços exorbitantes por produtos de menor qualidade.

Esse cenário culminou em uma crise econômica profunda, na qual a escassez de bens e serviços agravou a miséria da população, especialmente das classes mais baixas, que não conseguiam arcar com os altos custos de vida.

Essas medidas também levaram a uma fuga de capitais e ao aumento da dívida externa, de forma a piorar a situação fiscal do país. Isso exemplifica como o protecionismo pode resultar em efeitos negativos, já que amplia as desigualdades e limita a abundância de bens no mercado.

Leis acabam desencadeando aumento de preços

Assim, exemplos como os citados ilustram como as ações do Estado, embora com o discurso de desenvolvimento interno, podem inadvertidamente criar condições de escassez e limitar a abundância de bens e serviços para a sociedade.

Portanto, leis que seriam para fomentar o desenvolvimento do país desencadeiam o aumento de preços, de forma a dificultar a acessibilidade. 

É preciso, mais do que apenas consentir com o discurso do Estado, entender as consequências de prosseguir com tais ações. As leis protecionistas são contra a abundância. Elas costumam terminar em miséria. 

REFERÊNCIAS

BASTIAT, Frédéric. O que se vê e o que não se vê. São Paulo: Instituto Ludwig Von Mises Brasil, 2010. 

MISES BRASIL. Governo argentino manipulou o PIB e a inflação – e Cristina se dolarizou quando isso era proibido. Disponível em: https://mises.org.br/artigos/2254/o-governo-argentino-manipulou-o-pib-e-a-inflacao-e-cristina-se-dolarizou-quando-isso-era-proibido. Acesso em: 22/10/24.

Este texto expressa a opinião do autor e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças do Espírito Santo