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Imposto seletivo: entenda seus impactos econômicos e sociais

O imposto seletivo na reforma tributária: conheça os detalhes e controvérsias desse tributo regulatório na vida dos brasileiros

Foto: Freepik
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Artigo escrito por Sandro Ronaldo Rizzato, advogado, sócio fundador da PRL sociedade de advogados.

Dentro do escopo da reforma tributária recentemente aprovada, o Imposto Seletivo, popularmente conhecido como “imposto do pecado”, surge como um dos pontos mais controversos.

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Apresentado como um tributo regulatório, com o objetivo de desestimular o consumo de produtos prejudiciais à saúde, ao meio ambiente ou socialmente nocivos, ele tem gerado críticas tanto por seu caráter arrecadatório quanto pelos impactos econômicos e sociais que pode desencadear.

Imposto seletivo: ferramenta regulatória

Como sempre, a “narrativa” oficial posiciona o imposto seletivo como uma ferramenta regulatória, ficará comprovado que sua verdadeira finalidade é aumentar a arrecadação tributária.

Produtos como cigarros, bebidas alcoólicas, combustíveis fósseis, extração, carros a “pilha” e alimentos ultraprocessados estão entre os principais alvos do tributo, mas há uma falta de clareza sobre quais critérios estão sendo usados para definir quais itens são considerados “nocivos”.

Por trás do argumento de proteção à saúde pública e ao meio ambiente, existe a preocupação de que o imposto funcione como uma “cortina de fumaça” para justificar a elevação da carga tributária em produtos que possuem alta demanda, especialmente em classes menos favorecidas.

Camadas mais pobres da população sofrerão impacto maior

O caráter altamente regressivo do imposto seletivo recairá de forma desproporcional sobre as camadas mais pobres da população.

Isso ocorre porque os itens sujeitos ao tributo, como bebidas alcoólicas e alimentos ultraprocessados, são consumidos em maior proporção por essas classes sociais.

Ao encarecer produtos amplamente acessíveis, o imposto acaba restringindo mais ainda o poder de compra dos consumidores de baixa renda, que já é péssimo frente a desvalorização da moeda brasileira, sem oferecer alternativas viáveis ou incentivos claros para mudanças de comportamento.

Preços mais altos e falta de acesso aos produtos

A lógica de desestimular o consumo por meio de imposição tributária com único viés de arrecadação, ira refletir em preços mais altos ignorando as dificuldades financeiras enfrentadas por grande parte da população, para quem esses produtos, muitas vezes, são os mais acessíveis.

Na maioria dos países que institucionalizaram o chamado impostos seletivos de maneira isolada, teve comprovada ineficácia no alcance de seus objetivos regulatórios.

Bebidas e cigarros: risco maior de clandestinidade

No caso de bebidas alcoólicas, por exemplo, o aumento de preços pode até reduzir o consumo formal, mas incentiva a produção e o comércio de alternativas ilícitas, como bebidas clandestinas.

O mesmo vale para cigarros, cuja tributação elevada historicamente fomentou o contrabando e a comercialização de produtos de baixa qualidade, muitas vezes ainda mais prejudiciais à saúde do que os produtos regulamentados.

Em vez de promover saúde pública, essa dinâmica gera mais desafios para os órgãos reguladores, que também não funcionam no pais, criando riscos adicionais para a população.

Impacto na indústria de alimentos, bebidas e combustíveis

O imposto seletivo também representa um grande impacto sobre setores inteiros da economia, como as indústrias de alimentos, bebidas e combustíveis.

Empresas que operam nesses segmentos já enfrentam uma carga tributária elevadíssima que devem repassar os custos adicionais para os consumidores, gerando aumento do custo do produto ou serviço, o que certamente resultará na redução das vendas e, consequentemente, na diminuição de empregos.

Além disso, a ausência de critérios claros para a aplicação do imposto gera insegurança jurídica para as empresas, que não conseguem prever como o tributo afetará seus produtos no longo prazo.

A percepção de arbitrariedade pode afugentar investimentos, especialmente em setores já pressionados por regulação excessiva.

Necessidade de políticas complementares

Embora o imposto seletivo seja apresentado como um mecanismo para desestimular o consumo de combustíveis fósseis e outros produtos ambientalmente prejudiciais, ele parece ignorar a necessidade de políticas complementares.

A taxação, por si só, não resolve o problema ambiental, especialmente em um país onde alternativas sustentáveis ainda não estão amplamente disponíveis ou acessíveis.

Em contrapartida a essa narrativa, foi incluído no imposto do pecado os veículos EV (100% elétrico), com a peja que a não há definição da destinação das baterias ao final da vida útil do carro, conceito esse desprovido de fundamentação técnica e científica.

Tributação de combustíveis fósseis: consumidores penalizados

E na toada contrária, a tributação de combustíveis fósseis, que será menor ou ausente em contrapartida da elétrica, também poderá penalizar consumidores e pequenas empresas que dependem de veículos movidos a gasolina ou diesel, sem oferecer incentivos concretos para a transição para energias limpas.

Essa abordagem não apenas é ineficaz, como também pode ser percebida como injusta por grande parte da sociedade.

Não obstante a tudo acima, outro ponto de crítica ao Imposto Seletivo é a ausência de um debate público mais aprofundado sobre sua regulamentação. A falta de transparência no processo legislativo e a pressa em aprovar a reforma tributária como um todo resultaram em um tributo cuja abrangência e impacto ainda são pouco compreendidos pela população e pelos setores produtivos.

Sandro Rizzato é advogado. Foto: Acervo pessoal

Além disso, não há garantias de que a arrecadação obtida com o imposto seletivo será destinada a políticas públicas voltadas à saúde, ao meio ambiente ou à mitigação dos efeitos econômicos sobre os mais pobres.

Essa ausência de vinculação reforça a percepção de que o tributo é apenas uma estratégia para aumentar a receita do governo. Lembram da CPMF que foi criada com o fito de resolver a saúde do país? Então? Todos temos a resposta.

Mais problemas do que soluções

Embora a ideia de um tributo seletivo para produtos prejudiciais possa parecer positiva em teoria, a forma como o imposto seletivo foi estruturado na reforma tributária apresenta mais problemas do que soluções.

Seu caráter regressivo, os impactos econômicos e sociais desproporcionais e a falta de critérios claros para sua aplicação colocam em xeque sua eficácia como ferramenta regulatória.

Se o objetivo é promover saúde pública, sustentabilidade ambiental e justiça social, o governo e o legislativo deveria adotar uma abordagem mais ampla e integrada, com políticas complementares que ofereçam alternativas viáveis ao consumo desses produtos.

Sem isso, o imposto do pecado corre o risco de se transformar em mais um fardo injusto sobre a população brasileira, especialmente a mais vulnerável, visando somente aumento de arrecadação para o cofre público, cada dia mais pesado e mal administrado.