Economia

Nath Finanças faz palestra no ES com dicas de economia para jovens da periferia

Influenciadora digital, que ficou famosa no YouTube por um canal de educação financeira para pessoas de baixa renda, traduz termos econômicos de forma prática

Foto: Pedro Campos/divulgação

Conselhos comuns de economistas como “guardar 30% de sua renda”, “guardar R$ 1 mil de seu salário” podem ser ótimos na teoria, mas não são uma verdade absoluta para a influenciadora digital, consultora e administradora Nathália Rodrigues, mais conhecida como a Nath Finanças.

Ela é famosa nas redes sociais por falar de educação financeira para, como ela diz, “pessoas reais”. Gente que tem que pagar os boletos, que muitas vezes tem que fazer um trabalho extra para complementar a renda, que conta com o dinheiro contado no fim do mês, ou que abriu recentemente um negócio e está perdido em meio a termos como capital de giro, MEI, microcrédito entre outros conceitos.    

“Conselhos e orientações que não estão alinhadas à realidade da maioria dos brasileiros são as que me incomodam mais. É uma fórmula que pode até funcionar, mas não para a maioria, porque se eu não sou capaz de seguir essas orientações, no final, posso me sentir culpada, mas a verdade é que eu não tive acesso”, explica. 

Comandando um canal com mais de 290 mil inscritos no YouTube e 449 mil seguidores no Instagram, ela protagoniza, como convidada especial, uma palestra dentro do evento “Educação Financeira e Periferia”, realizado pelo Instituto Oportunidades Brasil (IOB), nesta terça-feira (28), às 19h, no auditório do Sebrae Vitória, na Enseada do Suá, na capital. O evento é aberto ao público. Para participar, é necessário fazer a inscrição no link: https://bit.ly/Palestradanath.

Segundo a organização do IOB, será uma conversa de jovem para jovem. O instituto, criado em 2020 e com sede em Vitória, busca a inclusão de jovens negros em situação de vulnerabilidade social nos cenários educacional e profissional, além de promover ações de igualdade racial. No Espírito Santo, segunda a Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (Pnad), pretos e pardos representam 63% da população.

“Sabemos que o povo negro e periférico são os que mais sofrem com a desigualdade econômica do país e a pandemia agravou e escancarou ainda mais esse cenário. O IOB vem para dar acesso e oportunidades para essa população e a Nath Finanças, referência em educação financeira vem compartilhar seu conhecimento em lidar com as finanças, para mostrar ser possível avançar neste aspecto de ter uma saúde financeira mais saudável”, explica a cofundadora do Instituto Oportunidades Brasil, Verônica Lopes.

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Também no evento, a cofundadora vai orientar sobre edital do Programa Oportunidades Brasil, que está aberto e oferece curso gratuito de Formação em Tecnologia exclusiva para pessoas negras.

A reportagem do Folha Vitória conversou com Nath Finanças. Confira entrevista abaixo. 

O que te levou a criar seu canal, que hoje é um sucesso nas redes sociais?

Minha experiência pessoal, como estudante e assalariada, me levou a perguntar o motivo de não encontrar informação sobre investimentos e orientação financeira acessível na Internet. Em 2017, eu era uma jovem aprendiz que recebia um salário mínimo e o que via disponível de informação definitivamente não cabia na minha realidade. Era uma baita frustração. E eu sei que também é uma realidade para a maioria dos brasileiros que não tiveram quase ou nenhum acesso a orientação financeira em sua vida toda.

Foi então que em 2019, decidi começar a gravar vídeos que eram divulgados para quem me seguia, amigos e familiares. Tudo era feito em casa, depois que eu chegava de uma longa jornada de trabalho e faculdade, de forma simples, com um celular e um pano de fundo. Listei as principais informações que eu gostaria de aprender, apertei o botão “gravar” e comecei. Meu ponto de partida foi esse e é o que me conduz até hoje: dados claros, simplificados e explicados de forma que qualquer pessoa possa entender e passar a aplicar em sua vida.

Eu foco em dar exemplos que as pessoas possam se identificar, eu falo de finanças reais para pessoas reais. E a minha forma de comunicar foi chave, pois eu trouxe representatividade e acesso. Eu sei o que os brasileiros estão passando e a falta de conhecimento é algo que pode ser mudado.

Você fala que aborda economia real para pessoas reais. Na sua visão de influenciadora, quais são essas “pessoas reais” que estão sendo ignoradas pela grande maioria que desenvolve assunto de economia e investimentos na web?

Desde o surgimento do canal, em 2018 até este momento, onde mantenho uma plataforma de conteúdos, me atentei a todas as realidades que se apresentaram para mim, através da minha comunidade. Meu slogan, “Finanças Reais para Pessoas Reais” caminhou com o desenvolvimento da minha comunidade, que atualmente não é formado somente por pessoas baixa renda e assalariadas, mas também pessoas que foram promovidas, que criaram seus próprios negócios, e que não sabem como cuidar de seu dinheiro de forma organizada.

Falando agora da situação do Brasil, remeto ao começo de 2020, com a chegada da pandemia, quando eu falava sobre dicas de economia doméstica e cuidados com o dinheiro na nova realidade que se apresentava. Só que a minha audiência tinha perdido o emprego, não tinha renda. Rapidamente mudei o foco para falar do auxílio emergencial (nem aprovado tinha sido na época, em março). Precisei mudar a rota, abordar quitação de dívida e negociação, e isso segue até hoje. Os efeitos da pandemia no bolso do brasileiro foram devastadores.

Eu sei que é um desafio enorme conversar com quem não está conseguindo garantir o básico dentro de casa, não vê possibilidade de ter um lazer com a família, por exemplo, por isso tenho falado ainda mais sobre a urgência de se comprometerem a entender suas finanças, anotar seus gastos e começar a ter um controle financeiro diante das dificuldades que estamos enfrentando.

Num momento bastante crítico de nossa economia, em que parte da população está usando crédito para comprar comida e itens básicos, como é possível falar de investimento?

Mesmo com a economia em estado crítico, as pessoas continuam buscando informações sobre como investir, porque temos diversos tipos de públicos. Há pessoas que estão na linha da pobreza, onde não conseguem fazer nada além de comprar itens básicos e, mesmo assim, são pessoas que convivem com a falta de tantos itens essenciais à sobrevivência. Essa pessoa precisa de assistência, de políticas públicas.

Ao mesmo tempo, há brasileiros que conseguem guardar dinheiro, mesmo que esse valor seja R$ 10, R$ 20 e até R$ 30. Devemos continuar a falar sobre educação financeira e investimentos, porque as pessoas continuarão buscando informações e aprender sobre esse assunto, e, mais do que nunca, é preciso saber como investir para não cair em armadilhas, esquemas de pirâmides ou golpes. Então, sim, podemos falar de investimentos mesmo passando por um momento crítico da economia, porque há procura sobre o tema.

E por falar nisso, o cartão de crédito ainda é o maior vilão do orçamento doméstico? De que forma a gente consegue tê-lo como uma ferramenta e não como um problema?

É verdade que o cartão dá uma sensação de que temos dinheiro, mas não podemos perder de vista que, quando não temos como cobrir a dívida, teremos que se virar para pagar uma dívida que cresce rapidamente. A primeira dica que deixo é a regra das três perguntas: 1) Tem como pagar à vista? 2) É urgente? 3) Consigo juntar o dinheiro para pagar à vista? Se você tem a possibilidade de esperar e fazer o pagamento à vista, por que entrar em uma dívida, não é mesmo?

Gastos do dia a dia devem ser evitados, ainda mais se você tem mais de um cartão. Os limites para pessoas de baixa renda costumam ser baixos, então fique de olho para não acumular parcelas em vários cartões. Use o cartão de crédito para emergências e principalmente, para fazer compras de bens duráveis e que são muito caros para pagar à vista e preste atenção à quantidade de parcelas: quanto mais longo o prazo, mas você pode se enrolar ao longo dos meses. Parcele no máximo de três a quatro vezes a compra que você vai fazer ou economize para antecipar o pagamento de parcelas.

Outra dica é não pagar o mínimo da fatura, pois é uma baita armadilha e você pode se afundar nos juros rotativos, que estão entre os mais caros do mercado! Lembre-se sempre que o cartão não pode ser considerado uma extensão do seu salário ou dos seus ganhos. Pense: se não tiver dinheiro suficiente para quitar suas faturas integralmente, é sinal de que seu gasto está sendo maior do que você pode arcar.

Organize-se financeiramente, faça um compromisso com sua planilha de gastos e conheça seus hábitos financeiros. O cartão de crédito deve ser um aliado dos seus planos e ser usado a seu favor.

Você destaca em seu conteúdo que educação financeira não é simplesmente colocar a culpa em nossos gastos, nos nossos desejos de compra. É possível, então, este equilíbrio, ou seja, posso usufruir do meu salário sem me endividar?

É preciso entender que quando eu falo sobre educação financeira, é para oferecer um conhecimento que possibilite a pessoa ampliar o conhecimento sobre a sua relação com o dinheiro, para que essa pessoa consiga ter saúde mental para encontrar alternativas de cuidado com essa renda e que, sim, faça planos e realize. Educação financeira não é fazer voto de pobreza. Não é para que a pessoa pense que deva se privar das coisas, pelo contrário, é para dar o poder de escolha e não cair nas armadilhas que estão diante da gente há tanto tempo.

Quais as frases que te incomodam nos conselhos dados por economistas e influenciadores da área e que já se tornaram lugar-comum e longe do cotidiano?

Conselhos e orientações que não estão alinhadas à realidade da maioria dos brasileiros são as que me incomodam mais. “Guardar 30% da sua renda”, “Guarde R$ 1.000 do seu salário” e a sugestão de fazer “renda extra” são problemáticas para mim. É uma fórmula que pode até funcionar, mas não para a maioria, porque se eu não sou capaz de seguir essas orientações, no final posso me sentir culpada, mas a verdade é que eu não tive acesso.