ARTIGO IBEF

Brasil, estatais e investimentos no exterior: pernas, para que vos quero!

Quanto maior a fatia do capital social nas mãos do Estado, maior sua influência, em especial quando é sócio controlador

IBEF-ES

Redação Folha Vitória
Foto: Freepik
*Artigo escrito por Leonardo Pastore, assessor de Investimentos, professor da pós-graduação da Escola Superior da Procuradoria-Geral do Estado, procurador do Estado e membro do Comitê Qualificado de Conteúdo de Finanças do IBEF-ES.

Nos últimos dias, o noticiário político e econômico nos abasteceu com inúmeras reportagens e opiniões sobre a influência do Poder Executivo Federal na Petrobras e na Vale. No primeiro caso, a política de dividendos; no outro, a sucessão da empresa. O mercado reagiu mal. 

As ações negociadas na Bovespa tiveram grande volatilidade, com PETR4 chegando a cair 13% num único pregão. Logo em seguida, um dos membros do Conselho da Vale renunciou pela “evidente e nefasta influência política” na escolha do futuro CEO da companhia.

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Empresas de capital aberto possuem seu patrimônio dividido em ações negociadas na bolsa de valores. 

A gestão dessas companhias é feita segundo a vontade da maioria dos votos dos acionistas. Eles podem ser pessoas físicas ou jurídicas, sendo que o próprio Estado (União, Estados e Municípios) pode explorar atividade econômica como único acionista (empresa pública), acionista majoritário (empresa de economia mista) ou mesmo minoritário, conforme Leis 6.404/1976 e 13.303/2016.

A disciplina legal permite que o Estado tenha voz na gestão das empresas proporcionalmente à sua participação acionária, podendo, por exemplo, indicar membros do Conselho de Administração. 

Quanto maior a fatia do capital social nas mãos do Estado, maior sua influência, em especial quando é sócio controlador.

Neste cenário, é muito comum ouvir-se o receio de se investir em ativos de alta fatia governamental. Em tempos de polarização política, o argumento é ainda mais recorrente. 

Credita-se que governos possam usar uma companhia segundo seu viés político ideológico, ainda que o regramento da Lei das S/A proíba expressamente tal prática.

Para evitar a mão da política nos negócios em que participam, outros investidores optam por companhias 100% privadas. 

Porém, ainda que não possuam entes públicos dentre seus sócios, elas também se submeterão à influência direta do Estado, que possui o dever constitucional de intervir na economia, seja por meio de subvenções diversas, como pela disciplina do cotidiano das organizações de todos os setores, já que o artigo 174 da Constituição Federal eleva o Estado a agente normativo e regulador da atividade econômica.

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Então, há uma obviedade que merece ser reforçada. Sob determinados aspectos, o risco de investir numa empresa sem participação estatal direta eventualmente será próximo daquela que possui o Estado como sócio, eis que a depender da regulação da atividade e do conjunto normativo que sobre ela legitimamente se lançar, preços, margens e resultados serão afetados, tal como se percebe em inúmeros casos (desde a majoração da carga tributária às obrigações administrativas que engessam o processo produtivo). 

Além do mais, é o Estado quem concede incentivos fiscais ao empresário que outrora não incomodava a concorrência, mas num instante passa a deter grande fatia do setor. Quer dizer, mesmo quando não é acionista, o Estado movimenta fortemente o mercado.

Num exemplo, o que você acharia se tendo uma cesta de ações de bancos privados descobrisse o aumento repentino do IOF nas operações financeiras, afetando seus lucros? (Sim! O Chefe do Poder Executivo – leia-se, Presidente da República, tem o poder de aumentar o IOF por decreto, sem ouvir o Legislativo – Constituição, art. 153, parágrafo 1º). 

E, noutro caso, se tivesse cotas de um fundo imobiliário com investimentos em logística portuária e o Executivo elevasse o Imposto de Importação, de Exportação e o IPI até certos níveis tal como lhe permite a Constituição? 

Como ficariam os resultados destes negócios após a majoração dos tributos? O Estado não precisa ter o poder de indicar um CEO de uma empresa para que o mercado e suas projeções desabem de um minuto para o outro!

Qual a solução para investir seu dinheiro? Se o risco Brasil soa evidente pela influência direta e indireta do Estado nos rumos da economia, a diversificação internacional nos investimentos é um caminho eficiente para retirar da carteira parte da volatilidade causada por ingerências políticas nos mercados.

Se antes investir no exterior era complexo e algo restrito às grandes fortunas, o avanço da tecnologia permite abrir uma conta internacional sem maiores custos ou burocracia, até por aplicativo de celular.

A carteira no exterior servirá não só para alcançar ativos mais “independentes” da política local, mas também para acessar mercados mais maduros no nível da regulação, afinal, o que aconteceria lá fora se influências políticas em companhias privadas se fizessem conhecidas ou se tornassem ferramentas de um ou outro governo?

Claro, ainda que fora do risco Brasil, não se espera que o controle de Estados estrangeiros passe longe de onde está o dinheiro. 

Porém, a maturidade republicana de alguns países pode socorrer investidores de um vai e vem político que cintila em cada estação por aqui, conferindo certa estabilidade ao mercado que naturalmente já balança por si só e dispensa a longa manus estatal neste movimento.

Se a evolução institucional pode durar gerações, decisões tardias nos investimentos podem custar caro. 

Sem dúvida, as circunstâncias atuais são favoráveis à diversificação no exterior, mas os mercados mudam rapidamente e o IOF ainda baixo nas remessas internacionais (0,38%) pode ser elevado por simples decreto do Poder Executivo em qualquer tempo, ou seja... pernas, para que vos quero!

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