O Tribunal de Contas da União (TCU) identificou que os guardas portuários que atuam no Porto de Vitória estão trabalhando em uma carga horária mensal inferior da que consta em seus contratos de trabalho. Atualmente a jornada mensal da categoria, prevista em Acordo Coletivo de Trabalho (ACT), é de 144 horas, mas o TCU constatou que essa carga deveria ser de 180, o que representa uma diferença de 36 horas por mês. A nova escala de trabalho passou a valer nesta segunda-feira (4).
De acordo com o TCU, as horas a menos trabalhadas pelos guardas portuários representam um prejuízo de cerca de R$ 3 milhões para a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), que administra o porto, e são destoantes da prática de mercado consagrada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). O Tribunal afirma ainda que tal diferença de carga horária afronta o princípio da economicidade e da eficiência.
O TCU identificou também, no Relatório de Auditoria Anual de Contas, horas extras habituais geradas, principalmente, por essa escala de trabalho prevista no acordo coletivo.
Com base nessas constatações, o órgão notificou a Codesa para que reveja a carga horária dos guardas portuários. A questão, no entanto, tem gerado impasse entre a direção da companhia e o Sindicato da Guarda Portuária no Estado do Espírito Santo (Sindguapor).
O sindicato considera que a mudança na carga horária é prejudicial para os trabalhadores e reclama do fato de a Codesa impor esse aumento na carga horária às vésperas das partes fecharem um novo acordo coletivo. O Sindguapor alega ainda que a mudança na jornada contraria o Plano de Cargos e Salários da categoria e o edital do último concurso para guarda portuário, realizado em 2015.
De acordo com o diretor administrativo do sindicato, Regis Siqueira, a jornada proposta pelo TCU será muito pesada para os trabalhadores e poderá afetar até o lado psicológico.
“Isso impacta diretamente no dia a dia dos guardas portuários, o que não é benéfico para a saúde dos trabalhadores, principalmente neste momento de pandemia. Isso está sendo imposto e vai abalar os profissionais. Estamos nos sentindo ameaçados”, disse o diretor administrativo do Sindguapor.
“A situação é ruim para todos. Tem trabalhador que assume o posto de madrugada, então tem que se deslocar de casa para o trabalho em um horário muito perigoso. E para a empresa, acaba sendo um gasto extra, já que ela precisa disponibilizar transporte particular para os trabalhadores”, completou Siqueira.
O diretor jurídico do sindicato, Rodrigo Brandemburg, afirmou que a categoria decidiu levar o caso à Justiça do Trabalho, que deverá analisar o dissídio nos próximos dias. Informou ainda que, na próxima semana, os trabalhadores realizarão uma nova assembleia e que a possibilidade de greve não está descartada.
“A categoria não quer a greve e estamos totalmente abertos ao diálogo com a empresa. Vamos aguardar os próximos acontecimentos para decidirmos quais medidas tomaremos”, afirmou.
Sobre a questão das horas extras, apontadas pelo TCU, Brandemburg afirmou que elas não possuem relação com a carga horária dos guardas portuários. “Essa hora extra é causada pela redução de efetivo. Até hoje os aprovados no último concurso público não foram convocados”, alegou.
Codesa
Por meio de nota, a Codesa afirmou que “a sociedade brasileira não tem mais tolerância com ações e práticas que se apoderam do discurso do interesse público para legitimar interesses privados. Quando isso ocorre é a sociedade que acaba pagando”, destacou a empresa.
A Codesa afirmou ainda que a medida adotada pela companhia causou resistência e culminou com a decisão da guarda portuária, em assembleia geral da categoria, de não assinar o Acordo de Trabalho, que estava em fase de conclusão, e optar pelo dissídio.
Ainda segundo a Codesa, a diretoria ofereceu quase 7% de reajuste salarial aos trabalhadores, retroativos a janeiro deste ano; reajustes do auxílio-alimentação; auxílio-educação; auxílio-babá; auxílio-creche; auxílio funeral. Além disso, ofertou-se plano de saúde, seguro de vida, manutenção do auxílio-cultura, adicional por tempo de serviço, empréstimo sem cobrança de juros e remuneração de horas extras, horas noturnas e adicional de férias em patamares substancialmente superiores aos previstos em lei, dentre outros benefícios.
A empresa destaca que uma proposta idêntica foi oferecida e aceita pelos demais trabalhadores da companhia, que não são guardas portuários, numa negociação respeitosa com o Suport-ES. “Mas a diretoria do SindiGuapor-ES, diferentemente, optou pelo dissídio, pleiteando a manutenção da escala de trabalho que foi proibida pelo TCU, e gerava prejuízos na ordem de R$ 3 milhões / ano para os cofres públicos”, ressaltou a Codesa.
A empresa também destacou que, a partir da vigência da escala de 180 horas por mês, a mesma subsidiará transporte por aplicativo para os profissionais que assumirem ou deixarem a escala na troca de turno, no horário da madrugada. Também definiu que fica mantida a cobertura do plano de saúde para os guardas portuários e seus dependentes, sem prejuízos à saúde desses trabalhadores e seus familiares.
A diretoria da Codesa, no entanto, destaca que “não transige com atos ilegais e não colocará a sociedade como refém do interesse corporativo de uma categoria e seu sindicato representativo”.