*Artigo escrito por Davi Menegon, administrador com MBA em Finanças e Investimentos, sócio e assessor da The Wall Investimentos e membro do Comitê Qualificado de Conteúdo de Economia do IBEF-ES.
O novo arcabouço fiscal no cenário político brasileiro
No palco político brasileiro, foi observada à recente aprovação do novo arcabouço fiscal do ministro Fernando Haddad na Câmara dos Deputados, com uma expressiva margem de 372 votos a favor.
Tal acontecimento convida a uma reflexão não apenas sobre a maioria conquistada pelo presidente Lula no Congresso, mas principalmente sobre a recorrente predisposição de Brasília em encontrar um denominador comum quando se trata de elevar despesas.
Aumento de gastos: um reflexo de ambições eleitoreiras
Políticos de todas as correntes ideológicas têm a tendência de embarcar na proposta de aumentar gastos sem considerar suas ramificações.
Essa prática não é nova, nem surpreendente e acaba por permitir aos políticos redirecionar mais fundos para suas bases eleitorais e iniciar novas obras públicas muitas vezes desnecessárias.
A divisão da esquerda e o modelo argentino: as consequências de uma economia descontrolada
A cisão na esquerda durante as discussões sobre o novo arcabouço fiscal chama a atenção. A ala mais radical ansiava por algo mais aberto, com mais espaço para gastos, mesmo que isso signifique imprimir moeda sem restrições, que acarreta no aumento da inflação.
É provável que muitos estejam familiarizados com as consequências desastrosas dessa política.
Basta olhar para a Argentina, cuja economia tem sido uma montanha-russa de instabilidade.
A falência do modelo argentino, resultante dessa estratégia descontrolada, deve servir como um sinal de alerta para o Brasil.
A desvalorização da moeda e o caminho argentino
A desvalorização da moeda é um risco iminente nesse cenário. Com a desaceleração econômica e o decréscimo de investimentos estrangeiros, a tendência é que o real perca valor.
Esse cenário desenha um caminho perigosamente similar ao da Argentina, cuja economia seguiu a estratégia econômica que a ala mais radical da esquerda apoia.
No entanto, é importante lembrar que a Argentina está tão falida que suas reservas líquidas em dólares acabaram. Com isso, o país tem vivido sérias dificuldades para realizar comércio internacional.
A rota da insustentabilidade: reflexões sobre a política econômica atual
A situação atual do Brasil aponta para uma rota de aumento de gastos e endividamento. Este é um caminho insustentável a longo prazo e levará nossa economia à falência. Não é uma questão de “se” isso pode acontecer, mas sim de quando isso ocorrerá.
O governo Lula mostrou-se favorável aos gastos nos setores de educação e de saúde como prioridade. Mas expressou que, por serem de suma importância, não precisariam ser contabilizados. Neste ponto que reside o problema.
É incontestável o investimento necessário em saúde e educação, mas precisam ser considerados dentro do cenário econômico do país.
A exclusão dessas despesas do orçamento levanta preocupações válidas. Esses gastos inevitavelmente impactam as finanças do país.
O Brasil parece caminhar para um cenário insustentável de despesas e endividamento. Essa realidade parece ser acentuada pelo recente arcabouço fiscal proposto pelo governo Lula.
Um novo conjunto de políticas propõe mudanças significativas na economia do país, como a flexibilização do teto de gastos – originalmente estabelecido para limitar o crescimento das despesas públicas de acordo com a inflação do ano anterior.
Agora, a flexibilização permite um aumento das despesas governamentais, principalmente em setores prioritários como saúde e educação.
Além disso, uma revisão da Regra de Ouro está sendo considerada, permitir que o governo contraia dívidas para pagar despesas correntes em casos excepcionais, o que poderia abrir espaço para um aumento do endividamento.
As novas propostas estabelecem que as despesas do governo crescerão acima da inflação, variando entre 0,6% e 2,5% ao ano. Essa estratégia é conhecida no campo econômico como um “mecanismo anticíclico”.
Em termos mais simples, um mecanismo anticíclico é uma política destinada a suavizar as flutuações do ciclo econômico. Ele age em direção oposta à fase atual do ciclo – por exemplo, impulsionando a economia durante uma recessão, e resfriando-a durante uma expansão –, com o objetivo de manter a estabilidade econômica.
No entanto, apesar dessa intenção de estabilidade, essa medida pode resultar em uma expansão do papel do Estado na economia, o que poderia levar a ineficiências e distorções de mercado.
O novo arcabouço também limita o crescimento da despesa primária a 70% da variação da receita dos 12 meses anteriores.
Embora intencionada como uma medida de controle fiscal, há a preocupação de que a receita possa ser inflada por meio de aumentos de impostos, prejudicando o crescimento econômico e a liberdade individual.
As metas do governo incluem a eliminação do déficit público da União no próximo ano, e a geração de um superávit orçamentário de 0,5% do PIB em 2025 e 1% do PIB em 2026.
Embora a saúde fiscal seja um objetivo louvável, o caminho para alcançá-la pode ser preocupante se for por meio de um aumento de impostos ao invés da redução de gastos.
Já a previsão de estabilização da dívida pública da União em 2026 a no máximo 77,3% do PIB levanta questões sobre como essa meta será alcançada.
Se for por meio de medidas que aumentam a eficiência e reduzem o tamanho do governo, poderá haver um apoio considerável.
Contudo, se for às custas de aumentos de impostos ou de um aumento da inflação, as consequências podem ser prejudiciais.
No início do ano, Haddad já havia mencionado sobre corte de despesas. O plano era cortar 50 bilhões de reais em gastos e arrecadar algo em torno de 250 bilhões, alcançando, dentro de um cenário otimista, um superávit 11 bilhões.
Mas os números revelam uma história diferente: na verdade, estamos observando uma projeção de um déficit aumentado para 136 bilhões de reais.
O objetivo proposto é equilibrar o déficit até 2024, o que requer a geração de pelo menos 150 bilhões de reais em receita, provavelmente por meio da arrecadação de impostos.
Além disso, se aspiramos alcançar um superávit de 1% ao ano até 2026, será inevitável a implementação de mais tributações.
Com a recente aprovação do novo arcabouço fiscal, prevê-se um futuro com maior volume de despesas públicas, o que, infelizmente, pode acarretar mais problemas para o futuro.
O fantasma da CPMF, taxação do e-commerce e o impacto nos mais pobres
Para buscar aumento de arrecadação de impostos, Carlos Lupi, ministro da Previdência Social, sinalizou que há estudos para a criação de uma nova CPMF, o infame imposto sobre transações.
Esta proposta, conhecida popularmente como “imposto do Pix”, tem um efeito sobre as pessoas mais pobres. Aqueles com acesso a pagamentos internacionais e criptomoedas terão meios de evitar essas taxas, enquanto os mais vulneráveis sentirão o impacto total.
Os impostos sobre o e-commerce estão se tornando outra dor de cabeça. A ideia de que os impostos devem ser pagos antes do envio do produto, cobrados diretamente no site de compra, afetará aqueles que não têm a capacidade de comprar no exterior. Novamente, são os mais pobres que serão mais afetados.
A preservação de valor e proteção do capital
Frente a esse cenário, é crucial buscar formas de preservação de valor e proteção do capital.
Diante do risco de quebra e desvalorização do real, é previsível que o governo busque controlar depósitos, dólares e saídas de capital. Portanto, a proteção de ativos se torna uma necessidade.
A importância do entendimento econômico
O entendimento econômico se torna fundamental em momentos de crise.
As decisões tomadas pelos governantes afetam diretamente a vida de todos, por isso é crucial que a população entenda o que está acontecendo na economia do país e tenha uma opinião informada sobre as decisões tomadas.
A necessidade de reformas estruturais
Mais do que nunca, é necessário implementar reformas estruturais que contribuam para a estabilização econômica e para o desenvolvimento sustentável do Brasil.
As reformas devem ter como foco o equilíbrio fiscal, a simplificação tributária e a modernização da infraestrutura do país.
O equilíbrio fiscal
O equilíbrio fiscal é essencial para manter a estabilidade econômica do país. Isso significa evitar déficits exorbitantes e a criação constante de novos impostos.
Uma política fiscal responsável permite ao país manter a inflação sob controle e evitar a desvalorização da moeda.
A simplificação tributária
A simplificação do sistema tributário brasileiro é uma medida necessária para aumentar a competitividade do país.
A complexidade atual desencoraja o investimento, tanto interno quanto externo, e contribui para a evasão fiscal.
Uma reforma tributária abrangente pode facilitar a compreensão do sistema por parte dos contribuintes, melhorar a eficiência da arrecadação e contribuir para um ambiente de negócios mais justo e transparente.
A modernização da infraestrutura
A modernização da infraestrutura brasileira é fundamental para o desenvolvimento econômico.
Isso inclui não só a melhoria das estradas, portos e aeroportos, mas também a expansão e melhoria dos serviços de internet e telecomunicações.
Uma infraestrutura de qualidade é fundamental para atrair investimentos e aumentar a produtividade do país.
A importância da educação
Além disso, é crucial investir em educação. A formação de uma população qualificada é essencial para o crescimento sustentável do país.
Uma educação de qualidade contribui para a criação de novas empresas, inovação e aumento da produtividade.
A necessidade de transparência e responsabilidade
Para que essas reformas sejam bem-sucedidas, é preciso haver transparência e responsabilidade por parte dos governantes.
A população deve ter acesso a informações claras sobre as políticas implementadas e seus impactos. Além disso, os governantes devem ser responsabilizados por suas ações e decisões.
Um elemento ainda mais preocupante ao considerar a gestão dos gastos governamentais é o risco de corrupção.
A história recente do Brasil revela uma série de casos em que membros do governo foram condenados por práticas corruptas.
Dada essa realidade, dar carta branca para aumentar os gastos pode ser visto como abrir a porta para mais corrupção.
Conclusão
Em última análise, a gestão responsável e transparente das finanças públicas é um dos pilares de uma sociedade próspera.
O novo arcabouço fiscal brasileiro parece bastante arriscado, inclusive considerando os próprios objetivos do atual governo.
Como já temos observado, a meta é plausível, mas o caminho que está sendo trilhado leva o país ao endividamento, aumento da arrecadação de impostos e da inflação.
Finalmente, é fundamental lembrar que a situação econômica de um país não muda da noite para o dia.
As políticas implementadas hoje moldarão a economia a longo prazo, exigindo decisões conscientes agora. Apesar dos desafios, o povo brasileiro é resiliente e adaptável, capaz de superar crises e lutar por um futuro melhor.
A compreensão das consequências das atuais decisões políticas é crucial para a nossa sociedade.