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"Fedra" traz história de um amor proibido com temporada no Sesc Glória e Casa Sônia Cabral

Último espetáculo concebido pela coreógrafa Maria Lúcia Calmon (1954-2010), trama é marcada pela paixão de uma madrasta pelo seu jovem enteado

Foto: Divulgação

Samara Rocha (esq.), Breno Gomes e Alanna Olívia estão em “Fedra”, com direção de Jean Calmon Modenesi

Conhecida por adaptações de obras clássicas do teatro e da música para o universo da dança, a bailarina, diretora e coreógrafa Maria Lúcia Calmon tinha o desejo de fazer uma trilogia revisitando as mulheres fortes, protagonistas das peças de Eurípedes, poeta trágico grego do século V a.C. Assim surgiram os espetáculos “Medéia” (2001) e “Ifigênia” (2007).

Faltava falar de Fedra, a segunda mulher do herói Teseu, que se apaixona pelo enteado Hipólito, mas a artista faleceu em 2010, após um longo tratamento de uma doença pulmonar. Doze anos depois, a montagem sai, enfim, do papel pelo esforço de seu filho, o filósofo e dramaturgo Jean Calmon Modenesi, que assina a direção e produção.

A “Fedra”, concebida pelo olhar de Maria Lúcia, estreia nesta quinta (11) e sexta (12), às 19h30, no Centro Cultural Sesc Glória, em Vitória. Depois cumpre temporada na Casa da Música Sônia Cabral, na Cidade Alta, também na capital, nos dias 20, 27 e 28 de agosto.

“Além da homenagem à minha mãe, coloco em evidência a linguagem, o estilo que ela criou e levou para os palcos, a chamada ‘Dança-Teatro’. Maria Lúcia, nessa linguagem cênica realizava uma aliança entre a técnica do bale clássico, a estética da dança contemporânea e a dinâmica do teatro, porque tínhamos uma história a ser contada”, explica o diretor.

Ele afirma que seguiu as orientações deixadas pela coreógrafa e, inclusive, teve que recriar a sua companhia, a Cia Corpo em Cena. “Foi emocionante porque reuni profissionais que trabalharam com minha mãe num reencontro com artistas da nova geração como a bailarina-atriz Alanna Olívia, que interpretará o papel-título, a própria Fedra”, detalha.

Modenesi diz que Maria Lúcia era entusiasmada por obras clássicas mas as encarava como algo vivo, não como uma relíquia preservada em uma redoma. 

“Ela provava que essas obras são imortais porque trazem a essência do que nos faz humanos, independente do tempo e do lugar onde se está. E que as linguagens do teatro e da dança, juntas, podiam muito bem render adaptações infinitas. Prova disso é que ‘Fedra’ é montada há 1500 anos mas, pela força que tem, continua rendendo montagens inéditas, não meras repetições de texto”, exemplifica.

Sinopse

Na trama adaptada, a partir dos originais de Eurípedes e do dramaturgo francês Jean Racine (1639-1699),  após tomar conhecimento da morte de Teseu, conhecido político e empresário, Fedra, sua segunda esposa, decide revelar seu amor proibido e secreto a Hipólito, seu jovem enteado, cuja namorada é Arícia. 

Porém, na verdade, Teseu não morreu. Ele sobreviveu ao acidente aéreo e, ao voltar para casa, surpreende-se com o que vê: a relação amorosa entre sua esposa e seu filho. É quando o ciúmes e o sentimento de traição desencadeiam toda a tragédia.

O diretor explica que a estrutura da montagem não traz as falas da peça. Mas o texto estará presente. “Optamos por projetar as frases dos momentos dessas relações entre os personagens enquanto os bailarinos desenvolvem a história por meio das coreografias. Elas foram criadas pelo coreógrafo Gil Mendes, a partir das indicações deixadas por Maria Lúcia.

Modenesi diz que a adaptação não perde de vista o embate original do texto, que é o conflito entre quem quer dar vazão ao seu desejo, independente do que possa acontecer (caso de Fedra), e aquele que quer conter o que sente, se pontuar na razão extrema, sufocando a emoção (o papel de Hipólito, que rejeita a paixão da madrasta). 

“A obra de arte possui um poder próprio, peculiar, que é o ganhar novos significados, ser ressignificada ao longo do tempo. ‘Fedra’ não foge à regra. O tema central é um amor proibido mas em razão das circunstâncias de hoje a obra ganha um novo significado: o nosso direito de velar os nossos mortos. Esse direito nos foi retirado durante o auge da pandemia. O espetáculo é dedicado aos mais de 680 mil mortos pela covid-19 e à suas famílias”, aponta.

A peça tem patrocínio da Lei Rubem Braga, da Secretaria de Cultura da Prefeitura de Vitória e da Vale, assim como o apoio da FAFI, da Secretaria de Cultura do Estado do Espírito Santo (Secult) e do bar e restaurante Casa de Bamba,

Quem foi Maria Lúcia Calmon

Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal

Maria Lúcia Calmon fez adaptações para a linguagem da dança de obras de Shakespeare, Homero, Eurípedes e Mozart

Maria Lúcia Calmon (1945-2010) foi uma das grandes artistas capixabas e ícones da dança no Espírito Santo. Enquanto bailarina clássica profissional, desenvolveu uma carreira de sucesso nos estados do Espírito Santo, de São Paulo e, principalmente, do Rio de Janeiro, onde residiu e fundou sua própria academia, a Maluce Ballet Studio, nas décadas de 70 e 80. 

Enquanto professora, formou inúmeras gerações de bailarinos e artistas tanto em sua academia no estado do Rio de Janeiro, como em academias e oficinas no estado do Espírito Santo, mas, sobretudo, na Escola de Dança FAFI, que ela ajudou a fundar e dirigir ao longo dos anos 90, quando retornou à sua terra natal em definitivo. 

Enquanto diretora e coreógrafa, em Vitória, Maria Lúcia fundou a Cia Corpo em Cena, grupo com a qual realizou diversos espetáculos, onde criou e desenvolveu uma linguagem própria e singular: a dança-teatro, através da qual se dedicou principalmente às tragédias, a partir de determinadas referências teóricas, tais como as obras de Nietzsche. 

Em Vitória, enquanto diretora e coreógrafa, realizou trabalhos profissionais de grande beleza cênica e força dramática (todos patrocinados pela Lei Rubem Braga), entre eles, “Otelo” (1994), baseado na obra homônima de Shakespeare, “Iara”, a Rainha dos Raios (1996), de autoria do escritor capixaba Alípio Cesar Nascimento, “A Flauta Mágica” (1998), uma adaptação da ópera de Mozart, “O Uirapurú” (2005), baseado na lenda indígena com música de Villa Lobos, “Penélope” (2003), um olhar feminino sobre a “Odisséia”, de Homero, “Medéia” (2001) e “Ifigênia” (2007), de Eurípides e, finalmente, “Fedra” (2008), também de Eurípedes, com o qual Maria Lúcia pretendia concluir a trilogia euripidiana, onde as personagens femininas ganham o protagonismo máximo.

Serviço

Fedra

Texto: Eurípedes e Jean Racine. 

Adaptação e coreografia: Maria Lúcia Calmon.

Direção: Jean Calmon Modenesi.

Elenco: Alanna Olívia (Fedra), Fernando Queiroz dos Santos Moraes (Teseu),  Breno Héber Gomes (Hipólito) e Samara Rocha (Arícia).

Duração: 40 minutos.

Quando: quinta (11) e sexta (12), às 19h30.

Onde: Centro Cultural Sesc Glória, Avenida Jerônimo Monteiro, 428, Centro, Vitória. Telefone: (27) 3232-4750.

Ingresso: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)

Pontos de venda: na bilheteria ou no site do Centro Cultural Sesc Glória

Temporada: dias 20, 27 e 28 de agosto, às 19h30, na Casa da Música Sônia Cabral (Cidade Alta, ao lado do Palácio Anchieta, Vitória). Ingressos: R$ 24 (inteira) e R$ 12 (meia). Entrada franca para estudantes da Fafi e da Fames, bem como professores das redes públicas e privada de ensino, que apresentarem as carteiras de suas respectivas instituições. No dia 28 de agosto, a entrada é gratuita para o público em geral.