O plástico é um dos maiores vilões ambientais da vida moderna. Pelo menos no discurso, porque a indústria do plástico é uma das mais necessárias no atual ciclo de consumo que vivemos. E para tocar um ramo da indústria tão importante é preciso tomar decisões com equilíbrio e de olho nas oportunidades que o mercado oferece.

O Léo de Castro sabe muito bem de tudo isso. Ele é o executivo à frente da Fibrasa, uma das maiores produtoras de itens de plástico do Brasil. Ele foi além do próprio negócio e também tem a visão ampla do mercado, da economia do Espírito Santo e do país, porque foi presidente da Federação das Indústrias do Estado (Findes) de 2017 até 2020. 

Na Fibrasa, o Léo de Castro tem a missão de manter moderna uma empresa com mais de 50 anos de atuação no mercado e com fábricas no Espírito Santo, em Pernambuco e também com o escritório em São Paulo. As duas plantas transformam por ano 25 mil toneladas de polipropileno, que é a matéria-prima que vai ser usada na produção do plástico. Não é pouca coisa.

Veja abaixo a entrevista com Léo de Castro

Do ponto de vista de ambiente de negócios, o Estado é um bom lugar para a indústria? 

O Espírito Santo tem se destacado como um Estado referência no tema “ambiente de negócio”. São mais de 20 anos construindo um ambiente de bom diálogo, ouvindo as demandas do setor privado, colocando em prática muitas das proposições que vêm das instituições, que são muito ativas aqui no Espírito Santo. E isso tem feito o Espírito Santo realmente ser reconhecido nacionalmente como um bom ambiente. 

Então essa agenda de meio ambiente, aprovação de projetos, agenda de acesso ao crédito, agenda de desburocratização, isso tudo tem evoluído no Espírito Santo. Dizer que nós estamos 100%, nunca estamos, porque sempre tem alguém competindo pelos projetos, outros Estados, o que exige uma atenção nossa aqui para nos mantermos atualizados e competitivos. Mas é um Estado que tem essa preocupação no dia a dia.

Qual é a diferença entre o ambiente de negócios hoje e quando você começou? 

É muito importante no mundo empresarial você ter segurança jurídica, você ter estabilidade das normas, você ter transparência na relação com o poder público. Porque no Brasil, o Estado é muito grande.

Quando você consegue conviver com um Estado que é rápido em dar uma resposta, em que as regras são claras, é muito bom.

 

Às vezes as pessoas confundem regras claras com regras frouxas. Não é isso, são mundos diferentes. Para o empresário, o importante é que as regras sejam claras e que as respostas aconteçam no tempo adequado. 

O não é resposta para o empresário, porque ele busca um novo caminho para desenvolver o negócio. Então, o Espírito Santo tem sido um estado preocupado em ser dessa forma, transparente, claro, com bom diálogo, que procura ouvir, evoluir, estar sintonizado com boas práticas globais. 

Eu acho o Espírito Santo um estado moderno, com uma agenda forte de PPPs e concessões, uma agenda de busca de novos projetos, de atrair investimentos. Vejo o Estado indo para fora para vender as potencialidades, com preocupação com o encadeamento do desenvolvimento. Preocupado com infraestrutura, com internacionalização, com educação. Acho que nós vivemos num Estado moderno e que pode cada vez entregar mais para a nossa sociedade. 

Você trabalha num setor que está sempre sob a mira de entidades ambientalistas. O plástico é o vilão da vez. Como se encara esse desafio? 

Tem que produzir. As pessoas têm uma demanda por plástico no mercado e ao mesmo tempo têm uma demanda por redução, uma questão ambiental. A gente tem aí muito forte hoje em dia o ESG, que trata muito de sustentabilidade. 

Como é viver nesse limiar? 

Há uma confusão muito grande na interpretação do papel do plástico na sociedade. A grande queixa é como o plástico é dispensado, como nós jogamos fora o plástico e a baixa capacidade de reciclagem que existe ainda nesse segmento.

O plástico veio para revolucionar o mundo e trouxe grandes benefícios para a sociedade. 

 

Você pega um automóvel, para dar um exemplo simples, de 30 anos atrás. Do peso que ele tinha para o peso atual é quase metade. Isso decorre muito da substituição de aço por plástico. E, quando você reduz o peso do automóvel, você consome menos combustível. E ao consumir menos combustível, você é mais correto do ponto de vista ambiental. A gente precisa enxergar o plástico no seu ciclo de vida e no seu impacto na sociedade como um todo. 

A questão do descarte do plástico é um problema de educação do ser humano e de má regulação do Estado, que gera o caos no descarte do plástico. Tem leis ambientais aprovadas no país desde a virada do século, tratando da coleta seletiva do lixo. Agora eu te pergunto, quanto disso foi implementado de fato? A gente hoje não vê, é muito difícil ver a coleta seletiva. Quando você não tem coleta seletiva, você mistura tudo. Por que eu estou falando isso? A matéria prima plástico é reciclável, você pode transformar inúmeras vezes.

E no limite, quando você fala assim, “eu cansei de transformar o plástico em outro tipo de produto”, você pode transformar o plástico em energia. Porque no fim das contas é petróleo. Se o plástico for tratado corretamente, tem um potencial muito grande de ser reciclado e ser amigo do meio ambiente. Há uma falha de comunicação, há uma agenda que precisa avançar muito no descarte e na reciclagem. É necessário incentivos à reciclagem do plástico. 

Por exemplo, hoje uma empresa recicladora de plástico paga a mesma tarifa de energia que paga uma empresa que faz a embalagem, como é o caso da Fibrasa. E a indústria de reciclagem é uma indústria saneadora. Ela deveria ser incentivada por políticas públicas para que isso cada vez cresça mais. É uma falha de mercado que deve ser revista para que a gente aumente o percentual de reciclagem e assim impacte menos o meio ambiente.

Quando você fala assim, o caso clássico, a tartaruga morreu porque engoliu o canudinho. Quem jogou o canudinho no mar? O canudo não tem perna, não tem asa, não tem vontade própria. Quem jogou fomos nós. É um problema do ser humano que ele de forma mais simples debita a uma indústria. Lógico que a indústria de plástico tem que cumprir o seu papel. Ela tem que trabalhar pela reciclagem também, tem que usar produtos reciclados.

A Fibrasa é uma das empresas que têm trabalhado nessa linha. Nós fomos em 2023, inclusive, premiados por desenvolver uma embalagem de tinta com plástico reciclado.  Cada quilo de plástico, de polipropileno, que entra na nossa indústria vira um quilo de produto final, nossa perda é zero no processo. Isso também é uma forma 

Como o Estado pode incentivar empresas que fazem a reciclagem? 

Primeiro, eu acho que o Estado tem que cumprir a lei que o Estado mesmo criou. Nós precisamos fazer acontecer a coleta seletiva. Nós precisamos acabar com os lixões. Então esse é o primeiro passo. Isso feito, nós precisamos que de fato a indústria de reciclagem seja incentivada. Incentivos fiscais, tributários, incentivos financeiros para que essa indústria prospere. 

Um quilo de plástico usado tem valor. Um quilo de plástico virgem custa em torno de R$8 o quilo. O plástico usado, coletado do catador, custa entre R$2 e R$3. Tem valor na cadeia. Mas, a gente não pode viver na escala global que existe hoje nesse setor. Eu não consigo viver só dos catadores informais. Eu preciso estruturar isso. E a estruturação passa pelo trabalho e pela implementação da coleta seletiva em todo o país. 

Você já vê isso acontecendo? 

No Brasil ainda muito pouco. Mas, a Europa, que é sempre líder na agenda, é um continente que tem trabalhado muito fortemente nessa agenda da reeducação para a utilização do plástico. Tem trabalhado também em estimular redução de peso de embalagens, porque tem muitas embalagens que são desnecessárias. 

Vou te dar um exemplo. Pasta de dente. Você tem uma caixinha de papel que depois vai um tubinho dentro. Você tem um outro de alumínio, que é um monte de capricho para vender mais. Então a sociedade também tem que evoluir e falar assim: “Por que essa caixa de papel?” Vai direto no tubinho que já dá a proteção adequada. São exemplos de evolução para os três R’s da sustentabilidade: “Reduzir, reciclar e reusar”. 

A Fibrasa também tem feito um trabalho muito grande para reduzir o peso das embalagens que ela produz. Nós recentemente conseguimos reduzir o peso da embalagem de margarina, que é muito utilizada em quase um grama cada. Se você considerar que o Brasil consome em torno de 150 milhões de embalagens de margarina por mês, você vê o impacto que uma ação de tecnologia pode ter. E a Fibrasa está conectada diretamente com essa pauta. 

Como você percebeu que a indústria do plástico tinha potencial? 

A Fibrasa nasceu há 52 anos pelas mãos do meu pai, Sérgio, e meu avô Atalides. Na época, foi um projeto que veio para substituir as embalagens de algodão e de juta. A Fibrasa foi a terceira indústria com essa tecnologia no Brasil. Desde então, ela veio se transformando, se modernizando. Nós nascemos produzindo sacaria de ráfia. Depois, em 1989, começamos a produzir embalagens rígidas de poliestireno, em 1990 de polipropileno. Fizemos a unidade Pernambuco em 1995, porque na época existia uma grande crise institucional aqui no Espírito Santo e a nossa alternativa foi ir para outro estado. 

Como a política pode influenciar nas decisões empresariais? 

Absurdamente. Um estado desorganizado afasta o investidor na hora. Então, isso nos fez ir para Pernambuco, o que na nossa história acabou sendo uma coisa muito positiva. Em 1998, nós começamos a fabricar embalagens injetadas, que são esses baldes plásticos para tintas, para food service. Este ano, estamos lançando um projeto de embalagens com barreira a oxigênio, que fazem o produto durar mais na prateleira. E para alguns produtos como baby food, por exemplo, isso tem um valor muito grande. É uma embalagem de valor agregado maior. 

A geração que está chegando está preparada para as oportunidades? 

A nossa geração está educada já considerando um mundo onde as coisas são mais próximas. É uma geração que pensa numa estrutura de capital diferente, lida com essa agenda de internacionalização de uma forma mais amigável do que nós lidávamos. Eu acho que vem com a consciência ambiental, que a gente também tratou aqui.

Eu acho que é uma geração que tende a aperfeiçoar as coisas que foram feitas até hoje e a partir daí, que você já tem um tamanho, uma escala, pode ampliar a ambição do grupo empresarial no futuro. Eu sou muito otimista com a juventude, sou muito otimista com a alternância.

Eu acredito muito na importância de você ter alternância de lideranças em todas as frentes, porque meu pai já dizia, “vassoura nova varre melhor”. 

 

Quem chega querendo fazer uma coisa diferente, com um sonho novo,  acho que tudo isso ajuda a fazer. E quando tem uma formação boa, uma consciência de que o trabalho é um pilar central na vida, eu acho que isso nos dá tranquilidade de confiar no futuro. Mas, falando dessa vontade de fazer, tem que estar preparado. 

Como você pensa isso em relação à sua empresa? 

A indústria de transformação de plástico é muito ampla. A Fibrasa é uma empresa que não deve nada tecnologicamente a nenhuma companhia similar no mundo. Nós estamos concluindo agora, em 2024, um ciclo grande de investimento, de perto de R$170 milhões. Nós trabalhamos com o que tem de melhor em tecnologia e equipamentos. 

A referência da indústria de plástico ainda continua sendo a Europa. A gente recorre muito às tecnologias europeias. E essa agenda de formação de capital humano também é uma pauta muito importante da Fibrasa. A gente tem parcerias com o Senai, que é um grande parceiro de formação. Fazemos muito trabalho também interno de capacitação, intercâmbio com fornecedores de equipamentos. Tecnologicamente, hoje a gente não deve absolutamente nada a ninguém. 

Nós estamos também nesse momento de novos projetos, conversando com empresas europeias, com uma empresa da América do Norte, estabelecendo uma relação um pouco mais próxima com elas que pode até, no futuro, se transformar em alguma relação societária, que seria uma coisa muito interessante para nós e acho que para eles também. 

Todo indicador que você olha do Brasil é incrível. Tudo que você vê de consumo per capita no Brasil, nós temos uma chance de crescer enorme. A gente tem um potencial de crescer muito o consumo à medida que o país ganha renda média, que gera demanda para os produtos que a gente produz. 

Isso significa que a Fibrasa vai comprar empresas ou que vai ser comprada por empresas de fora? Tem esse movimento? 

Tem, sempre tem. A gente sempre está atento a isso, mas a nossa agenda hoje é muito mais de se associar, de compor posições conjuntas e de eventualmente até adquirir participações de outras empresas. Hoje basicamente nossa agenda é essa. 

A Fibrasa é compradora então?

A Fibrasa é compradora. Está do lado comprador. 

Como você chegou à empresa fundada pelo seu pai e pelo seu avô? 

Na minha geração, a empresa era praticamente o nosso parque de diversões. Então, durante as férias, a gente ia para a empresa. 

Mas isso é bom ou é ruim? 

Hoje é diferente. Um moleque ir para a empresa nas férias? Hoje é diferente. Mas na época era muito normal. A gente ficava um tempo das férias lá. Todo sábado era dia de trabalho normal para o meu pai. A gente o acompanhava frequentemente na indústria. A minha geração foi para dentro da indústria desde nova e a gente até brinca que respira plástico. Hoje é diferente, eu acho que as gerações atuais demoram um pouco mais para participar do negócio. Em compensação elas vêm com uma carga de formação, não só de educação, mas de informação de mundo maior. 

A gente tem que ir mesclando essas diferenças, aceitando as evoluções e mudanças que acontecem nas gerações para a gente extrair daí o melhor. Tem uma coisa muito que acho que vale a pena dizer: a gente hoje fala muito em especial quando está tratando da agenda ESG, sobre diversidade.

O olhar sempre é a diversidade de raça, de gênero, mas pouca gente fala na diversidade de gerações. 

 

Você ter pessoas de 60, 50 anos convivendo no mesmo ambiente de trabalho com a geração que está chegando de 22, 23, que tem uma linguagem totalmente diferente é muito importante. Quando você consegue fazer essa diversidade funcionar dentro da sua empresa, você tem um ganho muito grande. Esse trabalho é um trabalho que a gente também está atento.

Na Fibrasa nós temos uma agenda importante de transformação digital e você vê muito essa disparidade de linguagem de mundo, você vê pessoas mais velhas querendo aprender aquela linguagem do jovem e essas tecnologias. Ao mesmo tempo, vê o jovem querendo aprender a experiência de quem já está mais tempo naquela jornada. Conseguir fazer esse casamento gera produtividade e resultado nas empresas. 

Como é que você se preparou para assumir os negócios da família?

Meu pai sempre teve um zelo muito grande por educação, então nós todos fizemos universidade naquela época, a Universidade Federal do Espírito Santo era a grande referência de educação aqui do Estado. Posteriormente todos nós fomos para São Paulo, fizemos pós-graduação na Fundação Getúlio Vargas. Também tivemos oportunidade de trabalhar na cidade. 

Durante o período de faculdade, meu pai sempre advogou para que nós também trabalhássemos em outras empresas para ter um conhecimento de outras realidades, de cultura empresarial. E eu tive a excelente oportunidade de ser estagiário no Grupo Águia Branca e na Garoto, que são duas empresas fantásticas. Aprendi bastante. Isso tudo compôs um conjunto de base para que nós pudéssemos entrar na empresa agregando valor. 

Dentro da empresa, eu particularmente tive a oportunidade de liderar algumas áreas importantes. Por muito tempo eu fiquei na área comercial, posteriormente fui para a área financeira. Então pude conjugar esse conhecimento. Tive passagens na área industrial também. Eu acabei tendo uma formação completa no que diz respeito à indústria. Tive essa oportunidade durante a minha formação, o que me dá muita segurança no negócio. 

O que a dinâmica atual do mercado exige de profissionais bem sucedidos? 

Eu acho que a principal coisa no profissional é a atitude. Eu acho que um profissional que tem atitude, que quer fazer, que tem disponibilidade, que entrega mais do que estão pedindo a ele, esse é o profissional que cresce em qualquer organização. Porque o conhecimento você absorve quando você tem atitude, quando você quer. E é difícil você dar atitude para uma pessoa. 

É essa disposição de aprender, de correr risco, essa flexibilidade, essa capacidade de lidar bem com as novas tecnologias que faz o profissional ter sucesso. E, junto a isso, a capacidade de lidar com pessoas, de liderar, de conviver, porque cada vez mais você está conectado com o todo. Ninguém faz nada sozinho. Essa capacidade de lidar com pessoas, de ter atitude, eu acho que são os grandes diferenciais de um profissional hoje no mercado. 

Léo de Castro é sócio da Fibrasa e ex-presidente da Findes

Veja abaixo a entrevista completa:

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