Entrevista de Domingo

Lourenzo de Oliveira: "Tornar todo o Estado área da Sudene é só uma questão política"

Lourenzo de Oliveira: "O Espírito Santo tem potencial para crescer mais"
Lourenzo de Oliveira: "O Espírito Santo tem potencial para crescer mais"

O Norte do Espírito Santo vive um momento especial quando se fala de atração de novos negócios. E uma parte significativa desse sucesso vem dos incentivos proporcionados a 31 municípios capixabas pela Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste). Para essas empresas, é garantia de redução de impostos e acesso a linhas de financiamento com taxas muito abaixo do mercado no banco.

E quem opera essas linhas, que vêm do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), é o Banco do Nordeste. No ano passado, o banco concedeu R$ 700 milhões em financiamentos. Neste ano, a previsão é de R$ 1,1 bilhão. É quase metade do que poderia vir para os municípios do Estado. 

Por isso, o superintendente do banco no Estado, Lourenzo de Oliveira, acredita que não seria difícil operacionalizar a inclusão de todo o Estado na área da Sudene. Mas, para isso, segundo ele, é preciso ação política.

Veja abaixo a entrevista com o superintendente do Banco do Nordeste no ES:

Dá para cumprir esse orçamento de R$ 1,1 bilhão?

Claro! Nós pretendemos aplicar R$ 2 bilhões este ano. Porque nós temos recursos internos também. Temos uma operação com o governo do Estado, BID, e temos BNDES, bem como outras fontes. Então, a gente pretende, no total, aplicar uns R$ 2 bilhões.

No Espírito Santo, temos 31 municípios, no Norte e Noroeste do Estado, que possuem características próximas às da região Nordeste. Além do FNE, temos também recursos internacionais, como os do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e outras fontes como BNDES e recursos internos do próprio banco.

O banco pode usar esses recursos internos em todo o Estado?

Sim. Diferente do FNE, que está restrito à área da Sudene, os recursos internos do Banco do Nordeste podem ser utilizados em outras regiões. Podemos operar no Sul do Estado, em Vitória, com operações de câmbio, capital de giro e outras modalidades.

Operamos com o BNDES e, no ano passado, também trabalhamos com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), que financia tecnologia e inovação. No momento, a Finep está sem recursos para repasse, mas seguimos buscando alternativas.

Por que você acha que o ES, um estado do Sudeste, precisa do Banco do Nordeste?

O Banco do Nordeste tem a missão de reduzir as desigualdades regionais. Quando começamos a operar aqui, o Norte do Estado tinha um desenvolvimento inferior ao Sul.

Hoje, vemos um crescimento significativo dessa região, muito impulsionado pelo banco e pela Sudene. O Norte se desenvolveu graças a esses incentivos, enquanto o Sul, que antes era mais desenvolvido, estagnou um pouco.

Qual é a diferença do Banco do Nordeste para os bancos tradicionais?

No Banco do Nordeste, quanto menor o porte do cliente, menor a taxa, maior o percentual de financiamento. Então, por exemplo, uma microempresa, em qualquer banco, a não ser que haja uma política direcionada do governo a uma ação, vai ter uma taxa pelo menos 1% menor em relação a uma grande empresa.

No nosso banco a lógica é invertida em relação a outras instituições. Com a gente, uma microempresa tem sempre a menor taxa. Um pequeno produtor paga menos que um grande produtor. Um pequeno produtor a gente pode financiar até 100%.

Já um grande produtor a gente pode financiar 50%, 60%, depende da área em que ele está. Às vezes ele está numa área que é um polo, às vezes ele está numa área que é semiárido. Neste caso você ainda tem taxa mais baixa ainda bem como pode financiar mais. Existe tudo isso em prol de diminuir a desigualdade.

Onde estão as oportunidades de negócio no ES?

Regiões como Aracruz, Linhares e Fundão têm um grande potencial, especialmente por conta da infraestrutura portuária, estaleiros e da ZPE (Zona de Processamento de Exportação). O setor industrial e logístico serão muito beneficiados, assim como o agronegócio e a produção de café solúvel.

Quais são os principais desafios do banco no ES?

O principal desafio nosso era, quando chegamos, nos tornarmos conhecidos. O banco representa 8% da malha bancária da Sudene. Ele tem em torno de 56% do crédito de longo prazo. Já foi maior, já chegou a 70%. Tem ainda 36% do crédito das micros e pequenas empresas e em torno de 48% do crédito rural.

Quando você vai para o Nordeste, esses programas rurais de subsídio, geralmente só quem faz mesmo é o Banco do Nordeste. Aqui você tem o Banco do Brasil que opera muito com essas linhas e o Sicoob também faz muitas operações.

O atual Secretário de Estado de Desenvolvimento falou sobre a possibilidade de incluir todo o Espírito Santo na área da Sudene. O que você acha disso?

Para mim seria excelente. Eu gostaria que esse benefício se estendesse a todo o Estado, até porque você não teria diferenças regionais tão grandes aqui. Mas é uma decisão política que depende do Congresso.

Se hoje, com 2,5% do FNE nós conseguimos atender o Norte, então com 5%, que é a previsão legal, com certeza a gente atende o estado todo. Então, a gente buscaria colocar 5% de orçamento como todos os estados.

Tornar todo o Estado área da Sudene é só uma questão política. Operacionalizar é possível. Você abriria agências no Sul e aí funcionaria. E o banco não trabalha só com FNE. Teríamos outras fontes para emprestar. A gente dobraria em relação ao que a gente tem hoje. E aí poderíamos priorizar projetos de mais relevância social. No Sul do estado também.

Como é a relação do banco com o empresário capixaba?

Muito boa. O capixaba é um excelente pagador. Temos a menor inadimplência da nossa carteira aqui no Estado.

Além disso, buscamos orientar os empresários, ajudando-os a escolher as melhores linhas de crédito para seus projetos.

O que falta para o empresário capixaba?

Talvez um pouco mais de arrojo e ambição para expandir seus negócios para fora do Estado. O Espírito Santo é pequeno, mas o empreendedor daqui tem potencial, pode e deve crescer para os estados vizinhos, como Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro e até mesmo para o Nordeste.

Como você avalia o ambiente de negócios no Estado hoje?

É excelente. O Espírito Santo tem estabilidade fiscal, política e uma infraestrutura de qualidade. A segurança jurídica é um diferencial que atrai investidores e proporciona um ambiente favorável aos negócios.

Na infraestrutura ainda temos alguns desafios, como a BR-262 e a BR-101, mas já vemos soluções sendo encaminhadas. O importante é que os desafios estão sendo tratados e o Estado continua evoluindo.

Como é a relação do Banco com os governos locais?

Valorizamos muito essa relação institucional. Atendemos os municípios emprestando para pequenos e grandes empreendedores. Ao mesmo tempo, pedimos que os prefeitos depositem os recursos de emendas conosco, pois isso faz com que o dinheiro fique e volte para a região.

Temos uma relação fantástica com o governo do Estado e diversos convênios, como o do Incaper, para assistência técnica, e também para a expansão dos microcréditos urbanos e rurais.

Qual o olhar de vocês sobre as linhas para energia solar?

Financiamos indústrias, comércios, produtores rurais e, nesse caso específico, também pessoas físicas. Normalmente, não financiamos consumo pessoal, mas para energia solar abrimos essa possibilidade porque contribui para a infraestrutura energética do país.

Além disso, identificamos um gargalo nas transmissões de energia, o que aconteceu muito no Nordeste. Então, estamos ajustando o financiamento para essas empresas que fazem a transmissão. Porque dessa forma todo mundo sai ganhando.

Como é a concorrência no Estado?

É uma concorrência sadia. Cada banco tem seu nicho. O Banco do Nordeste se destaca no financiamento de investimentos. Outras instituições atuam mais no crédito ao consumo, como financiamento de veículos e casas.

Nosso diferencial é a taxa competitiva e um atendimento mais próximo, inclusive fora do horário comercial.

Como é a relação do Banco do Nordeste com os agentes políticos?

É uma relação institucional muito boa. Atendemos demandas quando solicitado, mas sempre dentro das normas. Nosso papel é prestar contas do que fazemos e estar presente nos eventos e debates sobre desenvolvimento regional.

O que você pensa sobre benefícios fiscais?

São necessários para o desenvolvimento regional. No Norte do Espírito Santo, os benefícios da Sudene fizeram grande diferença no crescimento econômico. Geração de empregos e movimentação da economia local compensam as isenções fiscais.

A política pode atrapalhar os negócios?

Pode, mas aqui no Espírito Santo temos uma relação institucional positiva. Nunca recebi pedidos que interferissem negativamente na gestão. Pelo contrário, temos apoio para abrir espaços e promover eventos.

Qual marca você quer deixar na sua gestão?

Crescimento. Quero expandir o volume de financiamentos, fortalecer o banco e consolidá-lo como principal agente de fomento no Estado.

Temos muitas empresas interessadas, principalmente no setor industrial e logístico, em Linhares e Colatina. Algumas também na fruticultura.

Lourenzo de Oliveira é superintendente do Banco do Nordeste no Espírito Santo

Veja abaixo a entrevista completa: