Um grupo de empresários que enxerga oportunidades no Espírito Santo resolveu se juntar para aproveitar essas oportunidades. O LIDE, Grupo de Líderes Empresariais, já está em 18 estados e 17 países.
Por conceito, o LIDE tem o objetivo de conectar organizações e líderes globalmente e fomentar redes que promovem a livre iniciativa, a inovação e o crescimento econômico.
O grupo é capitaneado pelo ex-governador de São Paulo e empresário João Dória. Aqui no Espírito Santo, o LIDE deu o pontapé para o início das atividades no final do ano passado. E quem está à frente do grupo no Estado é Thiago Santos.
Ele é sócio da LCA Consultoria em Relacionamento Empresarial, da Bluestone, especialista em atração de empresas, da Stars, aceleradora de startups, e da SAF Rio Branco Futebol Clube.
Veja abaixo a entrevista com Thiago Santos, do LIDE:
Por que o LIDE se instala no Espírito Santo nesse momento específico?
Principalmente pela característica do momento do Estado, que precisa se comunicar com todo o Brasil. E temos um fator importante que é a reforma tributária, que vai mexer muito com a nossa matriz econômica.
O LIDE chega num momento super importante para o Estado. Não é à toa que a adesão de empresários é gigante. A gente se coloca como mais uma entidade, mais uma ferramenta de comunicação com o Brasil e com o mundo.
Quais são os maiores atrativos que o Estado tem hoje para empresas nacionais e globais?
Tradicionalmente, nós temos um incentivo fiscal que nasceu na década de 70, o Fundap. Ele foi um dos principais atrativos para negócios, inicialmente para importadoras. Hoje, o Espírito Santo tem incentivos fiscais muito atrativos para indústrias e empresas que distribuem, seja para atacadistas ou varejistas, como os e-commerces. O benefício fiscal de ICMS é hoje a principal ferramenta de atração de negócios para o Estado.
Além disso, temos uma excelente posição geográfica. Muitas vezes, conseguimos entregar um produto no centro de consumo do Brasil, que é São Paulo, no mesmo dia ou no dia seguinte. Eu elencaria essas duas ferramentas – uma posição geográfica e outra tributária – como as mais atrativas para as empresas.
Mas você acha que isso é suficiente para manter uma atividade econômica aquecida no Espírito Santo? Com a reforma tributária, quando não houver mais incentivos fiscais, como o Estado se manterá competitivo?
O Espírito Santo precisa terminar uma história que começou na década de 60: a melhoria da nossa infraestrutura. Quando os incentivos fiscais deixarem de existir, precisamos concluir essa transição. Nós temos um belo parque de portos, mas ainda insuficiente para a atração de carga geral. Nosso diferencial, a partir de 2032, será definir o perfil de infraestrutura do Estado.
Temos desafios importantes, como resolver a BR-262, finalizar a concessão da BR-101 e diversificar nossos terminais portuários. Há boas notícias com o Porto da Imetame e o Porto Central no Sul do Estado, que anunciou o início das obras.
Se resolvermos nossa infraestrutura, continuaremos competitivos
A infraestrutura depende muito do poder público. Qual o papel da classe empresarial e do LIDE nesse processo?
Manter um diálogo maduro com o setor político. Precisamos estar alinhados com nossos deputados federais e senadores para garantir que nossa infraestrutura seja autorizada.
Para portos, dependemos de licenças ambientais. Para rodovias, precisamos que os projetos de concessão avancem, como na BR-262 e BR-101. Também temos desafios na BR-259, que é estratégica para a conexão do Estado.
Se resolvermos tudo isso, não perderemos carga, movimento e negócios para outros estados.
Fala-se muito em segurança jurídica no ES. Como você enxerga esse cenário hoje?
Passamos por governos que nos deixaram um pouco para trás nesse assunto e precisamos retomar esse debate de forma constante. As nossas entidades de classe, como Fecomércio, Sindiex e Sincades fazem um excelente trabalho nessa interlocução.
O setor produtivo deve continuar no apoio a essas iniciativas para garantir que o ambiente institucional maduro que temos seja mantido.
O LIDE foi lançado recentemente no Estado. Como vocês identificam desafios e oportunidades no Espírito Santo?
Já mapeamos as principais oportunidades, principalmente no comércio internacional, que é parte da nossa cultura econômica. Identificamos 10 frentes de trabalho, incluindo economia e investimento, ESG, porto e infraestrutura. No primeiro ano, focamos nesses eixos para debater e identificar oportunidades.
O ambiente corporativo capixaba é muito maduro. Quando apresentamos nosso modelo de negócio, os empresários já conhecem e entendem que é uma ferramenta que agrega valor
O LIDE possibilita uma interlocução mais viva com outros estados, ajudando a impulsionar o desenvolvimento.
Quais são os principais desafios?
O turismo é um dos principais desafios. Precisamos definir nossa característica turística: turismo de negócios ou de lazer? Acredito que cabem os dois. Nossa região serrana é maravilhosa e, com as políticas públicas corretas, pode se desenvolver muito.
Precisamos fortalecer a infraestrutura para turismo de negócios, como o Pavilhão de Carapina, por exemplo.
No turismo de lazer, temos grande potencial no Norte do Estado, com Itaúnas e Santa Teresa. É hora de encampar essa batalha e seguir em frente.
O que o empresário capixaba precisa para se desenvolver?
O empresário precisa falar mais sobre o Espírito Santo. Vejo que falamos pouco do nosso Estado. Precisamos insistir na divulgação do Espírito Santo, respeitar leis ambientais e ESG, mas com orgulho da nossa identidade.
Como o LIDE pode contribuir para esse desenvolvimento?
O LIDE permite que empresários capixabas se conectem com decisores de outros estados. Nosso ecossistema é multissetorial, e isso possibilita conexões rápidas e eficientes.
Já vemos resultados e temos certeza de que o LIDE será um diferencial para o Estado.
Como você enxerga as peculiaridades do setor produtivo no ES?
Thomas Friedman, sobrinho de Milton Friedman, escreveu um livro chamado “O Mundo é Plano”, se não me engano, no começo dos anos 2000, dizendo que não existem mais barreiras, obstáculos entre estados, entre empresas. Hoje você aperta um botão e fala com a China, aperta um teclado e fala com a Índia. Então, essas barreiras deixaram de existir, o que existe é uma cultura em transformação.
O capixaba precisa entender quem somos e quem queremos ser. No empresariado capixaba, não cabe mais quem não queira se conectar com o mundo.
Meu discurso é esse: vamos abrir a cabeça, abrir as portas para fazermos negócios com o mundo todo. Não podemos fechar as portas para a China, para os Estados Unidos, para as grandes culturas. O capixaba tem que mudar.
A sucessão das empresas vai passar por isso naturalmente. As novas gerações vão trazer essa transformação. Alguns ativos nossos já não são capixabas há muitos anos. A Arcelor é de um grupo indiano, a Garoto foi vendida para a Nestlé, e a Suzano não é mais norueguesa.
Esses são exemplos de um modelo em transformação, e eu acredito muito nisso.
Você, como especialista em captação de empresas, como avalia o trabalho do poder público capixaba nessa área?
Há cerca de cinco ou seis anos, o Estado começou a trabalhar a atração de investimentos com metodologia. Na época, o subsecretário Gabriel Feitosa implantou uma estratégia de prospecção de clientes, semelhante ao que consultorias utilizam. Isso garantiu que as visitas, feiras e prospecção de empresas de fora sejam constantes.
Se você interrompe esse trabalho, cria um hiato de novos investimentos. Hoje, os times da Sefaz, do Bandes e Secretaria de Desenvolvimento fazem um trabalho ativo. No entanto, se houver interrupção dessa política, a chegada de empresas será impactada.
O setor produtivo incentiva essas iniciativas. Minha consultoria, por exemplo, abre portas junto à Secretaria de Desenvolvimento para apresentar grandes marcas que querem se instalar aqui, aproveitar os incentivos e nossa posição geográfica.
O que pode melhorar nesse processo?
A reforma tributária nos ajudará a entender melhor essa resposta. Nenhum desafio é maior do que a capacidade de encontrarmos soluções.
O foco deve estar na agilidade das licenças ambientais, pois muitos empresários reclamam da demora.
Precisamos melhorar o posicionamento do Estado para atrair mais investimentos e acelerar o desenvolvimento.
O que falta para o ES ser conhecido como polo de excelência nos negócios?
O Estado precisa concluir seus projetos de infraestrutura. Hoje, fora as commodities, utilizamos cabotagem com Santos para carga geral, pois não recebemos navios de grande porte. Isso precisa mudar.
Projetos como o porto da Imetame e o Porto Central prometem solucionar esse problema, mas ainda não está resolvido. Para exportar e importar com eficiência, precisamos de um porto com conexão direta com a China, por exemplo.
Para que lado o Espírito Santo tende a crescer?
Nossa infraestrutura precisa ser resolvida. Não somos um estado de consumo, mas um estado de chegada e saída de mercadorias.
Perdemos a fábrica da Toyota para a Bahia por falta de infraestrutura. Se quisermos continuar sendo atraentes para grandes empresas, precisamos resolver esse problema urgentemente.
Como você vê o momento da logística no Estado?
A Bluestone acompanha esse setor de perto e estamos animados com o que está por vir. A reforma tributária nos dá um fôlego de sete a oito anos. O contorno do Mestre Álvaro abriu novas possibilidades logísticas.
O Terca Zilli e o Tegman estão operando praticamente no limite, e o TVV tem mantido um alto nível de produtividade. Precisamos investir mais em infraestrutura e novos armazéns logísticos.
O que falta para concretizar o Porto Central?
O Porto Central é um projeto mais complexo porque é multisserviço, não apenas um terminal.
O Brasil não é um país para amadores, então o tempo para viabilizar um porto é longo.
Agora que as obras foram anunciadas, espero que as coisas acelerem. Conheço os sócios do projeto e sei que eles buscam investimentos ao redor do mundo. Esse porto mudará nossa economia, pois facilitará a exportação de cargas para o Oriente Médio e a Ásia.
Como você avalia o impacto da reforma tributária no ES?
Nossa infraestrutura precisa ser resolvida. Temos sete anos para preparar nossos portos e rodovias. O Espírito Santo precisa criar alternativas para compensar a perda de incentivos fiscais e continuar sendo competitivo.
Esse é o maior desafio e também a maior oportunidade que temos no momento.
Você acha que esses incentivos todos, não só o Fundap, mas o Compete, o Investe, vão deixar um legado para o ES?
Bem, para as prefeituras foi o ICMS e toda a linha de serviço que foi destinada. Agora, veja o que aconteceu com as nossas operações de importação de carros na década de 90. Hoje, 90% das aeronaves entram pelo Espírito Santo. Isso deixa um legado de projetos.
Agora, temos o aeroporto de Cachoeiro sendo concebido. As principais importadoras do país têm matriz aqui. Na década de 90, Cotia Trade e Cisa Trade já estavam aqui. O Espírito Santo é reconhecido como um ambiente institucional positivo.
Devemos nos orgulhar dos incentivos fiscais, respeitar quem os criou e continuar apoiando. O próprio governador Renato Casagrande incentivou a manutenção desses programas, e o vice-governador Ricardo Ferraço tem se dedicado às viagens de prospecção de clientes, para fortalecer esse ambiente.
Os incentivos foram e ainda são ferramentas fundamentais para o Estado.
O LIDE já tem um calendário de eventos para o ano. Qual é o objetivo desses encontros?
Sim, já temos um calendário com 12 encontros de formatos diferentes. O primeiro será em março, focado em portos e infraestrutura. Nosso objetivo é trazer experiências e expertise de outros estados para dialogar com nossas lideranças e filiados.
Os eventos do LIDE promovem troca de experiências e geram oportunidades de negócios. No LIDE, os empresários podem conhecer realidades de outros estados e cruzar oportunidades com os nossos. O LIDE Paraná e o LIDE Pernambuco são exemplos de unidades maduras.
O LIDE de Pernambuco, por exemplo, tem 13 anos e 550 CNPJs filiados. O Paraná também tem uma atuação forte, com encontros até no exterior, como o recente evento paralelo ao Fórum Econômico de Davos, na Suíça.
O LIDE proporciona um ambiente estratégico para networking e geração de negócios sustentáveis.
Qual o peso do networking para a realidade do ES?
No Espírito Santo, os negócios sempre foram muito baseados em networking. O LIDE reforça essa característica, mas com um diferencial: conectar empresários capixabas a outros estados e ao mundo.
Já promovemos encontros com líderes de infraestrutura dos Emirados Árabes e outras regiões, o que fortalece projetos estratégicos. Recentemente, um filiado nosso, uma importadora robusta, pediu conexão com o LIDE Minas e, no dia seguinte, já tinha uma reunião agendada. Isso demonstra a dinâmica e eficiência do nosso método.
Os LIDEs que mais performam são aqueles que conectam empresas para além de suas fronteiras estaduais.
Você acha que a política pode atrapalhar os negócios?
Sim, se nos deixarmos levar por um ambiente polarizado. Precisamos de uma comunicação institucional madura e respeitosa.
O Espírito Santo já teve muitas disputas no passado, mas agora devemos focar na construção e no respeito mútuo. O papel do LIDE é ouvir todos os lados e contribuir com ideias construtivas. Estou animado com o que podemos agregar nesse aspecto.
2025 é o ano do LIDE e do empresário capixaba?
Sem dúvida. O LIDE veio para fortalecer as relações empresariais dentro e fora do Espírito Santo. Já estamos sendo procurados por outras entidades de classe para parcerias e trocas de experiência.
Nosso planejamento estratégico identificou rapidamente como podemos agregar valor ao ecossistema local, trazer novos debates institucionais e oportunidades de negócios. Já estamos sendo reconhecidos nesse sentido e vamos continuar avançando.
Thiago Santos é consultor empresarial e presidente do LIDE Espírito Santo.
Veja abaixo a entrevista completa: