Orgulho e inclusão

"Gayprix": Vila Velha sedia pela primeira vez o campeonato de vôlei da comunidade LGBTQIAPN+

O Gayprix, campeonato de vôlei exclusivo da comunidade LGBTQIAPN+, acontece pela primeira vez no ES e terá jogos no sábado e no domingo, com entrada gratuita

Gayprix, campeonato de Vôlei da Comunidade LGBTQIA+
O ES Vôlei é o representante do Espírito Santo no Gayprix (Foto: Thiago Soares/Folha VItória)

Pela primeira vez, o Espírito Santo vai sediar um campeonato de vôlei exclusivo da comunidade LGBTQIAPN+. É o “Gayprix”, competição que terá 13 times, de quatro estados, disputando o título em Vila Velha.

O Gayprix terá jogos no sábado (19) e no domingo (20) na Arena Tartarugão, em Coqueiral de Itaparica, em Vila Velha.

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O que é o Gayprix?

O nome da competição é uma brincadeira com o Grand Prix, atual Liga das Nações de Vôlei (VNL), competição que reúne as principais seleções do mundo no vôlei feminino;

A primeira edição foi realizada em 2018 na cidade de Porto Alegre (RS). No ano seguinte, o campeonato aconteceu no Rio de Janeiro (RJ), mas devido à pandemia da Covid-19, não houve edições em 2020 e 2021.

A competição voltou em 2022, em Belo Horizonte (MG) e, nos anos seguintes, foi disputada em São Paulo (2023) e Florianópolis (SC). Vila Velha recebe a sexta edição.

Gayprix, campeonato de Vôlei da Comunidade LGBTQIA+
(Foto: Thiago Soares/Folha Vitória)

“O objetivo é promover a interação e o convívio de equipes e pessoas de diferentes estados do Brasil que passam ou já passaram por situações semelhantes, fortalecendo a união e os laços da amizade dentro e fora de quadra, diferenciando-se dos demais campeonatos de voleibol amador pela verdadeira intenção e conduta inclusiva LGBTQIAPN+ entre os participantes”, explica Anderson Mengue, coordenador do Gayprix.

Equipe capixaba é estreante na competição

O Gayprix terá 13 equipes, de quatro estados diferentes. Responsáveis por recepcionar os visitantes, os capixabas vão estrear na competição.

O time do Estado é o recém-criado ES Pride, que espera fazer bonito e já deixar a sua marca em sua primeira participação.

O ponteiro Felipe Moreno é o capitão do ES Pride, time capixaba do Gayprix (Foto: Thiago Soares/Folha Vitória)

“É complicado falar, pois vai ser a primeira vez que participaremos de um campeonato dessa categoria e, sendo assim, não conhecemos as equipes, mas acredito que temos time para brigar pelo pódio. Esperamos que esse campeonato traga mais visibilidade para a nossa equipe LGBTQIAPN+ e que a gente consiga apoio para rodar pelos campeonatos da categoria no cenário nacional”, contou o ponteiro Felipe Moreno.

O ES Pride vai jogar o campeonato com os levantadores Fábio, Robson e Richard; os centrais Alessandro, Daniel, Gibão e Breno; os ponteiros Felipe, Popô, Robert e Arthur; o oposto Wesgrey e os líberos Luiz e Riquieri.

Confira os times do Gayprix:

  • Chave A: Carú Fenerbouas-SP, Bulls Vôlei-SP, Lendários-RJ, Bharbixas-MG e ES PRIDE-ES
  • Chave B: JDM-SP, Super Vôlei-SP, Cariocas da Gema-RJ e Moulin Rouge-MG
  • Chave C: Beverly Hills-SP, UVI-RJ, Alligaytors-RJ e Montreux-MG

Vôlei como ferramenta de inclusão social

Paulo Henrique Cardoso, 33 anos, é morador de Viana e trabalha como coordenador esportivo na cidade. Uma função que ele abraça com orgulho e que tem certeza que só foi possível alcançar graças ao esporte. No seu caso, o vôlei.

O esporte o ajudou a buscar caminhos para superar a infância difícil e se desenvolver como atleta e como pessoa.

Gayprix, campeonato de Vôlei da Comunidade LGBTQIA+
Paulo Henrique, o Popô, é jogador do ES Pride (Foto: Thiago Soares/Folha VItória)

“Sou de uma família evangélica por parte de mãe, meu pai era usuário de drogas e na minha infância eu tive muita dificuldade. Um menino gay, dentro de uma igreja pra fazer minha mãe feliz e, ao mesmo tempo, ao olhar para o meu pai e não ter referência nenhuma”, conta Paulo Henrique, ou melhor, Popô: “Se falar Paulo Henrique, poucos sabem (risos)”.

Na escola, ele foi acolhido por uma professora de Educação Física. E sentiu, pela primeira vez, o poder do esporte como ferramenta de inclusão social.

“Antes mesmo de praticar, eu sempre fui apaixonado pelo vôlei feminino. Eu via ali mulheres muito fortes, muito boas, que eu olhava e queria fazer aquilo igual à Paula Pequeno, igual à Sheilla! E, dentro da escola, começaram as seletivas para os jogos municipais de Viana. E aí, uma professora, a Marline, olhou pra mim e disse ‘Você tem talento. Você vai treinar, é muito novo, mas se você treinar e amar o vôlei, nenhum desses meninos vai te parar’. E aquilo mexeu comigo de uma forma muito forte. Eu queria muito ser reconhecido. Era uma forma de empoderamento. Eu sabia que eu era gay, eu sabia que pra ter espaço eu tinha que me impor e que pra me impor eu precisava ser bom!”.

Popô jogou não só no colégio, mas foi além. Jogou em clubes e disputou competições dentro e fora do Estado. Hoje, ele busca abrir portas e oferecer apoio e suporte para os outros.

“Na adolescência eu já comecei a pensar no esporte como ferramenta de transformação, não só da minha vida, mas comecei a pensar em ser professor de Educação Física, em como eu poderia retribuir aquilo que aquela professora fez por mim. O professor é peça fundamental na construção social de uma pessoa. O vôlei era só um sonho e se tornou uma realidade, me formou um atleta e, através dele, eu consigo ter uma profissão e ser transformador na vida de pessoas assim como a Marline foi na minha vida”.

A transformação social pelo esporte, por sinal, é uma das principais bandeiras da competição que está disputada em Vila Velha.

“É comprovado que a prática esportiva desenvolve o crescimento humano de várias formas, mas, infelizmente, ainda nos deparamos com os mais diversos preconceitos dentro e fora das quadras. Por este motivo, achamos importante dar oportunidade e acolhimento a pessoas que ainda jogam voleibol de forma amadora, mas que em algum momento vivenciaram ou até mesmo ainda sofrem com a exclusão e desrespeito em um ambiente que deveria ser de transformação social”, defende o coordenador do Gayprix, Anderson Mengue.

Representatividade nas quadras

Paulo Henrique “Popô” concorda com Anderson e ressalta a capacidade do esporte de transformar realidades.

“O esporte tem essa capacidade de transformar. A minha vida foi muito difícil, mas graças ao esporte eu consegui mudar. Gay, periférico, preto, a vida empurrando a marginalidade pra dentro de casa. Hoje eu sou muito grato ao vôlei por ter entrado na minha vida e ter me mostrado que eu poderia ser melhor do que estava sendo oferecido pra mim naquele momento difícil”.

E se Popô tinha referências exclusivamente femininas quando ainda sonhava com os primeiros toques na bola, hoje a situação já é um pouco diferente, com jogadores profissionais de grande sucesso assumidamente gays. É o caso, por exemplo, do ponteiro Douglas Souza, campeão olímpico no Rio-2016.

24.07.2021 - Jogos Olímpicos Tóquio 2020 - Vôlei de quadra masculino. Fase de grupos - Brasil x Tunísia. Na foto o ponta Douglas Souza durante partida contra Tunísia.
O ponteiro Douglas Souza pela seleção brasileira de vôlei: representatividade (Gaspar Nóbrega/COB)

E é este também um dos objetivos da competição em Vila Velha, de mostrar que a comunidade LGBTQIAPN+ tem espaço nas quadras.

“É muita emoção ter pela primeira vez no Estado o Gayprix. A gente sabe como é difícil abraçar uma ideia esta porque ainda tem preconceito, o Brasil ainda é o país que mais mata a nossa população. Poder participar de uma competição como essa como atleta, como militante, como pessoa que transforma é muito importante! Antes, a gente se espelhava muito nas meninas, né? Paula Pequeno, Jaqueline, Ana Moser, Fofão… e hoje a gente pode falar que se espelha no Douglas Souza, no Maike, que são nível de seleção brasileira, que são referências pra nossa categoria, pra nossa comunidade”, comemora Popô.

Serviço

Gayprix de Vôlei

  • Quando: amanhã (19) e domingo (20)
  • Local: Arena Tartarugão, em Vila Velha
  • Horário: jogos a partir das 8 horas
  • Entrada: gratuita