Esportes

Projeto social levou medalhista Rafaela Silva para o esporte

Os pais e tios da atleta dizem que foi no Instituto Reação, projeto social desenvolvido pelo ex-judoca Flávio Canto, que ela passou a canalizar a agressividade

O programa Reação Escola de Judô e Luta conta com 900 alunos, de 4 a 17 anos. O Instituto também desenvolve o Reação Olímpica, que ajuda 220 atletas Foto: Reprodução/Instagram

Rio – Tios de Rafaela Silva que moram em Cidade de Deus, na zona Oeste do Rio, afirmam que não reconheceram a fisionomia da judoca quando ela subiu ao tatame, na disputa das semifinais e depois na final que valeu a medalha de ouro na Olimpíada, na última segunda-feira.

““Passei a ter esperança quando vi a Rafaela diferente, com aquela cara de má””, relata o tio paterno Paulo Henrique Silva. Outro tio, Sérgio Luiz Silva, diz que a sobrinha usou, como nunca, a “cabeça”. “”Eu senti que ela estava diferente. Antes, ela ia mais com a força e a vontade. Ontem (segunda), ela trabalhou com inteligência”.”

Os parentes de Rafaela e os amigos se concentraram na rua Jessé, em Cidade de Deus, para acompanhar a luta da atleta na Olimpíada. Sérgio Luiz relata que nunca viu tanto entusiasmo e empolgação das crianças da rua. “”Tem muito menino nas escolinhas de esportes. Agora, isso deve aumentar””, avalia.

A família atribui ao ex-judoca Flávio Canto a conquista de Rafaela. Os pais e tios da atleta dizem que foi no Instituto Reação, projeto social desenvolvido pelo medalhista de bronze em Atenas-2004, que ela passou a canalizar a agressividade.

Rafaela faz parte da primeira geração de adolescentes treinada pelo Instituto Reação, projeto presente hoje nas comunidades de Cidade de Deus, Rocinha, Tubiacanga, Pequena Cruzada e Deodoro. O programa Reação Escola de Judô e Luta conta com 900 alunos, de 4 a 17 anos. O Instituto também desenvolve o Reação Olímpica, que ajuda 220 atletas. Uma série de empresas financia a entidade.

A líder comunitária Márcia Pereira observa que só o envolvimento do Estado e de empresas pode potencializar conquistas como a de Rafaela nas periferias. Presidente da Associação dos Moradores de Cidade de Deus (Amunicom), ela relata que a comunidade mantém com dificuldades um projeto de escolinhas de futebol, tae-kwon-do e capoeira. “Cerca de 150 crianças e adolescentes são treinados por voluntários. “A gente só tem conseguido promessas de patrocínio de órgãos públicos e empresas””, afirma. “”A gente torce para que a medalha da Rafaela mude essa situação”.”

Márcia lamenta o declínio da UPP, a Unidade de Polícia Pacificadora. Há quatro anos, o governo do Estado chegou a abrir escolinhas de inglês e espanhol e anunciou a instalação de um centro esportivo e melhoria das escolas. Os cursos de línguas foram fechados. As promessas ficaram nos discursos. A criminalidade voltou a assombrar.

O complexo de favelas de Cidade de Deus começou a se formar nos anos 1960, a partir da chegada de moradores removidos dos morros de áreas nobres da cidade pelo então governador da Guanabara, Carlos Lacerda. Foi na Cidade de Deus, a cinco quilômetros do Parque Olímpico, que os avós paternos e maternos da judoca Rafaela Silva passaram a viver depois de despejos.