O publicitário Victor Estevão, de 44 anos, tem um grande objetivo em mente para 2020. Depois de 30 anos atrás de enriquecer a vasta coleção particular de 15 mil itens sobre o São Paulo, o plano dele é vender todo o material para arrecadar R$ 500 mil e destinar o valor para a caridade. Preocupado com o impacto da pandemia do novo coronavírus sobre moradores de favelas, o torcedor fanático promete utilizar o montante para comprar 10 mil cestas básicas a serem distribuídas em Ribeirão Preto (SP), cidade onde vive.
Um dos maiores acervos particulares do país sobre o São Paulo tem itens históricos e bastante inusitados. Só de camisas são 160, incluindo uma utilizada no Mundial de Clubes da Fifa de 2005 pelo zagueiro reserva Flávio Donizete. São 30 livros, 60 DVDs, 18 CDs, chaveiros, adesivos, chuteiras e até objetos raríssimos. Um disco de vinil chamado A Bola no Barbante vendido pelo clube em 1960 para arrecadar recursos para a construção do Morumbi, um conjunto de caneta e boné utilizados pelo técnico bicampeão mundial Telê Santana e até restos de cadeiras incendiadas por corintianos no estádio em 2005 são alguns dos xodós da coleção.
Com tudo organizado e guardado em um quarto dentro de casa, Estevão tomou uma decisão em março, quando o novo coronavírus obrigou o Brasil a ficar de quarentena. Vender o acervo em busca de ajudar pessoas com dificuldade se tornou uma prioridade. “A pandemia me fez ter essa vontade de ajudar alguém, de olhar pra si mesmo e de procurar contribuir. Vou me sentir feliz pela sensação de poder ajudar alguém”, disse ao Estadão. No passado ele já se envolveu em outras ações beneficentes, como a distribuição de presentes no Natal.
Mesmo com o orgulho da coleção, o publicitário garante que não é prioridade mais mantê-la dentro da própria casa. O intuito é vender para alguém que seja tão são-paulino como ele e esteja disposto a transmitir a paixão pelo clube para filhos e netos. O valor de R$ 500 mil foi estipulado de acordo com o tempo de trabalho gasto para cultivar o acervo. “Não tenho de pensar no que investi, mas sim no que estarei ajudando”, contou.
Estevão começou a colher itens em 1990, após se inspirar em um vizinho vascaíno e outro flamenguista. Os dois guardavam vários cards e revistas sobre os clubes. Depois foi a vez do são-paulino passar a se dedicar ao hobby. A maior parte da coleção é de recordes de jornais, inclusive de várias páginas do Estadão. O publicitário estima ter material suficiente para contar o passo a passo da carreira de 1,3 mil ex-jogadores do clube.
“Vários jogadores com quem conversei gostaram de saber que eu tenho todas essas informações registradas. Parte da história do São Paulo está comigo. Se algum são-paulino topar empregar dinheiro nisso, vai ter o resumo de trajetória do clube”, contou. Nos últimos meses, o publicitário conta ter recebido algumas sondagens de possíveis interessados na compra. Mas as conversas não progrediram.
Apesar do zelo de quem guarda camisas em um armário de vidro para não juntar poeira, Estevão garante não ser mesquinho e conta que se sente honrado ao compartilhar os itens. Em 1995, ele realizou a primeira exposição pública do acervo e até hoje participou de mais uma dezena de eventos do tipo, inclusive em outros Estados. As viagens são até mesmo úteis para ter contato com outros torcedores, que até chegaram a doar artigos como CDs ou livros.
Antes de passar a coleção para um novo interessado, ele terá de terminar de catalogar os itens. O trabalho até agora está no objeto de número 13 mil. Mas o publicitário garante que no dia em que o quarto estiver vazio, não se sentirá triste. “Tudo o que tenho está digitalizado, então vai continuar comigo nos meus arquivos. Mas quando tudo não estiver mais comigo, terei uma paz interior por saber que vou ajudar alguém”, disse.