Nos últimos dias, a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) divulgou que, devido às dificuldades financeiras, as atividades da instituição corriam o risco de serem paralisadas antes mesmo do fim deste ano. Esse também foi o caso de outras universidades do país, como a UFRJ e a UFG. Nesse contexto, se mostra evidente a necessidade de implementar formas de diversificação de receitas nas universidades. Afinal, a tão apregoada e buscada autonomia universitária apenas existe se houver autonomia financeira, independente dos governantes de ocasião. Receba o conteúdo no WhatsApp | Instagram | Twitter

Governo revê verbas

Após o anúncio da possível paralisação das atividades por parte das universidades, o governo federal revisou os orçamentos e liberou cerca de R$ 2,6 bilhões para essas instituições. Os recursos devem recompor a parcela discricionária prevista para as 69 faculdades federais do país. Assim, deverão ser usados para investimentos e pagamento de bolsas de pesquisa, por exemplo. Para o caso da Ufes, foi informado pela própria universidade que os contingenciamentos orçamentários de 2021 representariam 18,2% para custeio, 22,8% nos recursos de capital e 18,3% na assistência estudantil, se comparados ao ano de 2020. Sendo assim, em 2021, o orçamento da universidade destinado ao custeio total (assistência, capacitação, funcionamento, fomento, apoio, reestruturação, dentre outros), saiu de aproximadamente R$ 135 milhões em 2020 para R$ 125,5 milhões, uma trajetória de queda que vem desde 2015. Por fim, vale destacar que as despesas totais previstas para esse ano chegam a R$ 1 bilhão, com boa parte sendo destinada ao pagamento de servidores ativos e aposentados.

Novas formas de financiamento

Apesar dos novos recursos evitarem o shutdown das universidades públicas no Brasil, depender de medidas como essas põe a própria autonomia em risco. Por dependerem do governante de ocasião para liberação de verbas, e da situação fiscal do país — historicamente instável —, as atividades ficam à mercê, de certa forma, do ciclo político, que pode não ser favorável. Em suma, sem recursos financeiros não há autonomia e possibilidade dessas instituições de perseguirem as suas finalidades de pesquisa, ensino e extensão. Nesse contexto, há diversas referências ao redor do mundo que podem auxiliar no desenvolvimento de outras formas de obtenção de receita. O fato de permanecer a forma de financiamento tradicional não significa que outras alternativas não devem ser buscadas. Os fundos de endowment, por exemplo, são populares entre as universidades de diversos países. Criados com o objetivo de receber doações privadas para o financiamento de diversas atividades e para sustentabilidade financeira de diferentes instituições, esses fundos servem para gerir um patrimônio de duração perpétua, com rendimentos que irão custear diversas ações em entidades específicas. Nos Estados Unidos, a prática é responsável por grande parte do financiamento das maiores universidades do país, como Harvard e Yale. Em números, no ano de 2019, segundo a Fundação Dom Cabral, os cinco maiores fundos eram das universidades de Harvard (US$ 40,9 bilhões), do Texas (US$ 31 bilhões), de Yale (US$ 30,3 bilhões), Stanford (US$ 27,7 bilhões) e de Princeton (US$ 26,1 bilhões). Vale ressaltar que a prática possui maturidade nessas modalidades de obtenção de receita. No Brasil, as universidades federais não possuem experiência com tal modelo, mas pode ser um começo. Para efeitos de comparação, o Fundo Patrimonial Amigos da Poli, criado por ex-alunos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP) é, hoje, o maior fundo de endowment do país, acumulando R$ 33 milhões. Os entraves burocráticos e culturais são os maiores impedimentos para que a prática seja adotada no Brasil. O Instituto Líderes do Amanhã, do qual sou associado, possui uma missão muito diversa das universidades: formar jovens lideranças empresariais comprometidas com os ideais de liberdade e o estado de direito. Apesar disso, possui um crescente fundo de endowment, e é um exemplo capixaba que vale destacar. As universidades poderiam ainda buscar parcerias público-privadas, venda e locação de espaços e a cobrança de mensalidades, mesmo que parciais, para alunos de alta renda. O fato é que, ao fim do dia, a realidade se impõe. Independentemente das pressões, se as universidades públicas brasileiras não buscarem novas formas de obtenção de receitas, ficarão sujeitas à questões externas das quais não possuem controle. E, mesmo que não houvesse riscos fiscais e políticos em relação às universidades, ainda assim deveriam buscar a melhoraria de gestão — como se sabe, uma experiência contínua —, além da diversificação de receita. Afinal, são formas de buscar a excelência em seus serviços. O recente ocorrido deveria servir de reflexão para que todo esse sistema passe por um processo de evolução.   De quem nutre muito carinho pelos tempos de Ufes.

Luan Sperandio Colunista
Colunista
Analista político e Diretor de Operações do Ranking dos Políticos, uma das organizações mais influentes do Congresso Nacional.