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Vídeo de médico abusando grávida no RJ é prova válida, explicam advogados do ES

O anestesista acabou preso em flagrante na madrugada desta segunda-feira (11); ele também é suspeito da prática de outros abusos

Foto: Reprodução/Internet

Um vídeo gravado no último domingo (10) por enfermeiras em um hospital da região metropolitana do Rio de Janeiro de um médico abusando sexualmente uma grávida que passava por uma cesárea chocou todo o país. O anestesista acabou preso em flagrante na madrugada desta segunda-feira (11). 

Sobre o assunto, com exclusividade ao Folha Vitória, especialistas trataram do tema e explicaram o porquê a gravação é considerada válida pela lei e deve ser aceita pelas autoridades judiciárias.

Para o Doutor em Direitos e Garantias Fundamentais, professor de Direito Penal e advogado criminalista, Israel Domingos Jorio, não há que se considerar que o vídeo tenha causado qualquer violação à intimidade dos envolvidos. Ao contrário, deverá ser considerado lícito. Nas redes sociais, o jurista fez uma publicação sobre o assunto:

“Em primeiro lugar, a prova é considerada ilícita quando ela é obtida com violação de algum dispositivo da lei processual penal ou da Constituição. Ou seja, quando viola algum direito fundamental e é obtida sem autorização judicial. E é possível falar em violação quando se expõe a imagem de alguém, assim como informações sigilosas ligadas a dados bancários, telefônicos, de mensagens, correspondências. Se não tiver autorização judicial, isso compõe um aspecto da intimidade que não pode ser exposto”, iniciou.

Apesar disso, o caso de estupro à grávida em Vilas dos Teles é bastante diferente. A obtenção do vídeo, para o especialista, não foi feita por caminho ilícito, não tendo violado normas penais. “Não houve violação de propriedade, instalação de escuta clandestina, não precisaram transgredir nenhuma lei para obter aquelas imagens e não há violação de direito fundamental”, acrescentou.

Entenda:

• Não houve violação da intimidade da gestante: afirmar isso seria absurdo, resultando no impedimento de utilizar a prova a favor dela mesma.
• Não houve violação da intimidade do médico: em se tratando dele, no momento em que está em um local inapropriado para atos da intimidade e ele decide praticar o crime, ele abre mão da intimidade e da privacidade dele.

“O que ele fez claramente excede o que seria adequado como comportamento naquele ambiente. Se tivesse feito outra coisa simples, como coçar as partes íntimas, e tivesse sido filmado, até que isso poderia ser considerado invasivo, seria filmar sem razão, sem a liberação dele. Mas o que ele efetivamente praticou, fez de forma intencionalmente inadequada, se tratando de um ato sexual praticado em local exposto ao público, no momento profissional dele, com outros profissionais no local”, disse o advogado. 

Assim, segundo ele, de um lado há a dignidade sexual da mulher e, do outro, há, pretensamente, a privacidade do médico. No entanto, ele mesmo abriu mão do direito por se comportar de forma criminosa em um local como um hospital.

Da mesma forma pensa o advogado criminal, professor de Direito Penal e presidente da Comissão da advocacia criminal da OAB-ES, Anderson Burke. Segundo ele, a princípio não é possível afirmar que a prova é ilícita, já que se discute um local de acesso a todos os funcionários que participam de procedimentos cirúrgico, bem como de pacientes e acompanhantes.

“Ou seja, a princípio não houve violação de intimidade e, consequentemente, de prova ilícita. Além da filmagem, inclusive, conforme mostram relatos e reportagens, há prova testemunhal, que deve ser somada à pericial sobre os medicamentos que foram usados desnecessariamente para dopá-la”, disse Burke.

Por que o crime é considerado estupro de vulnerável?

A explicação de Jorio sobre o crime ter sido um “estupro de vulnerável” em vez de um estupro comum, leva em consideração que há uma pessoa em estado de vulnerabilidade sendo vítima. 

“Isso significa, na prática, que a pena dele, caso seja julgado culpado ao final do processo, será mais alta. São três as situações que permitem esse enquadramento pela lei: menores de 14 anos; pessoa com doença mental incapacitante; ou pessoa que, por qualquer outra causa, é incapaz de oferecer resistência”, destacou.

O caso da paciente, agora comentado em todo o Brasil, mostra alguém que foi sedada, tendo sido colocada em situação de incapacidade de se defender e de resistir. “O ato praticado contra ela é abusivo e configura estupro de vulnerável”, pontuou Israel.

Para Burke a explicação é a mesma. “Foi noticiado que as mulheres recebiam doses altas e desproporcionais de medicamentos, ao ponto de ficarem dopadas, bem como a circunstância de estarem indefesas em um momento tão sensível como é o parto de uma criança. 

A lei penal considera que qualquer pessoa, seja qual for a idade dela, que não possa oferecer resistência a um ato de violência sexual por qualquer motivo, como no caso noticiado, será considerada vulnerável para os fins da lei penal”, concluiu.

Apesar de todas as reflexões e de acreditarem na condenação do suspeito, os juristas alertam para que o devido processo legal seja respeitado, ou seja, não há como condenar alguém antes que todo o trâmite judicial chegue ao fim, com inclusive a apresentação de defesa pelo réu. 

Entenda o caso

O médico Giovanni Quintella Bezerra foi preso em flagrante na madrugada desta segunda-feira (11), por policiais da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de São João de Meriti, na região metropolitana do Rio de Janeiro. O anestesista foi autuado em flagrante por estupro de uma grávida em trabalho de parto no Hospital da Mulher, em Vilas dos Teles.

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O médico foi filmado por enfermeiras da unidade hospitalar enquanto abusava de uma paciente dopada que passava por um parto cesárea. Desconfiadas do comportamento do médico, as funcionárias esconderam um celular na sala de parto e flagraram o abuso.

As imagens mostram o anestesista ao lado da paciente, que está dopada. Enquanto a equipe cirúrgica se prepara para começar a cirurgia, Quintella tira o pênis da calça e o coloca na boca da grávida. A gravação foi feita na noite deste domingo (10). 

Médico é suspeito de pelo menos mais cinco abusos

O médico anestesista é investigado por ao menos mais cinco outros abusos. A afirmação é da delegada Bárbara Lomba, titular da Delegacia de Atendimento à Mulher de São João de Meriti (Grande Rio), responsável pelo caso. Nesta terça-feira, (12) a prisão de Bezerra foi mantida pela Justiça carioca.

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