Cinco horas da manhã, toca o despertador. A rotina é a mesma em boa parte das casas. Levanta da cama, acende a luz, desliga o ventilador, vai para o banheiro. Acende a luz, liga o chuveiro quente, sai do banho, escova os dentes, apaga a luz. Vai para a cozinha, acende a luz. Geladeira ligada na tomada, pega leite e manteiga. Faz o café. Sai da cozinha, apaga a luz. Vai trabalhar.
O que parece rotina para a maioria, para alguns está longe de ser realidade. Mas o que faz com que a rotina de muitos ainda seja diferente dessa? A falta de energia elétrica. Apesar de ser considerado um serviço essencial, o simples apagar e acender a luz, de acordo com o Banco Mundial (BM), não faz parte do dia a dia de 800 milhões de pessoas no mundo inteiro
Em 2010, 1,2 bilhão de pessoas não tinham acesso à eletricidade, enquanto em 2016 esse número caiu para 1 bilhão de pessoas e em 2019 chegou a 840 milhões de pessoas.
No Brasil, segundo o IBGE, em 2019, 99,2% das casas tinham acesso à rede elétrica em tempo integral. No Espírito Santo, um número ainda maior, 99,7%. O que mostra que quase todos os capixabas moram em regiões onde a rede elétrica está disponível. Quase, mas não todos.
De acordo com a EDP, concessionária responsável pela distribuição de energia em 70 municípios capixabas, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – órgão que regulamenta o setor elétrico – estabelece quais são as regras para disponibilização de energia elétrica por parte das distribuidoras.
“A Aneel determina que só podemos construir rede elétrica, seja em um bairro novo ou um loteamento, quando esses locais estão em áreas legalizadas e regularizadas pelos Poderes Públicos”, explicou o gestor da EDP, Evandro Scopel.
Nas regiões em que a rede elétrica não está disponível, prevalecem as ligações clandestinas de energia. Popularmente conhecidas como “gatos”, essas ligações feitas de forma irregular trazem prejuízos para toda a população.
“A concessionária promove campanhas e ações nas comunidades dos 70 municípios da área de atuação para conscientizar a população sobre os riscos e perigos das ligações clandestinas. A ação fraudulenta pode provocar sobrecarga na rede elétrica com prejuízo para a população, que sofre com a interrupção do fornecimento do sistema para suas residências e vias públicas e, também, elevado risco de acidentes”, completou o gestor.
Nova Jabaeté, Vila Velha
A Secretária Municipal de Desenvolvimento Urbano e Mobilidade de Vila Velha, Caroline Jabour, explicou a situação do município. “O município de Vila Velha possui vários parcelamentos irregulares que atualmente passam por processo de regularização fundiária, porém apenas poucos desses assentamentos ainda não possuem acesso à energia elétrica”.
De acordo com a secretária, entre eles estão uma ocupação de área particular denominada Vale da Conquista e uma área pública localizada em Santa Rita/ Zumbi dos Palmares. “Recentemente o município de Vila Velha publicou o Plano de Regularização Fundiária de Vila Velha, disponível no site do município, o documento apresenta uma relação de 29 localidades a serem regularizadas na primeira fase, de 2019 a 2024”.
Uma das regiões do município canela-verde que foi regularizada recentemente é a área denominada Jabaeté 5 ou Nova Jabaeté. Segundo a prefeitura, o local já era considerado zona especial de interesse social (Zeis), mas havia sido ocupada irregularmente.
Inicialmente, a área estava destinada no loteamento para equipamento comunitário, ou seja, na região seriam construídas área verde, quadra de esporte, creche. Além disso, parte da área seria destinada a lotes.
“Tendo em vista que a área foi ocupada e as pessoas construíram suas casas, o município decidiu então promover a regularização fundiária de interesse social, e tal decisão possibilitou que a EDP instalasse energia elétrica para esta população, o que está acontecendo no momento”, explicou a secretária.
Quando o loteamento da comunidade de Nova Jabaeté deixou de ser considerado uma ocupação irregular, tiveram início as obras de implantação da nova rede elétrica. O local, que abriga cerca de 620 famílias e mais de 1.800 moradores, começou a passar por transformação logo nos primeiros dias que foi regularizado.
O gestor da EDP, Alexandre Rodello, explicou como funciona o processo para disponibilização de rede elétrica. Confira:
“Enquanto a EDP aguardava o aval para iniciar as obras após a execução de serviços por parte da prefeitura, como a demarcação das ruas, a comunidade recebeu seu primeiro benefício: a instalação de 60 postes de energia solar na comunidade no projeto chamado Litro de Luz”, explicou o gestor.
A comunidade foi escolhida como pioneira do projeto no Estado. Em conjunto com a comunidade, a EDP e voluntários da ONG Litro de Luz passaram dias conhecendo os moradores, visitando as ruas e as casas.
“A solução trouxe mais segurança para o bairro, isso porque as ruas escuras começaram a ser iluminadas por estruturas composta de canos de PVC, uma bateria que armazena a energia captada durante o dia, e uma lâmpada de LED protegida por uma garrafa PET. Todos esses componentes se transformaram em postes de iluminação para as ruas, que foram instalados nos locais definidos em parceria com os moradores”, disse Scopel.
Para os moradores, a novidade veio em boa hora. A Michelle Freitas tem uma mercearia na região, e contou que a chegada da energia elétrica foi muito importante para o comércio.
“Antes era muito difícil. Tinha muita queda de energia, perdíamos muita mercadoria, porque o freezer desligava. Hoje a nossa situação melhorou muito”, contou a moradora.
Um dos primeiros moradores da região, o pedreiro Abel Costa contou que foram pelo menos 5 anos enfrentando dificuldades até a energia elétrica estar disponível para a comunidade. “Chegamos aqui e não tinha nada, era tudo escuro. Perdíamos muita coisa, porque a energia era fraca, então caía e queimava os equipamentos”, contou.
Para Abel, o maior benefício da rede elétrica é a segurança. “Era muito perigoso. Tenho dois filhos pequenos, eu ficava com muito medo. Mas agora temos tudo isso. Segurança, conforto, só temos que agradecer”, disse.
A esposa do pedreiro, a dona de casa Adriana Matias, também comemora. “Eu fiquei muito feliz porque agora posso ter minha geladeira. Eu tinha uma que queimou. Quando a energia caía estragava tudo. Agora eu não tenho mais esse problema”, disse empolgada.
Junto com a eletricidade, veio a informação. “Pudemos ir muito mais longe do que a instalação da rede elétrica e do projeto, realizamos palestras sobre o uso seguro e racional da energia elétrica, doamos lâmpadas eficientes, cadastrados de famílias na Tarifa Social de Energia Elétrica e doamos cestas básicas”, destacou o gestor da EDP, Evandro Scopel.
No mês de agosto, a EDP finaliza a construção da nova rede elétrica do bairro. Além da instalação de postes de cabos levando uma energia de qualidade para dentro das casas, as famílias receberam a doação do poste padrão de entrada para a ligação da energia da residência.
“Sabemos da importância da energia elétrica e de um serviço de qualidade. Trabalhamos para sempre prestar o melhor serviço para os nossos clientes. Sabemos que a energia traz segurança, comodidade, melhoria da qualidade de vida e proporciona ainda mais benefícios como o de uma família ter um comprovante de residência para realizar uma compra, por exemplo”, acrescenta o gestor da EDP.
Projeto Litro de Luz
O Litro de Luz leva luz elétrica a comunidades de baixa renda, não cobertas pela rede convencional de distribuição de energia. A solução de iluminação pública é composta de canos de PVC, um painel fotovoltaico (que permite a geração de energia pela luz solar), uma bateria que armazena a energia captada durante o dia, e uma lâmpada de LED protegida por uma garrafa PET.
A Grande Vitória
Na capital, de acordo com a prefeitura, há infraestrutura de energia elétrica em todos os 78 bairros. Além disso, não consta nenhum registro ou pedido de ligação em áreas irregulares, popularmente conhecidas como áreas de invasão.
Confira a entrevista com a Secretária Municipal de Desenvolvimento Urbano e Mobilidade de Vila Velha, Caroline Jabour:
Já em Cariacica, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento da Cidade e Meio Ambiente informou que, no município, há duas situações: os loteamentos irregulares, que são aprovados, mas não registrados, e os clandestinos, os quais o dono do terreno divide a terra e a vende em partes menores sem aprovação municipal ou registro.
As áreas conhecidas como invasões, acontecem em sua maioria, em áreas de encostas e às margens de corpos hídricos e áreas públicas. Em relação ao acesso à rede elétrica, a Semdec não possui dados atualizados, mas segundo dados do Censo de 2010, em torno de 94% dos domicílios do município possuíam energia elétrica.
A prefeitura da Serra foi procurada, mas até o fechamento desta matéria não respondeu os questionamentos.