*Artigo escrito por Mariana Coelho, advogada criminalista associada do escritório Rafael Lima Advogados
As saídas temporárias, conhecidas popularmente como “saidinhas”, são frequentemente debatidas pela sociedade, especialmente durante as datas comemorativas, quando costumam ocorrer.
O projeto que propõe o fim do benefício foi aprovado no Senado, reacendendo, assim, o já conhecido debate. O texto agora retorna à Câmara dos Deputados.
Em meio a discursos sensacionalistas, é essencial se entender quais são os objetivos por trás dessa medida. Prevista na Lei de Execução Penal, a saída temporária é concedida a condenados que cumprem pena em regime semiaberto, isto é, aqueles que já gozam do direito de sair do estabelecimento prisional para estudar ou trabalhar.
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Nesse ponto, a sua autorização depende de um ato motivado do juiz, após a manifestação do Ministério Público e da administração penitenciária, que analisam o preenchimento de requisitos rigorosos, como o comportamento adequado e o cumprimento de boa parte da pena.
Assim, primeiramente, deve-se tirar do imaginário a ideia de que o benefício se trata de uma brecha legal, que alcança, sem critérios, todo e qualquer preso.
Dito isto, as saídas temporárias são um importante instrumento para se alcançar um dos objetivos da pena: a ressocialização.
Considerando a inexistência de pena de morte no Brasil, o indivíduo preso necessariamente voltará ao convívio social, por isso, é imprescindível que o seu retorno seja progressivo e gradual.
Isso porque a soltura definitiva do indivíduo, sem qualquer supervisão estatal, após anos encarcerado em um sistema prisional superlotado e carente de estrutura mínima para garantir direitos fundamentais básicos, traz muito mais insegurança para a sociedade do que a sua reinserção gradativa.
Dessa forma, se trata de uma maneira forma de promover a reintegração social progressiva da pessoa em privação de liberdade, fortalecendo os vínculos familiares e a readaptação para a vida fora das grades.
Além disso, embora um dos argumentos utilizados para o fim do benefício seja o alto índice de fugas do sistema prisional nesses períodos, na realidade, os dados indicam justamente o contrário: a esmagadora maioria retorna às unidades nas datas estipuladas.
O Departamento Penitenciário Nacional já divulgou que, em 2019, a taxa de fugas, seja durante as saídas temporárias ou não, foi de 0,99%.
Um dado ainda mais recente, fornecido pela Secretaria de Justiça do Espírito Santo (Sejus), informou que, dos 1.296 presos no sistema capixaba beneficiados com a saída temporária no Natal de 2023, 1.261 retornaram na data estabelecida, ou seja, cerca de 97,3%.
Por óbvio, qualquer caso de não retorno ou de crime cometido durante as saídas merece atenção, contudo, sendo minoria, os incidentes não podem ser utilizados como fundamento para extinguir uma medida valiosa para ressocialização do detento. Um tema tão complexo como o sistema carcerário brasileiro não comporta solução simples.