Na recuperação judicial, procedimento que tem por objetivo viabilizar a superação da crise econômico-financeira da empresa devedora, para permitir a manutenção de suas atividades produtivas, dos postos de trabalho e dos interesses dos credores, é possível à empresa recuperanda defender-se contra a habilitação de crédito originado em cláusulas contratuais abusivas.
Isso porque no procedimento de impugnação de crédito são permitidos o pleno contraditório e a ampla instrução probatória, como ocorre em ações judiciais pelo procedimento comum. Essa foi a conclusão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, ao examinar os artigos 13 e 15 da Lei nº 11.101/2005, que versam sobre o procedimento.
Com efeito, poderá a empresa em recuperação judicial exercer seu direito de defesa, desde que se atenha aos temas que podem ser discutidos no incidente. Como a Lei nº 11.101/2005 não traz limitações ao contraditório e ao direito de defesa, se a recuperanda entende que o contrato que originou o crédito cobrado possui cláusulas abusivas e que, portanto, há margem para discussão do débito, deve apresentar o incidente de impugnação.
Vale frisar que a recuperação judicial é regida pelo princípio da preservação da empresa e de sua função social, como a manutenção do emprego e o estímulo à atividade econômica. O reconhecimento da possibilidade de revisão de créditos originados em cláusulas contratuais abusivas, que podem existir em contratos de financiamento, contratos bancários ou em contratos mantidos com fornecedores, encontra respaldo, sobretudo, no texto constitucional, segundo o qual ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal.
Logo, vê-se como acertado o posicionamento do STJ sobre a impossibilidade de restrição do exercício da ampla defesa quando a matéria de defesa da impugnação à habilitação do crédito for a alegação de abusividades em cláusulas dos contratos que deram origem ao crédito. Impede-se, com isso, o aprofundamento da crise financeira pela qual passa a empresa, e o pagamento indevido de débitos constituídos sob o mando da abusividade.
Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES.
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