Em julgamento realizado na última quarta-feira, o Supremo Tribunal Federal – STF, declarou inconstitucional a possibilidade de a Fazenda Pública tornar indisponíveis bens dos devedores, em sede administrativa, para garantir o pagamento dos débitos fiscais. Seis ações diretas de inconstitucionalidade questionaram a constitucionalidade do artigo 25 da Lei nº 13.606/2018, no que acrescentou, na Lei nº 10.522/2002, o 20-B, § 3º, inciso II, o qual introduziu no sistema tributário a possibilidade de a Fazenda Pública, administrativamente, tornar indisponíveis os bens do contribuinte que, intimado, deixar de efetuar o pagamento do débito inscrito em dívida ativa no prazo de 5 dias.
Em suma, foi atribuído ao órgão administrativo que constituiu o crédito tributário o direito de invadir o patrimônio particular sob o argumento de proteção do interesse público fiscal sem a contrapartida da proteção constitucional do patrimônio particular. De fato, a inovação legislativa trazida pela Lei nº 13.606/2018 representa clara violação ao direito de propriedade e sua função social previstos na Constituição Federal. Ao contribuinte é garantido o devido processo legal antes da privação de seus bens e o pronunciamento do Poder Judiciário sobre a decretação de indisponibilidade de bens com vistas à garantia do crédito tributário não pode ser afastado. Nesse ponto, vale menção o voto do Ministro Marco Aurélio no sentido de que “o sistema não fecha, revelando-se o desrespeito aos princípios da segurança jurídica, da igualdade de chances e da efetividade da prestação jurisdicional, os quais devem ser observados por determinação constitucional, em contraposição à ideia da ‘primazia do crédito público’”.
Muitas vezes, o crédito tributário é constituído de forma indevida, seja por uma formalidade que deixou de ser cumprida no processo administrativo, seja pela ilegalidade ou inconstitucionalidade do tributo. O órgão administrativo, por sua vez, não adentra no exame da constitucionalidade da exação e constitui o crédito tributário. Nesse caso, o contribuinte terá o ônus de recorrer ao Poder Judiciário para afastar a cobrança e poderá ter seu patrimônio seja atingido antes que seja proferida uma decisão judicial.
Ora, ainda que a Fazenda Pública tenha prerrogativas na cobrança de seus créditos, não se pode admitir a invasão do patrimônio particular sem o pronunciamento do Estado-Juiz.
Assim, o reconhecimento da inconstitucionalidade da indisponibilidade administrativa de bens do devedor corrobora para conferir maior segurança jurídica relação entre Fisco e contribuintes e garantir a proteção constitucional da propriedade privada.
Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES.
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