Em fevereiro deste ano, no Paraná, um empresário matou um homem que tentava roubar uma moto na casa do empresário. De acordo com a Polícia Civil, o assaltante, que tinha quatro mandados de prisão em aberto contra ele, tentou furtar uma moto que estava na garagem, e o dono da casa atirou. Nesta última semana o empresário foi denunciado pelo Ministério Público pela prática de homicídio, mas a defesa dele alega legítima defesa para proteção do patrimônio.
Até que ponto vai a legítima defesa?
Segundo o Código Penal, não há crime quando o agente pratica o fato em legítima defesa, e é essa mesma lei que define ter agido em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
No caso específico citado, tanto a Polícia Civil como o Ministério Público do Paraná entenderam que, estando o assaltante do lado de fora retirando uma moto e o dono dentro da casa, na sacada, ao atirar, acertar na cabeça e provocar a morte do criminoso, o atirador excedeu os limites de uma legítima defesa, já que, na ótica das autoridades acusadoras, não havia risco contra a integridade física da família naquele momento, mas somente o risco da perda de um patrimônio.
A discussão em torno do instituto da legítima defesa sempre existiu e é muito ampla. De um lado, a pessoa que alega ter cometido um ato para proteção de sua pessoa ou de outrem; de outro, a vítima que pode ter sido alvo de uma atitude excessiva. O que a Justiça tem entendido é que, para os casos de legítima defesa, não há uma receita pronta e cada caso precisa ser analisado em suas particularidades, de forma subjetiva.
Aos olhos da Justiça, cada caso precisa ser examinado sob o ângulo de como se deu a interpretação – pela pessoa que supostamente se defendeu de forma legítima – da situação anterior ao crime como um risco intenso, em razão do perigo representado pela vítima naquele momento, do temor pela vida e de tudo o que girou em torno dos atos subsequentes
Nesse contexto, deve-se observar que o reconhecimento da causa de isenção de pena da legítima defesa putativa demanda o erro plenamente justificado pelas circunstâncias, capaz de induzir o agente a supor uma situação de efetiva legítima defesa. Durante o processo, serão colhidas provas (imagens, testemunhas, reconstituição, documentos etc.) que precisarão demonstrar, de forma inquestionável, que de fato o acusado agiu em legítima defesa.
Há muitos casos em que não é possível o acolhimento da legítima defesa putativa, pelo próprio juiz da causa, devendo a tese defensiva (nos casos em que o ato tiver provocado uma morte) ser apreciada pelo Conselho de Sentença, que é o júri popular. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo tem sido muito rigoroso quanto ao acolhimento da tese de legítima defesa, especialmente em casos que resultarem em morte, como podemos ver em trecho de recente julgamento: “ (…) O reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa demanda segura e inquestionável comprovação da ausência de animus necandi, assim como, da utilização de meio moderado e proporcional para repelir agressão atual ou iminente. Havendo incerteza quanto à moderação do meio utilizado ou de ter o réu atuado repelindo injusta agressão, impossível o acolhimento imediato da excludente da legítima defesa (…)”.
Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental.
Foto: Pxhere