OS GOVERNANTES PODEM PROIBIR CELEBRAÇÕES RELIGIOSAS PRESENCIAIS?

Estamos diante de mais uma grande polêmica provocada por novas decisões conflitantes do Supremo Tribunal Federal, desta vez envolvendo a proibição, por alguns estados e municípios, da realização de celebrações religiosas presenciais. Há de se destacar, desde já, que é temerário que um juiz do STF decida sozinho (decisão monocrática) um assunto tão sensível. Uma decisão, mesmo liminar (provisória), deveria ser tomada pelo conjunto de onze ministros.

Um problema quase tão grave quanto o vírus em si é a politização das ações de saúde. Desde o início da crise sanitária, um ano atrás, o que vemos são prefeitos, governadores e o presidente dando cabeçadas uns nos outros sobre como tratar o assunto. Há uma impressão de que parte dos governantes quer ter holofotes com as suas ações pessoais no trato contra o vírus.

Eu não tenho capacidade de dizer como os médicos e as autoridades sanitárias devem lidar com a situação. Mas, posso afirmar que há uma evidente confusão pelo fato de que, nem no Brasil ou em outro país, há uma direção certeira do que se fazer para combater o vírus eficazmente. Lockdown ou não? Tratamento precoce? São muitas receitas, nenhuma delas aparentemente eficaz, já que, além de novo, o vírus é extremamente danoso. Até a própria vacinação gera dúvidas sobre a sua plena eficácia.

Outra questão: os governantes podem baixar essas normas de restrição e fechamentos? Pela lei atualmente em vigor, desde que estejam devidamente fundamentados em dados técnicos firmes e pareceres sanitários profundos, sim, essas restrições temporárias podem ocorrer com relação às pessoas contaminadas ou com suspeita de contaminação. Contudo, o que temos visto são restrições muito mais abrangentes, para a população em geral e que, apesar de não estarem previstas em lei, estão sendo confirmadas pelo Judiciário.

Diante dessa celeuma toda, os governantes podem ou não proibir celebrações religiosas? A resposta é complexa, mas não me furtarei a dar. Inicialmente, é preciso destacar que as garantias constitucionais ao livre exercício das celebrações religiosas estão no mesmo artigo da Constituição Federal que também assegura, entre tantos outros, os direitos ao livre exercício do trabalho e à locomoção (ir e vir).

Estamos, há tempos, com os direitos do exercício ao trabalho e locomoção (ir e vir) restringidos ou até suspensos por decisões de governantes locais, e, apesar de todas as reclamações por grande parte da população, não se havia ouvido ainda nenhum “grito” tão forte quanto a restrição às celebrações religiosas presenciais. Porém, não há, tecnicamente, nenhuma diferença entre essas três garantias constitucionais: celebrações religiosas presenciais, livre exercício do trabalho e locomoção, todos estão no artigo 5º da Lei Maior.

Ao contrário do que muitos querem fazer valer, o patamar constitucional entre esses três direitos é o mesmo. A possível afronta a norma constitucional por governantes de plantão, se assim entendida, é a mesma!

Apenas para fins de argumentação, tomemos como imprescindível, para arrefecimento da pandemia, as medidas de lockdown e restrição de atividades. Sob essa premissa, se o governante pode determinar o fechamento de estabelecimentos e o isolamento em casa, ele também tem o poder de, pelo mesmo período de tempo, restringir celebrações religiosas presenciais. Não há diferenciação entre as garantias constitucionais.

De outro lado, o governante que entender como inútil o lockdown e ficar nas medidas menos invasivas, poderá impor, aos comércios, transporte coletivo, parques públicos e templos religiosos, entre outros, os cuidados com a limitação do número de pessoas em percentual da capacidade máxima, uso de máscaras e álcool.

A propósito, no caso específico do estado do Espírito Santo, as autoridades sanitárias estaduais, sob a liderança do governador, entenderam que é possível diminuir os danos da pandemia com o fechamento de estabelecimentos, parques e transporte público, mas com a permanência das celebrações religiosas presenciais, que tiveram somente uma recomendação para não serem realizadas, corroborando que há muitos caminhos técnicos para cuidar do assunto.

Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental.

Foto: Agência Brasil

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