No dia 1º deste mês de outubro, o Ministro Gilmar Mendes, do STF, deferiu uma liminar requerida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), nos autos de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, contra os incisos II e III do artigo 12 da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade).
O PSB requereu em sede de medida cautelar, a suspensão dos efeitos do art. 12, II (na modalidade culposa) e III quanto à supressão temporária dos direitos políticos, a fim de, sob a ótica do Ministro Gilmar Mendes, que deferiu a liminar, e do partido político requerente, evitar-se a perpetuação de injustiças decorrentes da aplicação desproporcional e desarrazoada da sanção a atos de improbidade de reduzido potencial lesivo.
E, em definitivo, foi requerido que seja declarada (i) a inconstitucionalidade com interpretação conforme do art. 12, II, da Lei n. 8.429/92, para que a sanção de suspensão dos direitos políticos somente possa incidir na modalidade dolosa do art. 10; e (ii) a inconstitucionalidade com redução de texto do art. 12, III, da Lei n. 8.429/92, a fim excluir a expressão “suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos”, vedando-se a aplicação da referida penalidade aos casos do art. 11.
O caput do referido art. 12 prevê que: “Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato” (negritos e grifos dos autores).
O inciso II do dispositivo legal sob comento assim dispõe: “na hipótese do art. 10 (Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei…), ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos” (negritos e grifos dos autores).
O inciso III do mesmo dispositivo legal prevê que, “na hipótese do art. 11(Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições…), ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos” (negritos e grifos dos autores).
Pois bem, demonstradas as previsões contidas nos dispositivos impugnados, da Lei de Improbidade, já dá para esclarecer para os leitores que o PSB alegou, na petição inicial, que os referidos dispositivos, ao permitirem a aplicação da penalidade de suspensão dos direitos políticos a todo ato de improbidade administrativa, independentemente da gravidade ou do elemento subjetivo da conduta, contrariam a proporcionalidade e a gradação expressamente exigidos pelos artigos 15 (art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: (…) V – improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º) e 37, § 4º (art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: … § 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.), da Constituição Federal (negritos e grifos dos autores).
E, neste diapasão, o Ministro Gilmar Mendes entendeu que há, nas normas impugnadas nessa ação direta de inconstitucionalidade, excesso do legislador e, portanto, violação ao princípio da proporcionalidade.
Tanto a Procuradoria-Geral da República quanto a Advocacia-Geral da União se manifestaram nos autos e expressaram discordância com o acolhimento do pedido.
A Procuradoria-Geral da República defendeu que a penalidade de suspensão dos direitos políticos, prevista nos incisos II e III do art. 12 da Lei 8.429/1992, respeita a Constituição, uma vez que não dispensa o juiz de demonstrar a proporcionalidade entre a aplicação da reprimenda e as circunstâncias do caso concreto. Ou seja, deu um Parecer pela improcedência dos pedidos do partido requerente.
A Advocacia-Geral da União sustentou que: (i) a punição de condutas que caracterizem improbidade administrativa se alinha à proteção do Estado Democrático de Direito; (ii) a legislação impugnada não ofende os parâmetros constitucionais ao permitir, pelos prazos estabelecidos, a suspensão de direitos políticos em caso de condenação por ato de improbidade administrativa; (iii) a incidência dessa modalidade de pena e a respectiva dosagem pelo magistrado, no caso concreto, alinha-se aos parâmetros de proporcionalidade e adequação; a IMPROCEDÊNCIA do pedido representa a preservação da independência judicial.
Com todas as venias, também discordo do entendimento do Ministro Gilmar Mendes, visto que a gradação reclamada está patente nos dispositivos impugnados.
Observa-se que o caput do art. 12 estabelece que as sanções ali previstas “podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato”, ou seja, há gradação, visto que as penalidades podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente e mais, de acordo com a gravidade do fato. Ora, quando uma penalidade pode ser aplicada de acordo com a gravidade do fato, é porque existe uma gradação.
Há de ser observado também que, nos incisos II e III há previsão de suspensão de direitos políticos de cinco a oito anos e de três a cinco anos, respectivamente, o que, de igual forma, representa uma gradação para que o julgador aplique a penalidade ao agente ímprobo.
Respeitosamente, concluímos salientando a decisão do Supremo vai refletir em vários processos de improbidade administrativa e muitos políticos que estariam impedidos, voltarão ao palanque, o que ao nosso ver é desarrazoado.
Rodrigo Carlos de Souza, sócio e fundador de Carlos de Souza Advogados, Secretário Geral Adjunto e Corregedor Geral da OAB/ES, Vice-Presidente da Comissão Nacional de Compliance Eleitoral e Partidário da OAB e Diretor do CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Seccional Espírito Santo).
Letícia Stein Carlos de Souza, Acadêmica do 4º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiária de Direito.
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