Muitas técnicas de estudos existentes são suportadas pelos princípios de aprendizagem explicadas nos artigos anteriores desta série sobre aprendizado e estudos. Entretanto, para a implementação dessas metodologias e um eficiente uso dos métodos – daqueles mais simples aos mais complexos –, um outro ingrediente ainda precisa ser adicionado na receita: o hábito. Com o intuito de finalizar a primeira série de princípios e técnicas de estudos, aqui não serão abordadas as técnicas, mas as atitudes que contribuem para uma organização diária e a criação de hábitos eficientes que ajudam nos estudos.
Hábitos que ajudam nos estudos
Os hábitos podem não ser vistos com bons olhos por muitas pessoas; mas, para o bem de todos, eles existem. Como a quantidade de estímulos captados e as possibilidades de reações ao longo de um dia são incrivelmente altas, se o nosso cérebro fosse obrigado a racionalizar todas as ações cotidianas, ele entraria em “pane”.
Vejamos, por exemplo, o ato de tomar decisões: cada processo decisório gera um gasto de energia e nosso cérebro possui uma espécie de “banco de energia”. Sendo assim, a cada decisão tomada, mesmo aquela mais insignificante, há um débito de energia nesse banco e o gasto constante faz com que a próxima decisão tenha uma maior chance de erro.
Em outras palavras, um cérebro cansado tem mais chance de tomar uma decisão equivocada – o que também justifica por que não devemos tomar grandes decisões após um dia muito cheio.
Ao longo da evolução de nossa espécie, o mecanismo de hábito foi criado para diminuir os gastos constantes de energia. Dessa forma, as decisões menores passam despercebidas por nós sem exigir esforço consciente. No entanto, o que isso tem a ver com os seus estudos? Tudo! É extremamente difícil se manter em uma atividade – seja de trabalho, de estudo ou na academia – somente por meio da motivação.
É para isso que os hábitos também servem. Eles são mecanismos que “seguram as pontas” quando a motivação não está presente, e, acredite, um dia ela não vai estar. Não somos máquinas para executar tarefas todos os dias por um longo período sem falhar. É por isso que a criação de hábitos é significativa, pois auxilia o modo automático a ser executado poupando energia vital para outras coisas mais relevantes.
A execução por repetidas vezes das mesmas atividades não só leva a criação de hábitos, mas também ao aprimoramento desses. Felipe Lima e William Douglas, em “Mapas mentais e memorização para provas e concursos” (2011), abordam tal questão. De acordo com os autores, ao tentarmos executar uma determinada técnica ou atividade, avançamos por quatro níveis:
- Inconsciente e incompetente;
- Consciente e incompetente;
- Consciente e competente;
- Inconsciente e competente.
Inconsciente e incompetente
Ocorre inicialmente quando não sabemos que a técnica existe e, obviamente, não sabemos como ela é realizada.
consciente e incompetente
Ocorre quando após nos depararmos com a técnica nos tornamos conscientes de sua existência, porém ainda não é possível sua plena execução.
consciente e competente
Se dá quando ao executar uma mesma técnica um número determinado de vezes, atingimos um nível de proficiência nela, porém ainda despendemos energia e motivação para trabalhá-la.
inconsciente e competente
Poderia também ser chamado de “piloto automático”. Nessa etapa já executamos tantas vezes as atividades que não há trabalho ao pensar sobre ela. Portanto, nosso cérebro já adotou uma “deixa, rotina e recompensa” para aquela atividade. Ou seja, o looping do hábito, conforme apresentado por Charles Duhigg em “O Poder do Hábito” (The power of habit, 2012).
Todas as técnicas mencionadas nos artigos anteriores passarão por essas etapas quando forem implementadas. Dessa maneira, podemos realmente afirmar que a prática é o que leva à perfeição (ou algo próximo a isso).
Atitudes simples que transformam
Como dito acima, os hábitos facilitam a execução das técnicas e das tarefas, bem como ajudam na organização mental do cotidiano. Dessa forma, algumas atitudes podem facilitar e fornecer um ânimo extra em sua rotina.
monte um cronograma de estudos
Elabore um plano do que será executado ao longo da semana separando horas em cada dia para os estudos. Da mesma forma que nós temos um horário para acordar, comer e dormir (se não houver, comece por eles), é essencial também estabelecer um horário para estudar.
Não se cobre com horas exatas, pois imprevistos acontecem e nem sempre conseguimos iniciar e terminar no mesmo horário. Ao invés disso, flexibilize o horário por turnos e atividades a serem executadas. Quanto mais discriminada a atividade a ser executada (dividida em pequenas tarefas), mais fácil será a sua realização. Basta executá-la quando o momento chegar, não havendo margens para dúvida.
Um ponto importante é que a quantidade de tempo para cada atividade é individual, então comece nivelando seu planejamento por baixo. Ou seja, não inicie um plano muito difícil e sem margem para erro. Começar com uma carga alta leva à fácil exaustão e ao fracasso logo no início, permitindo a criação de uma barreira afetiva com relação à atividade, o que acaba por desestimular a formação do hábito. Um maratonista não começou correndo 45km sem parar, por que você deveria?
preveja os imprevistos
De fato, um imprevisto não tem como ser antecipado, mas podemos colocar um horário específico ao fim da semana para um ajuste caso algum imprevisto aconteça. Essa válvula de escape permite colocar em dia aquilo que você se predispôs a fazer. Se não houve imprevistos, o horário pode ser usado ou para antecipar uma tarefa futura ou para ser sua recompensa por uma semana impecável.
ambiente apropriado
Aprender exige foco. Logo, se o seu problema é concentração, encontre um ambiente propício para os estudos e faça dele parte da sua rotina. Desenvolver o hábito de estudar no mesmo lugar e na mesma hora todos os dias comprovadamente melhorará sua concentração.
descubra o que te distrai
Se mesmo em um local apropriado a falta de concentração afeta os seus estudos, descubra o que exatamente te atrapalha. Faça uma contagem de quantas e quais coisas te distraem ao longo da semana. Anote o resultado e, depois de um tempo, analise. A própria descoberta dos motivos que nos desfocam nos faz cientes das sensações que nos levam a isso. Ou seja, ter conhecimento das coisas que nos atrapalham é meio caminho para a mudança de hábito ou atitude.
registre suas atividades e organize-se
Pesquisadores têm mostrado que há relação entre a organização e o aumento de notas em exames e testes. Manter um local para registrar os resultados obtidos nas atividades e saber onde encontrar seus materiais, quando você precisa deles, é crucial.
Mantenha uma seção como caderno, planilha, aplicativo ou qualquer coisa que auxilie o registro dos resultados de cada assunto estudado, bem como um local apropriado para guardar os materiais relevantes. Afinal, todos experienciamos a sensação de frustração ao buscar algo e não conseguir o achar por falta de um bom sistema de organização.
Ter essas informações reunidas em lugares estratégicos leva a um importante gerenciamento de tempo o que também auxilia no resultado final.
equlíbrio é tudo
Estudos mostram que muito tempo imerso nos estudos pode elevar os níveis de estresse. Faça pausas estratégicas para arejar a mente e inclua uma vida social nos seus planos: a prioridade nos estudos não pode se tornar uma exclusividade.
É claro que em alguns momentos a exigência será maior, mas isso não pode ser 100% do seu tempo. Adicionalmente, é recomendável incluir exercícios físicos em sua rotina. Cientistas sugerem que a realização de atividade física retarda a atrofia natural do cérebro, assim como acontece com os demais músculos do corpo.
Os exercícios são uma excelente forma de pausar estrategicamente os estudos, aumentando a oxigenação do cérebro e liberando hormônios que criam um ambiente mais propício para o desenvolvimento das células cerebrais.
tenha um objetivo
Por último, mas o primeiro item de sua lista em termos de cronologia – e também de polêmica – é um só: estabeleça um foco. “Se você não sabe onde quer ir, qualquer caminho serve.” Muitos estudantes vivem sob essa icônica frase de Lewis Carroll, em “Alice no País das Maravilhas”. Isso os impede de conseguir alcançar as suas metas.
Delimitar precisamente o foco impede distrações no meio do caminho, permite conhecer “atalhos” que contribuirão mais rapidamente para o sucesso e afunila de maneira mais certeira as ações a serem tomadas.
Se não sabemos o que queremos, as ações podem ser tornar descoordenadas e, muitas vezes, não trarão os efeitos que esperamos no tempo desejado. É válido ressaltar também que ter dois focos é ter foco nenhum. Quando temos mais de um foco, dividimos nossas forças e atenção ao invés de centralizarmos nossas ações para maximizar a chance de sucesso.
Esse é um erro muito comum encontrado em concurseiros e pré-vestibulandos. Dito de outra forma: nada impede a existência de um plano B (que também é desejável!), mas tenha apenas um plano A.
Muitas outras técnicas de estudos poderão ser abordadas em nossos artigos posteriores, mas dificilmente elas trarão o resultado procurado se não houver o cuidado com as atitudes listadas aqui. Por mais eficiente que os métodos sejam, sem organização prévia, hábito e atitudes chaves, como as acima mencionadas, o processo de estudos se torna mais complexo, mais difícil de ser mantido até que seja atingido o objetivo final, seja ele uma nota ou uma aprovação.
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*artigo escrito por Lorenzo Ferrari Assú Tessari, especialista em aprendizagem e metodologias de ensino. Formado em Ciências Biológicas pela Ufes, mestre em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia pela UFPR, e diretor e cofundador da Gama Ensino e da Anole.
Excelente artigo.
Excelente Artigo!… Parabéns!
Meu neto está fazendo online faz o que entende não o mandei para as aulas presenciais só vai quando estiver completamente imunizado pois tem problemas respiratório não acho justo haver reprovação esse ano