Já conhecido no mercado estrangeiro, o modelo de financiamento Contrato de Compartilhamento de Renda (ISA) está ganhando cada vez mais espaço no Brasil. Escolas de habilidades e profissões digitais são o modelo de negócio mais adepto a oferecer cursos em que o aluno só paga depois de estar formado e empregado com uma remuneração mínima.
A premissa é afastar os estudantes de juros altos, capacitar novos profissionais de tecnologia e então dar oportunidades a quem não tem recursos. Comprometendo-se a compartilhar parte de sua renda futura, qualquer um pode aprender as competências digitais mais procuradas pelas empresas, de programação à gerência de produto e análise de dados.
No Brasil, de acordo com dados da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), até 2024, 421 mil postos de trabalho serão criados no setor de tecnologia no país. Entretanto, os cursos superiores da área formam menos de 50 mil especialistas da área anualmente. No mundo, o World Economic Forum estima que mais de 50% da força de trabalho mundial precisará de requalificação até 2022.
A startup de educação digital Tera é uma das adeptas ao novo formato. Depois de ter trabalhado com outras opções financeiras para minorias do mercado de trabalho — como negros e mulheres —, com descontos que podem chegar a R$2 mil, a edtech então decidiu ampliar o acesso aos seus cursos.
Em agosto de 2020, começou a oferecer a opção de Contrato de Compartilhamento de Renda no programa de Ciência de Dados, que custa R$ 8,4 mil e tem duração de seis meses. “Por causa da carência de mão de obra no setor de tecnologia, as instituições estão buscando aproveitar a combinação de alta demanda por profissionais com a flexibilidade nas exigências de qualificação. Sendo assim, muitos negócios já não exigem mais que os funcionários tenham graduação, aceitando cursos especializantes como experiência de estudo”, explica Leandro Herrera, CEO e fundador da Tera.
Em agosto de 2020, eram oito estudantes financiados. Mas hoje, para 2021, a expectativa é de totalizar 150 pessoas até o final do ano.
Deborah Salles Machado, de 29 anos, foi uma das alunas financiadas em 2020 no curso de UX Design. Ilustradora, formada em Design Gráfico pela Faculdade de Belas Artes em São Paulo, o ISA se mostrou a melhor oportunidade para ela, que era freelancer na época e tinha a renda instável, a impossibilitando de se comprometer com o pagamento do curso.
“Eu conheci o ISA pelo meu marido. Ele sabia que eu queria dar uma mudada na carreira e me contou sobre algumas empresas de tecnologia que estavam com esse modelo novo. Eu achei super interessante a proposta em si, porque para mim foi muito óbvio. Há um interesse da escola alinhado com o interesse do aluno em dar resultado. Por que tudo não é assim? Fiquei muito fascinada”.
Graduada em 2017, Deborah nunca teve contato com o digital. Trabalhava em revista impressa e não entendi a área de atuação em UX. “Eu sempre desenhei, acabei fazendo design gráfico na tentativa de entrar mais facilmente no mercado. Só que a graduação, que eu iniciei lá em 2012, foi mudando muito ao longo dos anos. Mas eu nem cheguei a ter UX na faculdade, não era um termo falado”, conta.
Hoje ela trabalha como UX Designer na Provi, startup de crédito educacional, trabalho que conquistou dois meses após a finalização do curso. “Sempre tive o pensamento de que chegaria no primeiro emprego relacionado a UX totalmente perdida. Mas eu estou resgatando tudo o que eu aprendi na minha carreira como designer gráfica. Tem muito a ver”, conta.
Com a Tera, o estudante só paga quando conseguir um emprego com salário acima de R$ 3,5 mil. Quando conquistado esse valor, é cobrado mensalmente 17% dele para o pagamento do curso, independente se a renda for muito maior ou não.
Para este ano, o plano é investir na modalidade em todos os cursos que cobrem áreas como:
- Product Management;
- User Experience Design;
- Digital Marketing;
- Data Analytics.
O formato também será incluído no relançamento do curso de Data Science, que terá oito meses de duração e será um dos mais caros oferecidos pela escola.
No Contrato de Compartilhamento de Renda os alunos podem pegar dinheiro emprestado da própria instituição de ensino ou de um provedor terceirizado. Como é o caso da Provi, que opera esse tipo de sistema desde 2019. A empresa recebe parte das mensalidades pagas pelos alunos ou, então, antecipa o capital para que as escolas possam funcionar.
Os cursos abrangidos pela fintech têm duração entre seis meses e um ano. Dessa forma, o custo varia de R$ 6 mil a R$ 40 mil e valor da renda mínima estabelecida de R$ 1,5 mil a R$ 3,5 mil. Hoje, a fintech oferece o modelo para aulas on-line em 20 escolas parceiras distribuídas pelo país, mas em outubro de 2020, eram 12 instituições. De acordo com Herrera, a demanda cresceu pela maior busca das empresas por desenvolvedores, pelo aumento do desemprego e pela vontade de profissionais de transicionar de carreira e se desenvolverem para avançar profissionalmente, mantendo sua competitividade no futuro.
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