Carteiras enfileiradas, alunos sentados, quadro cheio de informação e professores no tablado expondo conteúdo por 50 minutos. Esse é o cenário que estamos acostumados a observar. Essa é a posição comum do professor: deter o conhecimento e passá-lo para a turma. Entretanto, sabemos que a eficácia dessa metodologia não é a prova de balas, mesmo ainda sendo a mais utilizada pelas instituições de ensino na contemporaneidade. Nos últimos anos, tem se debatido uma mudança, deslocando o professor do centro da sala de aula para tomar uma postura mais permeável aos alunos como facilitador e mediador.
A relação aluno-mentor ou aluno-personal deve ser pautada em segurança e personalização. O mentor, portanto, precisa criar um laço de confiança com o aluno. Se esse não for o caso, o estudante não irá seguir as recomendações do profissional e o andamento da parceria será prejudicado.
Isso se torna mais complexo quando estamos falando de um professor tradicional, que por ter vários alunos é impossibilitado de se aproximar de cada um. Uma alternativa para isso é ser um bom mediador e inverter o papel do aluno, passando-o de coadjuvante para protagonista.
Diferente de iniciar a aula e apresentar um tema por cinquenta minutos, mediar é conduzir e auxiliar os alunos a conectar diferentes pontos já assimilados com os novos que estão sendo propostos, encorajando o estudante a promover o seu próprio aprendizado.
Existem diversas formas de mediar a aprendizagem com um impacto positivo para os participantes. Um exemplo de prática para mediar um encontro é trazer, para a sala de aula, os quatro passos da “Four-fold practice” (Prática Quádrupla), da organização Art of Hosting:
Estar presente
Pode parecer óbvio, mas estar presente na aula é algo que tem ficado cada vez mais difícil no dia a dia acelerado que vivemos. Antes de iniciar qualquer aula, é necessário estarmos totalmente presentes naquele momento. Para qualquer atividade que fazemos como muita frequência, podemos entrar em estado de piloto automático.
A aula dada por professores também se enquadra nisso, pois, de tanto darmos a mesma aula, entramos em piloto automático e não nos conectamos com o que estamos fazendo, e, consequentemente, não nos conectamos com os alunos. O mesmo acontece com os alunos; para que o momento seja significativo, todos os alunos devem estar presentes para a tarefa em questão.
O trabalho do momento deve ser a única coisa a prender a atenção dos alunos e, portanto, o foco é fundamental. Qualquer coisa que ajude o grupo a perceber que estão em um momento diferente – seja físico ou imaterial – ajudará os participantes a chegar à presença necessária para fazer um trabalho mais profundo.
Um minuto de silêncio, pedir que os alunos leiam algo relevante em silêncio, iniciar com uma pergunta de V ou F, são formas de trazer de volta a consciência da turma para o que está e será feito.
Participar e praticar a escuta
A participação é fundamental na prática quádrupla tanto dos participantes quanto do moderador. Participar não se refere somente falar ou fazer algo, envolve também ouvir e prestar atenção com interesse no que está sendo dito.
De fato, podemos relembrar uma passagem importante do livro Como fazer amigos e influenciar pessoas, no qual Dale Carnegie mostra a importância de nos interessarmos genuinamente pelo que as pessoas nos falam.
Da mesma forma, o aluno não pode estar escutando passivamente ansioso para aula finalmente acabar. Ambos os comportamentos monótonos não estimulam a curiosidade e, assim, não movem o aluno em direção ao autoaprendizado.
Em suma, o professor tem que encorajar os alunos a estarem dispostos a falar com intenção e ouvir com atenção, sem julgamentos.
Seja um moderador
Moderar uma aula não é apenas lançar um tema ou uma atividade e deixar os alunos conduzirem da forma que lhe convirem. Há necessidade de diretrizes como tempo, assunto, ferramentas, entre outros.
O papel do moderador é prestar atenção ao espectro da atividade para que os alunos possam operar de diferentes formas dentro desse espaço. Às vezes, isso envolve desestimular uma ação se essa for muito fora do proposto, mas não julgando e sim aconselhando.
Da mesma forma, pode-se chamar a atenção para um propósito comum entre os alunos, engajando-os. Assim, o moderador tem um papel fundamental na manutenção de um “ambiente” favorável, seguro e que recompense a criatividade ao invés de exigir uma única linha padrão de pensamento como propósito da atividade.
Estimule a co-criação
Esse ponto não diz respeito a simplesmente falar “trabalhem em grupo!”, o que, por muitas vezes, resulta em alunos dividindo a tarefa em partes iguais e cada um fazendo sua parte individualmente.
Quem nunca participou de um grupo que dividiu o trabalho para cada integrante e só juntou novamente no dia da entrega ou da apresentação? Pois bem, desafios complexos exigem a participação plena e a colaboração é fundamental para a formação de novas ideias e de relacionamento.
Ações como fazer networking ou participar de um mastermind são exemplos daquilo que promove conexão entre pessoas para se chegar em um objetivo dificilmente alcançado sozinho. Por que não estimular o mesmo nos alunos? Estimular o diálogo combinando os conhecimentos e experiências dos integrantes de um grupo resulta em relacionamentos sustentáveis, em novas ideias e percepções.
Quando as coisas são verdadeiramente participativas, os alunos podem apontar concretamente a maneira como contribuíram para o resultado final e passam a se sentir pertencentes a algo maior, junto com um compromisso contínuo que se estenderá aos demais membros do grupo.
No último artigo “Mentor de estudos: uma nova abordagem para o ensino personalizado”, foi abordado uma nova forma de se enxergar a interação de alunos com os profissionais da educação. O mentor ou personal de estudos trabalha para guiar o estudante no rumo adequado, ajudando-o com organização, planejamento, motivação e priorização.
Sabemos que é complicado para professores executarem todas essas atribuições em sala de aula por conta do grande número de alunos. Entretanto, existem alguns pontos levantados acima que os docentes podem introduzir e aplicar durante as suas aulas que, sem dúvida, estimularão o pensamento crítico e lógico dos alunos deixando-os mais conscientes de seus próprios erros e contribuindo de forma semelhante à profissão do mentor/personal extraclasse.
*artigo escrito por Lorenzo Ferrari Assú Tessari, especialista em aprendizagem e metodologias de ensino e diretor e cofundador da Gama Ensino e da Anole.