Segundo aponta a recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, a Pnad 2011 do IBGE, 39,2% dos trabalhadores apresentaram carteira de trabalho assinada em um contexto no qual a taxa de desocupação foi de 6,7%. Com tamanha informalidade no mercado de trabalho, não deveria surpreender o fato de que a produtividade média da economia brasileira seja baixa. O rendimento médio mensal das pessoas ocupadas ficou em R$1.345, sendo que esse número foi menor nas regiões Norte (R$1.100) e Nordeste (R$910). Existem ainda muitos outros números interessantes e merecedores de nossa atenção.
O analfabetismo para pessoas de quinze anos ou mais ficou em 8,6% (12,9 milhões), sendo que Norte (10,2%) e Nordeste (16,9%) ficaram acima da média nacional. A taxa de analfabetismo cresceu com a idade, ou seja, ela é proporcionalmente maior para pessoas com mais de cinqüenta anos (18,6%) do que para adolescentes entre quinze e dezessete anos (1,2%). Para adultos entre 25 e 49 anos o analfabetismo pode chegar aos 8,1%. Estima-se ainda que os analfabetos funcionais representem 20,4% das pessoas (30,5 milhões) com quinze anos ou mais e menos de quatro anos de estudo, concentrando-se a sua maioria nas regiões Nordeste (30,9%) e Norte (25,3%). Não deveria causar surpresa entre nós uma escassez de mão de obra qualificada.
Pesquisas econométricas internacionais chegam a apontar que para cada ano de escolaridade aumenta-se em 10% o salário do trabalhador (cf. Charles I. Jones, Introdução à teoria do crescimento econômico. Elsevier, 2000). A mão de obra das distintas economias no mundo possui diferentes graus de instrução escolar e qualificação profissional, o que acaba se refletindo em boa medida no desenvolvimento diferenciado dos países. O modelo básico pode ser simplificado através da seguinte função de produção Cobb-Douglas:
Y = K^α(AH)^1-α
Onde Y é o produto (renda) da economia obtido pela combinação do capital físico K e do trabalho qualificado H, sendo que A representa a tecnologia de produção e α é um número entre 0 e 1. Trabalho qualificado é importante para que a mão de obra saiba lidar de maneira eficiente e eficaz com os recursos tecnológicos de produção disponíveis. Em termos de sustentabilidade intertemporal desse processo, parte do produto precisa virar investimento ao invés de ser integralmente consumido. Não se pode negar ser a demanda de consumo importante para instigar o espírito animal no empresariado, porém tampouco podemos impunemente desconsiderar a histórica restrição externa no balanço de pagamentos ao crescimento sustentado da economia brasileira. Conhecemos bem como a cópia acrítica dos padrões de consumo dos países mais desenvolvidos cobrou sua conta, inclusive através do persistente processo de concentração da renda. Certos aspectos qualitativos do crescimento econômico ainda precisam ser mais debatidos entre nós.
Já vivemos crises dramáticas no passado por conta dessas questões e as receitas ortodoxas empregadas ex post foram muito duras para a nossa economia. Houve ainda quem acreditasse que cresceríamos ilimitadamente com poupança externa porque havíamos supostamente adentrado em um novo admirável mundo de paz perpétua e convergência socioeconômica geral. Desconsideraram-se os riscos de déficits persistentes na conta corrente do balanço de pagamentos. Para esses utópicos defensores de um mercado auto-regulado, bastava manter a economia brasileira atraente ao capital estrangeiro, privatizando ativos estatais rapidamente, sem muita preocupação ex ante de como iriam ser efetivamente regulados esses setores, alguns em regimes de monopólio natural e fraca concorrência, e ainda apertando a política monetária com juros na estratosfera. Esta herança persiste e pesa nos orçamentos das famílias brasileiras.
Segundo aponta o Banco Central do Brasil, ao se decompor o IPCA em preços livres e em preços administrados, nota-se que, entre 1996 e 2007, a inflação dos preços administrados foi sistematicamente maior que a inflação dos preços livres (BCB, janeiro de 2012). Ainda para o BCB: O elevado peso dos preços indexados à inflação passada na composição dos índices de preços dificulta a gestão da política monetária. A inflação dos preços administrados apresenta maior grau de persistência do que a inflação dos preços livres, aumentando a inércia inflacionária geral.
Há, portanto, uma profunda e complexa agenda política de reformas progressistas que precisa ser discutida no Congresso Nacional reforma tributária de corte progressista, educação pública universal e de qualidade, regulação institucional eficaz das atividades econômicas, por exemplo. Afinal, faltam-nos estadistas e partidos políticos à altura desses desafios? Por que os diagnósticos ficam tanto tempo engavetados e há tantos bloqueios institucionais, formais e informais, aos encaminhamentos por reformas progressistas? As condições estruturais para que a produtividade média evolua positivamente precisam ser institucionalmente construídas pelas vias políticas.
Rodrigo L. Medeiros (D.Sc.) é membro da World Economics Association (WEA)