Um paradoxo antigo…..cuidar do desemprego, da baixa escolaridade, da evasão escolar: cuidar da causa. Entregar cestas básicas, roupas e cobertores: cuidar da consequência. Propor cursos de capacitação profissional, incentivar a Educação para Jovens e Adultos (EJA), ter eficientes métodos de encaminhamento ao mercado de trabalho, apoiar a infraestrutura e crédito dos pequenos negócios: cuidar a causa. Ofertar benefícios pecuniários de transferência de renda ofertando bolsas diversas: cuidar da consequência. Encher os CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) de oficinas lúdicas para fortalecer a convivência e vínculos nas famílias e implantar programa de acesso ao mundo do trabalho (ACESSUAS): cuidar da causa. Colocar servidores públicos para oferecer como atividade principal o preenchimento do Cadastro Único e acionar polícia para expulsar pessoas em situação de rua: cuidar da consequência. Causa ou consequência? A métrica do resultado da consequência é mais simples, é uma contagem numérica cardinal: 200 cestas, 1000 peças de roupa, 5000 bolsas família distribuídos, 10.000 cadastros único realizados. Seguindo essa lógica, ações do Primeiro ou Terceiro Setor que cuidam das consequências são mais baratas e envolvem mão de obra mais fácil de encontrar no mercado.
A métrica de resultados de ações que cuidam das causas, é mais trabalhosa e complexa. Acompanhar redução de evasão, aumento de rendimento escolar e nível de escolaridade, número de empregos alcançados ou aumento da renda média familiar. Estes projetos e ações em regra são mais onerosos e demandam mão de obra especializada. Do que deve cuidar o Terceiro Setor? A que se propõe? Para que nasceu o Terceiro Setor? Dizem que foi para atuar de maneira complementar à atuação do Estado (Primeiro Setor) e por ineficiência deste, o que causou a mobilização da sociedade civil. Então, reflitamos: do que cuida o Primeiro Setor? Da causa ou da consequência? Qual é a prioridade de investimento orçamentário do Estado, a causa ou a consequência? Então……o Terceiro Setor vai sempre complementar a atuação do Estado, correto? Por lógica, se o Estado atua na causa o Terceiro Setor complementa sua atuação e se atuar na consequência, o Terceiro Setor o acompanha também, certo?
Se o Estado tiver como prioridade a oferta de cesta básica, cobertores, roupas, bolsas pecuniárias e oferta de cadastro único, o Terceiro Setor deve acompanhar de maneira complementar e ofertar mais do mesmo, certo? Foi essa a inquietação da sociedade civil nos anos 60 e sua percepção de motivação para sair da inércia?
Está errado cuidar da consequência? Claro que não! Mas devemos perpetuar as consequências? Também não! E qual o papel do Terceiro Setor nisso? O quanto está este setor, criado por revolta da sociedade civil com a “ineficiência do Poder Público”, colaborando ou combatendo da perenização das consequências?
O quanto custa para um financiador privado o investimento na causa ou na consequência escolhida pelo Terceiro Setor?
Sempre serão gestões de instituições do Primeiro e do Terceiro Setor que farão suas escolhas, optando pela causa ou pela consequência. Assim como sempre existirão investidores privados que financiarão o tratamento da causa ou da consequência. A reflexão que proponho é para posicionamento: o que você, que é do Terceiro Setor, está disposta a tratar? Causa ou consequência? O que você, gestor público ou financiador privado, vai escolher atacar? Causa ou consequência?
Seja o dinheiro privado é de uma empresa ou, seja o dinheiro público de uma política pública, sempre haverá um “dono” desse recurso….um empresário ou uma população que paga impostos. Esse “dono” dos recursos seria o que deveria decidir se o usa para atacar a causa ou a consequência, concordam? O que será que escolheria o empresário?
Depende…..se a cultura dele é de marketing ou de transformação do tecido social. Agora…..o que será que escolheria a população? Atacar a causa ou a consequência?
Depende….se o “pão e circo” é suficiente, ou se há pré-disposição para encarar a co-responsabilidade social, arregaçar as mangas e corrigir suas fragilidades!
De qualquer forma, ficam pelo menos duas obrigações claras: consultar o “dono do dinheiro” e escolher sua posição como ator (Terceiro ou Primeiro Setor): agente de transformação ou conivente com o vitimismo da consequência. A vida é feita de escolhas!!! Faça a sua, assuma claramente e com dignidade e seja feliz com a felicidade que irá provocar nas pessoas atendidas.