Cultura

A Revolução dos Bichos: descubra quem é quem na fábula de George Orwell 

A Revolução dos Bichos: descubra quem é quem na fábula de George Orwell 

O artigo que escrevi aqui no Vem Ler Comigo sobre A Revolução dos Bichos, do escritor britânico George Orwell, é um dos mais famosos do nosso blog. Isso é apenas o reflexo da fama mundial e atemporal que a obra ganhou. Uma prova é a Modern Library List incluí-lo no rol dos 100 melhores do século 20. 

Mas engana-se quem pensa que o aclamado autor inglês estava falando sobre os direitos dos animais. A Revolução dos Bichos é uma dura e profunda sátira sobre a Revolução Russa e o sobre o totalitarismo disfarçado no socialismo soviético. É por isso que cada personagem representa uma figura importante na história do socialismo moderno e entender bem esse papel é fundamental para captar toda a mensagem – e toda a verdade – que o escritor quis passar.

E caso você não saiba, Orwell era socialista. Quem diria, né? Ele jogava no time de intelectuais que acreditavam nas ideias levantadas por Karl Marx do socialismo como uma arma que levaria à liberdade e à igualdade, com verdadeiros representantes populares no poder.

Mas o que ele e o mundo viram na União Soviética foi um grupo de pessoas que miraram no socialismo, mas acertaram o totalitarismo e corromperam os ideais. No fim, o socialismo passa do sonho para uma dura realidade e o fim é o que era lá no início: a Granja do Solar governada pelos humanos.

Stálin e Karl Marx, dois nomes por trás de A Revolução dos Bichos

Todo esse enredo está bem explicado neste artigo aqui. Sugiro que você o leia primeiro e depois volte para perceber quem é quem na história.

Analogias e representações em A Revolução dos Bichos

Agora que você conheceu todo mundo na Granja do Solar, veja quem Orwell estava apresentando, na verdade:

Velho Major = Karl Marx / Lênin

Essa é uma das mais fáceis de entender. O Velho Major simboliza Karl Marx, quem começa a questionar o modo como o sr. Jones tratava os animais e, assim, a plantar as sementes da revolução na cabeça deles. É ele, também, quem se torna o líder do movimento, além de ser visto como o animal mais respeitado da fazenda. 

Além disso, tanto Major quanto Marx morreram antes de verem a revolução na prática. Entretanto, suas palavras ecoaram após a morte e influenciaram diretamente a Revolução Russa no caso de Marx e a Revolução dos Bichos no caso do Velho Major.

Lênin também teve uma função parecida, já que ele foi o líder da Revolução Russa durante um período importante. Após a morte do Major, dois porcos assumem a liderança juntos da Granja do Solar: Napoleão e Bola de Neve. Vamos falar sobre o primeiro deles.

Lênin discursando para uma multidão durante a Revolução Russa

Napoleão = Stálin

Napoleão é a versão suína pura de Stálin, o líder autoritário, violento e corrupto, uma versão distorcida do que Lênin acreditava.

Napoleão expulsa Bola de Neve da fazenda, passa a governar sozinho, pensa apenas nos interesses da sua espécie, altera os ideais, se relaciona com quem antes era inimigo e, no fim, se torna apenas mais um humano. Na visão de Orwell, foi exatamente isso que Stálin fez quando subiu ao poder: se corrompeu, se tornou autoritário e subverteu os princípios do socialismo em prol do que queria, sem considerar a população em nada.

Um exemplo é o mandamento “Todos os animais são iguais”, que de repente vira “todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros”.

Stálin, figura central na Revolução Russa e no livro de Orwell

Bola de Neve = Trotsky

Enquanto são os líderes da Granja, Napoleão e Bola de Neve passam a discordar em vários pontos. Napoleão, então, faz com que Bola de Neve seja expulso da fazenda e começa a pintá-lo como um verdadeiro inimigo dos animais, quem leva a culpa por tudo o que acontece na fazenda, mesmo nunca mais tendo sido visto. Exatamente como Stálin fez com Trotsky.

Garganta/Bocão = Propagandista do governo

O porco Garganta (ou Bocão, como sei que se chama em algumas edições) é a figura da propaganda do regime soviético, que apresenta uma realidade bem diferente da vista na prática, para manter a ordem e mostrar aos animais que a vida agora é melhor que a vivida nos tempos do sr. Jones.

Os animais trabalham mais, comem menos, mas os dados são diferentes: a comida é melhor e maior, o trabalho é mais digno, já que é para eles, e a qualidade de vida é superior. Ninguém via isso na prática, mas se o Garganta falava, só podia ser a verdade, afinal, ele era capaz de convencer que preto era branco.

Sansão = os trabalhadores comprometidos com o sistema

Sansão era a definição de força e dedicação. Com seu lema “trabalharei ainda mais” e “Napoleão tem sempre razão”, era um exemplo de compromisso com o regime e acredita piamente que vai se aposentar aos 12 anos, como prometido, com dois quilos e meio de milho por dia e oito quilos de feno no inverno, além de uma cenoura ou uma maçã nos feriados. Não para menos, não era um animal de muito intelecto, o exemplo de que força física sem consciência política mais atrapalha que ajuda.

Sansão, que já tivera tempo de pensar, expressou o sentimento geral: “Se é o que diz o Camarada Napoleão, deve estar certo”. E daí por diante adotou a máxima “Napoleão tem sempre razão” acrescentando-a ao seu lema particular “Trabalharei mais ainda”.

Ovelhas = propagadoras do regime 

Qualquer diálogo que colocasse em questão o governo de Napoleão era interrompido pelo balido das ovelhas “Quatro pernas bom, duas pernas ruim!”. Elas representam as pessoas “adestradas” pelo Estado, que não abrem espaço para nenhuma discussão. E, claro, como Sansão, não são uma fonte de intelectualidade.

Mimosa = burguesia

A égua que só queria saber de torrões de açúcar e fitas representa a burguesia que não estava nem aí para qual sistema regia a fazenda, desde que as suas vontades e vaidades fossem mantidas. Assim, ela representa a burguesia egoísta que se coloca acima dos outros animais.

Benjamim = quem aprendeu com a experiência

Benjamim é o animal mais idoso da fazenda e quem afirma que já viu onde toda essa treta vai acabar. É por isso que recebe a revolução com descrença e se mantém totalmente alheio às disputas políticas. É a representação da sabedoria dos mais velhos.

Moisés = a igreja

A começar pelo nome, o tal corvo que vive indo e vindo representa a igreja e, mesmo sem trabalhar, é tolerado pelos porcos.

Conclusão da obra

Orwell é um pouco de cada um desses personagens. Como os animais, ele acreditava na liberdade e na democracia que vinha do Socialismo, mas o poder corrompe quem o assume. Ele assistiu o totalitarismo de Stálin destruir os ideais levantados por Marx.

Para além disso, o escritor debate assuntos que atravessam os anos, como exploração do trabalho, manipulação da imprensa, repressão do estado, fake news, tortura e violência estatal, entre outras questões que ainda fazem – e provavelmente farão – parte dos governos.

Desde 1º de janeiro de 2021, A Revolução dos Bichos e todas as obras de George Orwell são de domínio público no Brasil. Isso significa que quem quiser publicar os livros do autor não precisa mais pagar pelos direitos autorais do texto original. Segundo essa normativa da Convenção de Berna, da qual fazem parte Brasil e Reino Unido, os direitos autorais sobre as obras expiram depois de 70 anos contados a partir do 1º de janeiro seguinte à morte do autor. Como Orwell morreu em 1950, ela agora está incluído nesse grupo.

Com isso, várias novas edições já começaram a aparecer no mercado. Além disso, o pdf está disponível gratuitamente aqui. Aproveite que as opções são muitas e leia A Revolução dos Bichos, especialmente em ano de eleição presidencial no Brasil. Com certeza, essa será uma valia muito importante na hora de decidir seu voto e reconhecer governos totalitários disfarçados de “democracia”. É uma leitura rápida, fácil, simples e profunda, tudo na medida certa. Gostou desse artigo? Vamos conversar sobre ele aqui nos comentários! Te espero!!