Uma das alternativas encontradas pelo Governo do Estado para ampliar a oferta de leitos de UTI exclusivos para pacientes infectados pelo novo coronavírus, a compra de leitos da rede privada pode estar ameaçada. Isso porque, de acordo com o Sindicato dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Espírito Santo (Sindhes), a capacidade de venda dessas vagas de UTI para a rede pública está perto do fim.
“Eu acho que, no momento, quem daqueles hospitais que tinha disponibilidade de contratualizar com a Secretaria de Saúde já o fizeram. Aqueles que hoje têm dificuldade de atender a essa demanda é porque estão reservando leito para os seus clientes e para cumprir os seus contratos em vigor”, destacou o superintendente do sindicato, Manoel Gonçalves Netto.
Na maior rede de hospitais particulares do Espírito Santo, a Meridional, 75% dos leitos de terapia intensiva reservados para pacientes com covid-19 já estão ocupados. O diretor médico corporativo da rede, Paulo Lellis, avalia criar ainda mais vagas.
“Existem remanejamentos. São áreas que são trabalhadas e algumas enfermarias são transformadas em UTI, principalmente os leitos de apartamento, que são isolamentos”, disse.
Em geral, 27 leitos de UTI foram abertos desde o início da pandemia. Parte das vagas deverá ser vendida para a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) para reforço do combate ao coronavírus, mesmo que hoje 80% das vagas estejam ocupadas.
“A nossa taxa de uso de leitos abertos e enfermarias se mantém estável e, com a diminuição da parte do trauma e, felizmente, pela procura de algumas doenças, nós conseguimos equilibrar isso”, frisou Paulo Lellis.
Já foram comprados pela Sesa, até a tarde desta segunda-feira (18), 149 leitos de UTI exclusivos para covid-19, em dois hospitais particulares e em sete hospitais filantrópicos da Grande Vitória e do interior do estado. O governo estadual garante que, nas próximas duas semanas, mais 80 vagas serão adquiridas.
“Nós estamos concluindo a contratação de leitos da iniciativa privada, ampliando essa contratação, porque ela já existe. Essa semana serão mais 40 leitos de UTI da iniciativa privada e, na próxima semana, outros 40 leitos de UTI”, afirmou o subsecretário de Vigilância em Saúde da Sesa, Luiz Carlos Reblin.
A doença segue avançando rapidamente, resultando em uma taxa de ocupação de leitos de UTI cada vez maior na rede pública do Espírito Santo. Em todo o estado, essa taxa é hoje de 78,1%. Na Grande Vitória, a situação é ainda mais preocupante, com 83,3% dos leitos de UTI exclusivos para covid-19 ocupados.
“Quando os leitos de UTI destinados à covid-19 bateram acima de 80% da taxa de ocupação, sinalizaram que houve demora na tomada de decisão em abrir novos leitos ou contratar na rede privada”, comentou o especialista em gestão pública e professor do curso de pós-graduação em Gestão Hospitalar da UVV, Wallace Millis.
“Se a gente pega todos os números de casos, diminui o número de óbitos e o de curados, a gente vai ter um número de 3.837 que estão ativos. Eles não estão curados e nem foram a óbito. Ou seja, a gente está com 3.837 pacientes confirmados com coronavírus e a gente não sabe qual vai ser a evolução: se vai ser cura, se vai ser internação na enfermaria, se vai ser internação na UTI ou se vai ser óbito. E com uma taxa de ocupação de UTI de 80%”, alertou o anestesista Adenilton Rampinelli, que atua em unidades de terapia intensiva.
Ocupação das vagas adquiridas
A produção da TV Vitória/Record TV fez um levantamento das vagas nos hospitais que já fecharam contrato com o governo estadual. No hospital Santa Mônica, em Vila Velha, 18 dos 20 leitos de UTI exclusivos para o coronavírus estavam ocupados até o final da tarde desta segunda-feira. No Vitória Apart Hospital, na Serra, 14 das 20 vagas compradas estavam ocupadas.
No Hospital Evangélico de Vila Velha, a situação era ainda mais complicada. Segundo o próprio painel da Sesa, todas as dez vagas de UTI compradas estavam ocupadas.
A produção da TV Vitória também perguntou a todos os nove hospitais qual é o total de leitos de terapia intensiva disponíveis em cada um deles, quantos são exclusivos para covid-19 e se ainda há negociação com o Governo do Estado para aquisição de outros leitos para enfrentamento à pandemia. O hospital São Camilo, em Aracruz, disse que está em processo de negociação. Já a Santa Casa de Cachoeiro de Itapemirim informou que, até a última sexta-feira (15), possuía 43 leitos de UTI, sendo que 26 eram exclusivos para covid-19. A taxa de ocupação era de 70%. Os outros hospitais não responderam.
O especialista em gestão pública não descarta um colapso na rede privada. “É possível haver um colapso em todo o sistema de saúde. Nós estamos passando por um processo inédito, um processo que nós nunca imaginamos antes”, destacou Millis.
Hospital de campanha
Uma das opções apresentadas pelo sindicato que representa os estabelecimentos particulares de saúde do estado são os hospitais de campanha. No entanto, segundo Manoel Gonçalves Netto, colocar essas estruturas em funcionamento não é tão rápido quanto parece.
“Hospital de campanha é muito fácil para construir, mas difícil para botar em operação. Porque hoje qual é o maior dificultador? É o equipamento, principalmente o respirador, que hoje virou uma palavra rotineira para nós da população”, ressaltou o superintendente do Sindhes.
Diante desse cenário, o médico intensivista afirma que a única forma de evitar a falta de atendimento aos pacientes graves da covid-19 é manter as medidas de distanciamento social.
“A única unanimidade que a gente tem na ciência hoje para o controle do coronavírus é o isolamento social. Drogas estão sendo testadas, estudos estão sendo realizados, mas ainda não é nada robusto para definir uma conduta única e curativa”, frisou Rampinelli.
Com informações da repórter Fernanda Batista, da TV Vitória/Record TV