“Cheio de esperança e preparado para voltar para casa”. Foi assim que Igor Barcelos Ortega, 22 anos, escreveu no último domingo (28), de dentro da penitenciária de Irapuru, a cerca de 620 km de São Paulo, sobre a expectativa para o julgamento em segunda instância do processo que responde.
Em junho de 2017, o jovem foi condenado a 15 anos e seis meses de prisão em primeira instância por roubo e tentativa de latrocínio que afirma não ter cometido. Nesta terça-feira (30), o 2º Grupo de Câmaras de Direito Criminal deve julgar recurso que decide o futuro do rapaz.
“Estou pagando por algo que não cometi e isso me deixa muito revoltado. Mas Deus sabe de todas as coisas, eu entreguei tudo nas mãos do pai, porque ele sim sabe o que fazer”, escreveu Igor para reportagem.
Na rua, a luta para provar que o rapaz é inocente, encabeçada pela mãe dele, Elisabeth Barcelos, 38 anos, começou logo depois de a Justiça de São Paulo apontar que Igor foi o responsável por um roubo e uma tentativa de latrocínio em outubro de 2016. O caso se tornou conhecido após reportagem do R7 logo depois do julgamento.
Quando foi condenado, Igor já estava oito meses preso preventivamente. O jovem responde pelo roubo do carro e do celular de um comerciante de Guarulhos, e uma suposta tentativa de latrocínio contra o soldado da PM Felipe Bruno dos Santos Pires, em 2 de outubro de 2016.
“Só eu sei o que estou passando longe da minha família, longe das pessoas que eu mais amo. É difícil para um filho ficar longe da sua mãe e também é muito difícil para uma mãe ficar longe do seu filho”, escreveu Igor.
No dia da prisão, o jovem estava indo de uma festa para outra na região onde mora, no Jardim Corisco (periferia da zona norte de São Paulo). Ele estava em uma motocicleta acompanhado de seu irmão e outro amigo em outra motocicleta.
Quando estavam passando pela avenida Sezefredo Fagundes, próximo da casa onde moram, um carro se aproximou e começou a disparar. Igor foi baleado no tornozelo esquerdo.
O jovem foi socorrido por amigos e levado para o Hospital São Luiz Gonzaga, no Jaçanã (zona norte). Pouco depois de dar entrada no hospital, policiais militares chegaram ao local e fotografaram o jovem.
Na mesma noite, a PM prendeu o rapaz sob a acusação de ter participado do roubo de um Volkswagem Gol e um aparelho celular na rua Monsenhor Paulo, Jardim Marilena, e uma tentativa de latrocínio contra o soldado Pires, na rua Pedro de Toledo, bairro de Taboão, ambos em Guarulhos.
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A polícia apontou que o rapaz participou da tentativa de latrocínio contra o soldado Pires porque o policial teria atirado contra os criminosos. Os PMs, então, deduziram que algum dos suspeitos teria sido atingido pelo tiro.
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Na ocasião, o policial militar apontado como vítima disse à Polícia Civil que sofreu a tentativa de latrocínio por volta das 5h40, reagiu e atirou nos suspeitos. O crime contra ele teria acontecido quatro minutos antes de Igor dar entrada no hospital que fica a 12,2 km de distância de onde ele reagiu ao assalto.
A Polícia Militar prendeu, na mesma noite, um estudante de 20 anos. Este rapaz teria confessado à Polícia Civil que participou do roubo do carro e do celular, e disse que estava com outras duas pessoas.
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O estudante, no entanto, negou que tenha participado da tentativa de latrocínio contra o soldado da Polícia Militar e disse, durante o processo, que não conhece Igor — indicando que o jovem não participou do crime.
Durante o processo, o dono do Volkswagen Gol e do celular disse ter reconhecido o estudante e Igor como autores do crime, e afirmou que “o mais moreno” (no caso, o estudante) era quem portava a arma.
Já o soldado Pires reconheceu o estudante, mas não Igor, como participante da suposta tentativa de latrocínio.
A prova que levou a Justiça a condenar Igor foi o reconhecimento fotográfico feito pela vítima do roubo — dono do veículo e do aparelho celular. Mas, de acordo com o que foi registrado no Boletim de Ocorrência do 7º DP de Guarulhos, o reconhecimento não seguiu o procedimento legal do CPP (Código de Processo Penal).
A lei prevê que o suspeito que passar por reconhecimento deve ser posto ao lado de outras pessoas com características semelhantes, para a vítima fazer o reconhecimento com o máximo de precisão possível. Não foi isso que aconteceu.
Conforme o registro da Polícia Civil à época, os PMs cabo Viana e cabo Peres, ambos da 3ª Companhia do 15º Batalhão, se deslocaram para o hospital onde Igor foi socorrido após receberem a informação de que um jovem estava sendo atendido vítima de um tiro. No local, os PMs tiraram fotos de Igor e mostraram para a vítima do roubo reconhecer.
Diante das frágeis provas contra, Igor diz que tentou apontar seus indícios de inocência, dentre elas as imagens de câmera de segurança que mostravam o momento quando ele foi baleado. No entanto, a Justiça não aceitou, alegando que não dava para ver quem aparecia na filmagem. “Isso me desanimou, foi o fim pra mim”, disse o rapaz.
A esperança de Igor e da família ganhou força novamente no dia 28 de maio deste ano, quando o caso foi para ser julgado em segunda instância. O relator do processo, desembargador Ruy Alberto Leme Cavalheiro, votou favorável ao jovem, pedindo sua absolvição.
Depois do voto do relator, foi pedido vista do processo. Após dois meses, o caso de Igor volta à pauta e deve ser julgado nesta terça-feira, no Palácio de Justiça de São Paulo.