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Dia da Mulher: motoristas do Transcol desviam do preconceito e se orgulham da profissão

As histórias das mulheres motoristas entrevistadas pelo Folha Vitória são exemplos de determinação e luta contra o preconceito

Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal

Josineia dos Santos Carangola, a Deia, tem 57 anos e é motorista há mais de 7 anos

Embarcar em um ônibus e seguir para o trabalho ou para estudar é algo tão comum na vida das pessoas que, muitas vezes, quem está conduzindo o veículo nem é notado. Em um ambiente predominantemente masculino, a presença de motoristas mulheres é um fator que não passa despercebido.

Pelas ruas da Grande Vitória, dirigindo ônibus do Transcol, elas não são a maioria, mas fazem a diferença nas linhas em que circulam. Piadas de mau gosto, preconceito ou machismo já são coisas que nem abalam o amor pela profissão.

A Josineia dos Santos Carangola, de 57 anos, mais conhecida pelos colegas de profissão e passageiros como Deia, conta que o preconceito já ficou para trás. Segundo ela, no início era mais comum ouvir piadas e críticas. No entanto, com competência e determinação, ela mostrou que lugar de mulher é onde ela quiser.

“Quando eu comecei, percebi que havia o preconceito. No meu caso, aconteceram algumas vezes. Passageiro já entrou no ônibus, olhou para minha cara e desceu. Era preconceito não só de homem, mas também de mulheres. Mas eu nunca estava nem aí com que os outros falavam. Não me importava com o que o pessoal pensava. Eu estava onde eu queria e fazendo o que eu queria”, contou.

Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal

Solange Campos da Silva é motorista do Transcol

A motorista Solange Campos da Silva, de 45 anos, já está na profissão há mais de seis anos. Apesar de ser formada em outra área, a Sol, como é chamada pelos colegas, se sente realizada conduzindo a população em um coletivo.

Segundo Solange, situações de preconceito existem sim. No entanto, a maior parte dos casos são cometidos pelas próprias mulheres.

“O maior tipo de preconceito que a gente vem enfrentando, hoje até menos, vieram das próprias mulheres. Já aconteceu de eu chegar no ponto e alguém falar ‘vamos, fulana’ e ela dizer que não iria, justamente porque era mulher que estava dirigindo. Infelizmente, a mulher tem mais preconceito do que o homem”, relata.

“Homem ainda fala ‘vocês vão mandar no mundo’, ‘vocês estão tomando o mercado’. Sempre é uma demonstração de carinho, elogiando”

Segundo o Sindicato das Empresas de Transporte da Grande Vitória (GVBus), todas as colaboradoras do Sistema Transcol são orientadas sobre como proceder em caso de assédio nos coletivos, nas situações em que elas sejam vítimas ou alguma passageira, o que inclui acionar a polícia. Em casos de assédio, os passageiros também podem fazer denúncias pelo 181.

Elas superaram desafios para entrar na profissão

Josineia e Solange são apenas duas das várias mulheres que estão todos os dias nas ruas da Grande Vitória e conduzindo milhares de passageiros. De acordo com o GVBus, em todo o sistema, 85 mulheres atuam como motoristas nos ônibus do Sistema Transcol. O sindicato garante que não há diferença salarial entre mulheres e homens que ocupam o mesmo cargo no sistema.

As histórias de cada uma, sem dúvida, são exemplos de determinação, luta contra o preconceito e realização. 

A Deia, por exemplo, é motorista do Transcol há cerca de sete anos e conta que, desde criança, sempre teve o sonho de estar à frente de um veículo de grande porte. E foi com quase 50 anos que teve a oportunidade de realizar o desejo.

“Sempre tive sonho de ser motorista de carro grande. Eu tive meu próprio carro e, quando eu menos esperava, fui parar na empresa de ônibus. Fiquei por uns 8 anos como cobradora e começou o desejo de ‘ir para o volante’, mas não tinha nenhuma mulher motorista e fiquei na minha. Quando começaram a surgir as mulheres motoristas, eu quis entrar. A empresa me abraçou neste caso. Acho que foram cerca de 2,5 anos, com treinamento na rua e na garagem, até eu ir para a rua”, contou.

Hoje, realizada e com o amor pela profissão tão grande, Deia fez questão de marcar isso em seu próprio corpo. 

Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal

Tatuagem feira pela Deia

“Eu gosto dessa profissão e tenho orgulho. Tirar o ‘busão’ da garagem é uma satisfação muito grande. Seis meses depois que eu estava na empresa, não tinha tatuagem nenhuma. Foi quando fiz a minha primeira e foi um ônibus dentro de um coração. Entrei para essa carreira de motorista com quase 50 anos. Hoje estou com 57 e espero ficar nesta carreira até quando Deus quiser”, afirma.

Com a Solange, não é diferente. Segundo ela, mesmo com todas as dificuldades do treinamento até ser promovida a motorista, tem orgulho do que faz.

“Para mulher tudo é um pouco mais difícil. Para mim, foi muito difícil a parte da manobra, pois o serviço é muito pesado. Hoje, eu não tenho o que reclamar. Foi duro, foi difícil, já pensei em desistir, mas cheguei até aqui e não me arrependo de ter chegado até onde cheguei”, comemorou.

Caminho até a profissão é longo e cansativo

O caminho percorrido pela Josineia, pela Solange e tantas outras mulheres (e homens) que sonham em se tornar motoristas do Transcol é longo. Além de cumprir todas as regras para ter a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) categoria D ou E, ainda passam por muitos treinamentos.

Elas, que trabalham na mesma empresa, contaram que começaram como cobradoras e viram a oportunidade de se tornarem motoristas com os treinamentos da chamada ‘escolinha’, que é uma espécie de teste feito pelas viações para dar oportunidades aos que têm interesse.

Depois de um certo tempo, elas passaram por um período de trabalho interno nas garagens, levando os ônibus que chegam das ruas para abastecimento, limpeza, estacionamento e até substituição de veículos nas linhas, quando necessário.

Este período, segundo elas, varia muito e depende do desempenho de cada um. Quando a empresa entende que já estão prontas, elas, finalmente, são escaladas nas linhas e promovidas a motoristas.

O GVBus ressalta que nas empresas operadoras, as mulheres também exercem outras funções tradicionalmente desempenhadas por homens. São cargos de manobrista, encarregado de tráfego, controle de operação, supervisão, auxiliar de tráfego, além de manutenção.