O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) foi criado em 1998 para democratizar o ensino superior e se tornou a principal porta de entrada para universidade públicas e privadas do país desde 2009.
A avaliação chegou a ter 8,7 milhões de inscritos em 2014, mas o número de participantes está em queda de forma contínua desde 2016, conforme revela reportagem do Portal R7 assinada por Vivian Masutti.
>> Quer receber nossas notícias 100% gratuitas? Participe da nossa comunidade no WhatsApp ou entre no nosso canal do Telegram!
Essa marca negativa atinge justamente o seu público-alvo: os alunos mais vulneráveis. São justamente aqueles que usam a nota do exame para acessar uma ampla variedade de instituições de ensino, tanto públicas quanto privadas, sejam elas presenciais ou a distância.
Eles recorrem ainda a bolsas de estudos ou utilizam programas como Sisu, ProUni ou Fies para alcançar esse objetivo.
Essa situação contribui ainda mais para a desigualdade no acesso à universidade, conforme aponta Ricardo Henriques, superintendente-executivo do Instituto Unibanco, um dos responsáveis pelo estudo “Oportunidades educacionais de estudantes concluintes do ensino médio: um estudo do Enem entre 2013 e 2021”.
Diante desse cenário, o presidente Lula fez um apelo aos estudantes alguns dias atrás, incentivando-os a se inscreverem para realizar o exame. “É importante que todos que queiram fazer uma universidade se inscrevam, para ter a oportunidade de ser doutor ou doutora”, disse ele.
LEIA TAMBÉM: Professora é demitida após falar do Brasil com alunos portugueses e vídeo viralizar
De acordo com Henriques, “na rede privada, 90% dos estudantes prestaram o Enem em 2016, porcentagem que caiu para 72% em 2021. Na rede pública, pouco mais da metade [55%] fez o Enem em 2016, o que já é um índice ruim. Mas, em 2021, esse percentual caiu para 26%”.
“Os resultados nos mostram um cenário de ampliação das desigualdades de oportunidades educacionais no país, e isso exige ações estruturais por parte dos governos e gestores públicos”, explicou Henriques.
O superintendente acredita que a pandemia do coronavírus tenha sido a principal razão de uma série de motivos responsáveis pela queda no número de inscrições, como o estabelecimento de regras muito rígidas para isenção de taxa.
“O mais grave deles foi certamente o advento da Covid-19, que, em conjunto com uma forte crise econômica, dificultou enormemente o interesse e a participação dos estudantes no Enem, principalmente os mais vulneráveis”, disse.
Segundo Ricardo Henriques, “os resultados nos mostram um cenário de ampliação das desigualdades de oportunidades educacionais no país, e isso exige ações estruturais por parte dos governos e gestores públicos”.
LEIA TAMBÉM: Sisu: inscrições do 2º semestre começam nesta segunda-feira
O superintendente-executivo do Instituto Unibanco afirma que uma das principais prioridades da educação era manter o vínculo do estudante com a escola.
“Mas como manter esse vínculo se grande parte dos estudantes não conseguia nem sequer ter internet e se, por outro lado, a situação em casa obrigava até os mais jovens a trabalhar em meio à crise econômica? Como esses estudantes poderiam sonhar com uma profissão dali a três, quatro anos, se a realidade da crise e da pandemia impunha a urgência de fazer um bico para ajudar em casa?”, disse.
Tudo leva a crer que os alunos que estudaram em 2020 e 2021 com as escolas fechadas, com um retorno às aulas presenciais em 2022, tenham sido os mais afetados do ponto de vista das desigualdades que a pandemia gerou: o agravamento da baixa autoestima desses jovens resultou num menor número de estudantes que têm como sonho ou objetivo frequentar a faculdade.
“Como esses estudantes poderiam sonhar com uma profissão dali a três, quatro anos, se a realidade da crise e da pandemia impunha a urgência de fazer um bico para ajudar em casa?”, comentou Henriques.
Novo ensino médio no Brasil
Os especialistas apontam que o Enem precisará passar por um processo gigantesco de atualização para acompanhar a reforma que o governo planeja promover no ensino médio brasileiro.
As avaliações, atualmente compostas apenas de redação e perguntas objetivas de múltipla escolha, terão que absorver questões discursivas e interdisciplinares, cobrando habilidades mais de interpretação do que de conteúdo dos estudantes.
LEIA TAMBÉM: Professor cria estratégia de estudo que divide estudantes em faixas marciais
Segundo Ricardo Henriques, “essas mudanças trazem um desafio enorme para o Inep, que vai ter que dar conta de colocar o novo formato de pé, num curto período de tempo”.
“Até porque, mais importante do que os alunos ficarem decorando datas, por exemplo, é que eles tenham pensamento crítico, capacidade de solucionar problemas, que saibam diferenciar fato de opinião”, avaliou o superintendente-executivo.
E a crise chega ao Fies
Entre os anos de 2021 e 2022, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) teve uma redução de 27%, o que está diretamente ligado à queda no número de inscritos no Enem, de acordo com Rodrigo Bouyer, avaliador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) e sócio da Young, empresa especializada em captar e auxiliar estudantes no ingresso a universidades.
“As pessoas faziam o Enem para melhorar a nota e conseguir o Fies e, assim, ter acesso ao ensino superior em instituições particulares. Mas, desde 2015, vemos menos investimento do governo no Fies, com menos contratos assinados com faculdades. É uma questão de política pública”, explica Bouyer.
LEIA TAMBÉM: Google lança Bard, ferramenta de IA, concorrente do Chat GPT
Nesse cenário, o menor índice de parceria público-privada reduz a quantidade de vagas disponíveis para estudantes de baixa renda. Eles seguem procurando oportunidades, mas têm cada vez mais dificuldade para ingressar em cursos de graduação.
*Com informações do Portal R7.