Mesmo em um ano marcado por uma pandemia e pela restrição de circulação de pessoas, os índices de violência foram altos em todo o Brasil e também no Espírito Santo. São as conclusões da 15ª edição do Anuário de Segurança Pública, publicado nesta quinta-feira (15), e que apontaram crescimento no número de mortes violentas provocados por homicídio doloso (quando há intenção de matar), lesão corporal seguida de morte, latrocínios (roubo seguido de morte) e também por ações policiais.
Segundo a publicação, organizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) a partir de informações enviadas pelas próprias secretarias estaduais de segurança, as chamadas mortes violentas intencionais subiram em números absolutos de 1064 em 2019 para 1208 em 2020, representando um aumento de 12,3%. O Espírito Santo alcançou taxa de 29,7 de mortes violentas em um grupo de mil habitantes.
As vítimas de crimes violentos envolvendo homicídio doloso no Espírito Santo subiram de 987, em 2019, para 1103 em 2020. Isto representou um aumento de 10,5%
Crescimento observado também em quem foi morto após ter sido assaltado: foram 26 mortos por latrocínio em 2019 ampliando para 39 em 2020. Registros de pessoas assassinadas e vítimas de lesão corporal foram de 10 para 20 mortos. Já a letalidade da ação policial produziu 41 mortes em 2019, indo para 46 em 2020.
O Espírito Santo terminou o ano da pandemia com taxa de 25 homicídios por 100 mil habitantes em 2020. Bem acima da média nacional, que é de 18,9 por 100 mil.
Taxas de mortes violentas em seis cidades capixabas supera média nacional
A taxa de mortes violentas intencionais em seis cidades capixabas é maior que a da média nacional. No Brasil, a taxa de mortes violentas foi de 23,6. É um índice que leva em conta municípios com população maior que 100 mil habitantes. Os maiores índices do país estão em cidades do Nordeste.
No Espírito Santo, Cariacica aparece em primeiro neste ranking com 49 mortes por 100 mil habitantes. Seguem a lista, Guarapari (com 31,6 mortes), Linhares (43 mortes), São Mateus (28,6), Serra (35,3) e Vila Velha (30,9).
Cariacica chama a atenção por ter sido contemplada pelo Governo Federal no projeto “Em Frente, Brasil”, que levou agentes da Força Nacional para a cidade com a promessa de diminuir a criminalidade e índices de violência. Os agentes chegaram à cidade em agosto de 2019 mas foram embora do município em abril deste ano. Os índices de homicídio não se alteraram.
Solução está em polícia de proximidade, diz especialista
Os números do anuário foram analisados pelo mestre em Segurança Pública, agente da Polícia Federal e membro do Núcleo de Estudos de Segurança Pública da Ufes, Fabrício Sabaini. Ele pontuou que é necessário a adoção de uma política pública de polícia de proximidade.
“É o conceito de que a polícia deve estar na comunidade e não apenas ir na comunidade para operações específicas. Conhecendo e interagindo com os moradores, os agentes de segurança pública se tornam mais aptos a prevenir os crimes e não apenas reprimir, o que, infelizmente, é o que mais acontece, gerando essa cenário de guerra em que o país está mergulhado”, diferenciou.
Para Sabaini, apesar da gravidade dos números relacionados à letalidade policial, ele considera que a polícia capixaba está bem distante dos altos índices observados por forças de outros estados. “Evidentemente que a eficácia está em zerar esses índices mas vejo que as forças de segurança no Espírito Santo têm a preocupação de alcançarem essa abordagem não-letal nas operações. No Amapá, que está em primeiro lugar em letalidade policial, por exemplo, o índice é de 13 homicídios provocados por policiais por 100 mil habitantes. O número daqui é muito pequeno”, compara.
Ele considera que a grande causa de mortes violentas e homicídios é o universo relacionado ao tráfico de entorpecentes. “A chamada guerra às drogas, ao meu ver, não deve ficar restrita à apreensão de material. Claro, isso é importante mas é necessário ir além, aprofundar o mecanismo que movimenta esse tráfico, saber quem se beneficia e cortar essa fonte”, apontou.
Secretaria da Segurança Pública destaca cenário de redução de índices de violência
O subsecretário de Estado de Integração Institucional, Guilherme Pacífico, da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp) avaliou o cenário capixaba apresentado no anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e acredita que o Estado vive um cenário de redução de índices de violência. “A gente se preocupa muito com esse índice. Há 10 anos, de 2009 a 2019, o Espírito Santo saiu do segundo lugar como o mais violento do país e ficou em nono lugar”, apontou, creditando a queda ao fruto do programa Estado Presente.
“Além disso, temos também foco na redução da violência, integração das forças policiais, a prisão qualificada, a retirada de armamentos e a melhoria do nosso sistema prisional. Para o momento atual, em 2021, nós já temos uma redução de 8% do índice de mortes violentas em comparação ao ano passado”, informou.
Pacífico diz que as forças de segurança atuantes em território capixaba estão entre as menos letais no país. “O Espírito Santo está nas últimas das posições se afastando dos Estados onde a polícia produz o maior evento morte. Estamos na 21ª posição. É uma prova de que somos uma polícia que respeita os direitos humanos, o foco dela é prender e não matar”, ressalta. “Bandido bom, para nós, é o bandido preso”, destacou.
Sobre as cidades com índices maiores que a média nacional em mortes violentas, o subsecretário creditou que pandemia, num primeiro momento, afetou o trabalho das forças de segurança. Mas que depois houve um ajuste ao se conhecer melhor a dinâmica da doença.
Mesmo com o crescente aumento dos homicídios observados nos últimos dois anos, ele apontou que os índices estão se reduzindo se comparado ao primeiro semestre de 2021 nesses municípios. “Com o esforço das polícias, nós estamos em Cariacica, em relação ao ano passado, com uma redução de 19% da violência letal. Apenas São Mateus está com média acima da do Estado. Os demais, para 2021, estamos vendo redução: Guarapari com redução de 6%, Linhares com 2%, Serra com 32% e Vila Velha com 37% de redução. Só a Região Metropolitana, que concentra praticamente metade da população capixaba, estamos com quase 30% de redução”, argumentou.
Sobre o resultado do programa do governo federal em Cariacica, o subsecretário preferiu não criticar. “A Força Nacional não está mais conosco. Toda ajuda é bem-vinda. O resultado não acontece num passe de mágica. Não podemos dizer que foi extremamente exitoso e nem que foi um fracasso. Faz parte de um trabalho que, ao nosso ver, deve ter sequência e seguindo a metodologia do programa Estado Presente: temos ações de polícia mas também temos ações sociais. O município é carente em diversos setores. Se a gente não trabalhar esses dois vetores, o resultado não será alcançado”, pontuou.
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