Você já ouviu falar em pobreza menstrual? Pois saiba que esse termo se refere à falta de acesso a produtos sanitários e de higiene pessoal, além de espaços seguros e adequados para serem utilizados durante o período da menstruação.
Os dados assustam: no Brasil, cerca de 1,5 milhão de mulheres vive em casas sem banheiros e cerca de 213 mil meninas que frequentam escolas também não têm acesso a sanitários em condições de uso nas próprias unidades de ensino, sendo 65% delas negras. Isso sem falar na crescente população de rua e de vulneráveis do País.
Mas não se trata de um problema apenas de países em desenvolvimento, apesar das condições socioeconômicas terem, obviamente, um impacto expressivo na questão. Em vários países do mundo, inclusive os mais ricos, como Estados Unidos, os números de falta à escola também impressionam.
Dados da Organização Mundial da Saúde (ONU) revelam que, em todo o mundo, uma em cada 10 meninas deixam de ir ao colégio durante o período menstrual, por questões relacionadas à falta de acesso ao básico, por medo, vergonha ou pela combinação desses fatores.
O Brasil tem 7,5 milhões de meninas que menstruam na escola, segundo o relatório Livre para Menstruar, divulgado em março e produzido pelo movimento Girl Up, com apoio da marca de calcinhas menstruais Herself e da organização NOSSAS.
Pesquisas indicam que a dificuldade nos ambientes de maior vulnerabilidade social começa com a ausência de banheiros. Sim, parece absurdo, mas há muitas escolas públicas no País sem sanitários adequados, segundo dados do IBGE.
Ao mesmo tempo, a dificuldade de lidar com o sangramento no ambiente escolar e acadêmico é uma realidade que atinge também países mais ricos e, neles, há também muitas meninas e mulheres sem condições de acesso a itens de higiene.
Aluna do ensino médio da Escola Monteiro, Laura Locatel conta o quanto ficou impactada ao participar de uma ação social e perceber a reação de uma mulher ao receber um absorvente em meio a roupas doadas. “Ela ficou muito feliz quando viu o absorvente, até gritou”, conta.
Nesse momento, Laura se atentou para a questão da pobreza menstrual e buscou realizar a campanha na Escola Monteiro, contando com apoio da instituição.
“A proposta de realizar a ação na escola foi acolhida e incentivada pelos coordenadores do meu segmento, Elio Serrano e Luana Pittizer, outros profissionais da escola e outras colegas que abraçaram a causa. Por conta da pandemia, restringimos a campanha ao público interno, mas é interessante também promover essa reflexão, além de arrecadar absorventes, sabonetes e papel higiênico que serão doados a moradoras de rua”, explica.
A campanha garantiu a arrecadação de cerca de 6,6 mil itens de higiene e autocuidado, como absorventes, papel higiênico e sabonetes, só entre a comunidade escolar e os itens foram doados a organizações como a Casa Sociedade de Estudos Espíritas Irmão Tomé e o Serviço de Engajamento Comunitário – Secri.
“Acho que o que faz a Monteiro ser ainda mais diferenciada é que, mesmo que tenhamos ideias, há quem queira que as coloquemos em prática. O professor de redação Lúcio Manga compartilhou a campanha em suas redes sociais dizendo ‘viva essa juventude linda’, e, se nós somos essa juventude, é porque professores como os nossos também foram”, ressalta Laura.
Confira o depoimento da aluna em vídeo no link https://youtu.be/34ogte45DYY
Na Monteiro, o trabalho começa bem na faixa etária em que as crianças começam a entrar na adolescência e muitas meninas menstruam. Há anos a escola desenvolve um projeto de sexualidade, que aborda a questão da primeira menstruação, entre outros temas, com base no livro “O Planeta Eu”.
“Os pais são apresentados ao projeto e fazemos a leitura do livro em casa, com a família, e na escola, com um professor. Depois, discutimos e criamos uma caixa de perguntas onde o aluno pode colocar a questão que quiser sem se identificar. A urna é aberta no momento em que o profissional da área, em geral médico ou outro profissional de saúde com experiência na área, é convidado pra ir até a escola tirar as dúvidas e responder as perguntas”, explica Penha Tótola, diretora pedagógica da Escola Monteiro.
A jornalista Ana Paula Alcantara passou pela experiência com a filha Clara. “Esse é, com certeza, um diferencial da Monteiro. Foi uma experiência muito rica e, ao mesmo tempo, leve e tranquila, como deve ser. O envolvimento da escola estimula o diálogo em casa e ajuda a desconstruir tabus, favorecendo uma interação franca e abrindo um canal para responder dúvidas. Na minha visão, tudo isso é importante no processo de autoconhecimento, na segurança da mulher, na formação de todos e na desconstrução do que limita e aprisiona”, considera.
Consciência ambiental não têm idade
Outro projeto que merece destaque este ano envolve os 5º anos da Escola Monteiro, sob a coordenação das professoras Jackeline Gusman e Kelly Carrareto. O foco é o consumo consciente e o descarte adequado dos resíduos.
De acordo com a professora Jackeline, o projeto leva em conta o conteúdo sobre o tema presente nos livros didáticos e ganhou a parceria da Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Vitória, por meio da educadora ambiental Osneia Peccoli.
“Montamos uma sequência didática de atividades, firmamos a parceria com a Secretaria Municipal e convidamos a aluna do ensino médio Marina Cunico, que desde criança é bastante atuante como voluntária e incentivadora da mobilização social e ambiental, para uma conversa virtual com as duas turmas”, explica.
O projeto, segundo Jackeline, inclui palestras, encontros, atividades teóricas e práticas.
“Nosso objetivo é despertar nos alunos o interesse em protagonizar uma intervenção prática conjunta, seja na escola, em casa, no condomínio onde moram. Eles estão bastante envolvidos e é isso que queremos: levá-los a entender a importância de cada um para a sustentabilidade e para o bem-estar de todos. A reflexão sobre o consumo consciente de produtos, de água e dos demais recursos naturais, ressaltando, entre outros pontos, a importância da reciclagem e da destinação adequada dos resíduos, é fundamental para mudar nossos hábitos e nossa relação com o meio”, diz.
Sem perder de vista o conteúdo programático e curricular, a iniciativa é mais um exemplo daquilo que são valores para a Escola Monteiro: humanizar, aproximar teoria e prática, fazer da educação e do conhecimento agentes de transformação. “Essa é a nossa essência, o que nos mobiliza e inspira”, afirma a diretora pedagógica Penha Tótola.
A educadora ambiental Osneia Pecolli reforça a importância do trabalho em parceria. “Mesmo no momento que estamos vivendo, as parcerias estão se efetivando, e podemos continuar a proporcionar experiencias fundamentais de aprendizagem, que envolverão não somente os alunos, mas, também, seus familiares, que, assim, também participam dos projetos de educação ambiental. Trabalhar com crianças e adolescentes é uma forma de levar toda a família a se apropriar de conhecimentos que serão alicerce para mudanças necessárias e urgentes em prol do meio ambiente”, considera.
Além de Jackeline Gusman e Kelly Carraretto, professoras de classe, Izabella Arpini e Nathália Kloss são outras professoras que também fazem parte dessa iniciativa interdisciplinar. Desta vez, os estudos abrangem conhecimentos de Língua Portuguesa, História, Geografia, Matemática, Ciências e Cultura Maker.
O trabalho já começou a ter resultados práticos, visando à preservação da cidade e do meio ambiente em geral, e inclui pesquisas sobre a reutilização de objetos, a confecção de um modelo de coletor de pilhas a partir de materiais reutilizados e a elaboração de uma proposta de intervenção em um ambiente próximo, com base nos conhecimentos adquiridos nas aulas e apresentações.
Os alunos também são estimulados a sugerir alternativas e soluções para situações relacionadas a resíduos em geral, descarte e coleta seletiva. Saiba mais no link https://monteiro.g12.br/alunos-do-5o-ano-estudam-coleta-residual-no-projeto-vitoria-cidade-limpa/
Sarau de poesias
Outro trabalho que é sempre realizado pela Monteiro, antes presencialmente e agora no formato on-line, é a realização de um sarau de poesias, envolvendo alunos do 2º ano do ensino fundamental I em uma casa de repouso para idosos, localizada quase em frente à escola, na Enseada do Suá.
“Eles estudam o gênero poesia e desenvolvem o sarau, levando alegria e beleza para os idosos. Há casos de meninos que fizeram amizade e passaram a realizar visitas regulares. É uma forma de colocar o conteúdo em prol de uma causa e dar às crianças o protagonismo no processo de aprendizagem. É bom para todos os envolvidos”, relata Penha Tótola.
Caminho para a transformação
“Você tem que agir como se pudesse transformar radicalmente o mundo, e você tem que fazer isso o tempo todo.”. Essa frase é da brilhante ativista Angela Davis e representa muito bem o meu sentimento em relação à campanha e ao resultado obtido. A vontade de transformar esteve presente no meu coração durante todo o período de arrecadação, porque é muito bom – e esperançoso, ver as pessoas se juntarem para dedicar seu tempo e a sua essência para ações sociais que são tão importantes no contexto atual e que fazem tanta diferença, como a campanha de higiene menstrual, que arrecadou cerca de 6,6 mil itens. Sem o apoio incondicional da Escola Monteiro, a divulgação e as inúmeras doações de todos, nada disso seria possível. Juntos, oportunizamos a higiene menstrual digna para centenas de pessoas que menstruam em situação de rua, de vulnerabilidade e de precariedade. Muito brigada! Sigamos transformando…”
Laura Locatel, 17, é aluna do ensino médio da Escola Monteiro e idealizou, com apoio da escola, a campanha sobre higiene menstrual.