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"Existem pessoas que pensam só em sua própria sobrevivência", diz secretário sobre crise hídrica

Rodrigo Júdice

Secretário afirma que situação é crítica no ES Foto: Divulgação

Ao viver uma crise hídrica sem precedentes na história do Espírito Santo, o governo do Estado foi obrigado a adotar medidas severas para evitar o desabastecimento. O secretário de Estado de Meio Ambiente, Rodrigo Júdice, afirmou que o momento atual é de preocupação e que em 11 localidades onde a situação é extremamente crítica foi determinado o corte de captação de água durante 24 horas do abastecimento para uso de indústrias e da irrigação.

Segundo o secretário, a crise hídrica provocou uma mudança de comportamento nas empresas. Ao participar de reunião na Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), Rodrigo Júdice pôde constatar uma nova postura dos empresários no que tange à consciência ambiental.

Confira a íntegra da entrevista:

Folha Vitória – Qual a análise que o governo faz dessa crise?
Rodrigo Júdice –
Estamos na maior crise dos últimos 80 anos. O Espírito Santo, principalmente na região Norte, passa por situação crítica. Junto com o vice-governador César Colnago e o secretário de Agricultura (Octaciano Neto) visitamos algumas cidades. Fomos a Conceição da Barra, Pinheiros e Boa Esperança e pudemos constatar a gravidade da situação. São rios secando e lâmina d’água aparente. Algumas cidades sendo abastecidas com carros- pipa.

FV – E quais foram as medidas?
RJ –
Obrigação de privilegiar, nesse momento, o consumo humano. Trata-se da dessedentação humana e animal. E por conta disso a Agerh (Agência Estadual de Recursos Hídricos) impôs duas resoluções. Uma: sugeriu aos municípios no sentido de mudar código de postura para evitar desperdício, evitando, por exemplo, a irrigação que seja dispendiosa como a irrigação por aspersão. Impôs medida dura: entre 5 horas e 18 horas está terminantemente proibida a captação que não seja para consumo humano e animal. Fora esse período a captação está autorizada. Este é o período em que se consome mais água.

FV – E quanto tempo vai durar?
RJ –
A ideia é manter hábitos naturais. Vamos monitorar o problema durante 15 dias e iremos avaliar a eficácia das medidas. Depois de 15 dias precisaremos rever a determinação. Se chover, podemos flexibilizar.

FV – São quantos locais?
RJ –
São 11 localidades. São Gabriel da Palha que foi acrescentado hoje.

FV – Como o governo está lidando com o problema?
RJ –
Estamos dialogando com a comunidade. Convocamos igrejas, ONGs, prefeituras, Ministério Público, sociedade de forma geral para que entidades nos ajudem nessa mobilização. Queremos que se respeitem as duas resoluções. Na visita de ontem percebemos que existem pessoas que pensam só em sua própria sobrevivência. Em Pinheiros foi detectada a captação irregular fora das resoluções.

FV – Como será a punição?
RJ –
Não queremos aplicar multas. Mas estabeleceu-se uma multa de aproximadamente R$ 2.700,00, que é uma multa por captação/por infração. Já naqueles locais onde o problema é muito grave, a multa é mais severa. É uma multa por infração que não é diária, mas será estabelecida na ordem de R$ 270 mil. Não queremos multar. A mensagem do governo não é impor a punição monetária. Por isso estamos fazendo uma grande mobilização. Na reunião com o Ministério Público, conversamos com o procurador-geral Eder Pontes, para buscarmos apoio dos promotores do Estado porque eles conhecem problemas na comarca. Nesse momento de crise é importante poupar água.

FV – Como superar?
RJ –
O Estado vem adotando medidas a médio e a longo prazos. O reflorestamento de forma mais inovadora. No programa Reflorestar o objetivo é recuperar área de 7.500 hectares. Adotamos política de Pagamento por Serviço Ambiental. Pagam diretamente ao agricultor para que ele refloreste nascentes, topo de morro, áreas que são identificadas de maior capacidade de receber água da chuva para que os aquíferos se recomponham. Este ano, o programa beneficiará 1.500 produtores rurais. Não é política nova. Em em 2009 foi criado Fundo que recebe 3% dos royalties do petróleo e destina ao Fundágua. Para se ter uma idéia o Espírito Santo foi único da Federação que aceitou recuperar 80 mil hectares até 2020. O pacto tem a participação de países da América Latina e Caribe. Nenhum outro estado aderiu.

FV – O Estado foi surpreendido? Não havia um monitoramento de áreas?
RJ –
Fomos surpreendidos por crise hídrica: média histórica ano passado choveu muito menos que a média histórica. Esse ano choveu muito menos que ano passado. Ou seja: uma crise que vem afetando a vida das pessoas. Este ano praticamente não choveu. Nossos rios estavam em situação normal. Quando o governador ganhou a eleição, na transição, em dezembro, apareceram os primeiros sinais da crise. Foi criado um comitê que é coordenado pelo chefe de gabinete. De lá pra cá inúmeras medidas foram tomadas. Meteorologistas não tinham informações precisas.

FV – E quanto às medidas de recuperação dos rios?
RJ –
São medidas urgentes que contam com a participação da Agência Nacional de Águas (ANA), Cesan e EDP Escelsa. Existe a reserva de Rio Bonito, que é uma Pequena Hidrelétrica na região de Santa Maria de Jetibá. Aplicamos lei federal de recursos hídricos. Invertemos o uso da PCH. A barragem deixou de ser utilizada para produção de energia para que a água fosse armazenada, permitindo o abastecimento.

FV – Mas, secretário, nos 20, 30 anos anteriores não houve monitoramento no desmatamento?
RJ –
Nas décadas de 70, 80 os programas da época de políticas públicas incentivavam o aumento da área agricultável. Era uma concepção equivocada. Então, nas décadas de 70, 80, havia muita água armazenada no subsolo. Mas as políticas públicas da época incentivavam a ocupação irregular do solo em Áreas de Proteção Permanentes (APPs) e desmatamento.

FV – E como foi a negociação esse ano?
RJ –
Este ano o governo teve uma negociação dura, mas houve o empenho pessoal do governador Paulo Hartung junto à EDP e à ANA. Já foi lançado edital pela Cesan para que seja realizadas obras de captação de águas do Rio Reis Magos, região de Fundão, para a Grande Vitória. Há também um estudo para a captação do Rio Jucu, estudo que envolvem Cesan, Iema, Agehr, Secretaria de Estado da Agricultura. O estudo irá identificar um local para construção da barragem. No Rio Bonito já existe a retenção das águas do Rio Santa Maria da Vitória. Aliás, existem mais de 100 barragens no Espírito Santo todo.

FV – O senhor citou duas empresas que são citadas na CPI do Pó Preto como sendo poluidoras. Qual sua avaliação do resultado das investigações?
RJ – Apresentamos uma nota, onde dissemos que ainda não tivemos acesso oficial ao relatório. Devemos parabenizar a Assembleia Lesgilativa, já que o resultado da CPI converge com os estudos dos estudos realizados pelo Iema. A grande dificuldade que encontramos nas duas empresas da ponta de Tubarão é identiificar qual a quota parte de cada uma. Devemos avançar nos estudos do DNA da poeira. Existe um Plano Estratégico de Qualidade do Ar, decreto 3463R/2013, no qual se considera suportável o volume de 14 gramas de pó por metro quadrado. Ainda teremos acesso ao relatório final. As contribuições pertinentes vamos adotar. Independente da CPI continuaremos trabalhando. O Iema não deixou de cumprir suas tarefas de políticas públicas de controle da qualidade do ar. O mundo não se preocupa com a poeira sedimentável. Nem a OMS (Organização Mundial da Saúde) se preocupa com a poeira sedimentável.  Não há regramento no Brasil que estabeleça limites. Como estabelecer punição para empresa A ou B? Não posso impor penalidades só com suspeita.