Imagine a experiência de ficar sete dias embarcado, em alto-mar e o melhor: com a turma da faculdade. Certamente a primeira imagem que vem à cabeça é de um mega cruzeiro com festa 24 horas e outras coisas mais.
Porém, essa não é a realidade de um grupo de alunos do curso de Oceanografia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Na verdade, eles vão encarar muito trabalho pela frente e o mais desafiador: a cerca de 250km de distância da costa capixaba.
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Desde a quinta-feira (09), 14 futuros oceanógrafos participam de uma aula diferente e um pouco mais longa. A bordo do navio-escola Ciências do Mar III, eles estarão em contato com equipamentos que só conheciam na teoria.
A aluna Roberta Rocha Campos, de 24 anos, está no oitavo período do curso e vai embarcar com o grupo. Ela acredita que a possibilidade de juntar a teoria da graduação com a prática proporcionada pela estrutura do navio-escola faz toda a diferença para a formação.
“Está todo mundo muito animado para conhecer, aqui tem muito equipamento novo que, muitas vezes, a gente só ouve em sala de aula. Isso é interessante porque como nosso curso é muito prático, a gente vê coisa em sala de aula, mas estar aqui no mar e poder mexer em tudo que a gente aprende é bem diferente.”
E bota diferente nisso. Nem mesmo os 29 anos de sala de aula do professor do Departamento de Oceanografia da Ufes, Agnaldo Silva Martins, foram capazes de mensurar a emoção que foi ao receber a notícia de que realizaria aquilo que ele define como “todo sonho de um professor de Oceanografia”.
“É um prazer muito grande colocar em prática tudo aquilo que há muitos anos eu já pensava, mas não podia fazer porque o barco na época era muito pequeno, não tinha capacidade ou não era seguro, então poderemos fazer a aula perfeita, digamos assim”, comemorou o professor e responsável pelo projeto.
No vídeo abaixo, você confere o interior do navio-escola Ciências do Mar III:
Sete dias de muito trabalho e conhecimento
Durante os sete dias embarcados, os estudantes vão vivenciar diferentes atividades da Oceanografia.
Dentre as tarefas, estão o monitoramento das águas e coleta de amostras de sedimentos em diferentes profundidades, com o intuito de medir o impacto da ação humana e também o impacto do rompimento da barragem de Mariana no oceano, além de uma análise geoquímica do material coletado.
Ao todo, 25 pessoas compõem a expedição. São 14 alunos do curso de Oceanografia, um professor responsável, uma enfermeira, um aluno da pós-graduação e oito pessoas na tripulação.
Saúde sempre em primeiro lugar
Boa parte dos alunos embarcados já possui experiência com o mar, mas isso não deixa de lado a preocupação com a saúde. Pensando nisso, a equipe responsável pela organização decidiu chamar uma pessoa para auxiliar os estudantes na experiência.
A escolhida para cuidar de toda essa galera foi a enfermeira Michelaine Isabel da Silva, de 28 anos. Egressa da Ufes há pouco menos de um ano, ela conta que a experiência é totalmente nova, ainda mais se tratando de uma embarcação.
“Nunca andei de barco e esse também é um desafio para mim, mas eu acho que é uma oportunidade legal e única. Temos que agarrar e sair da zona de conforto”, afirmou a profissional.
Sobre estar a frente de uma tarefa tão importante, ela lembra que seu serviço a bordo vai além de atendimentos físicos.
“É uma responsabilidade grande, tive um tempo para me preparar psicologicamente e emocionalmente porque estarei lidando na prática. Até porque, às vezes os alunos vão passar mal fisicamente ou às vezes só precisam sentar, conversar e dar uma respirada”, ponderou a egressa.
Comandante de “primeira viagem”, mas com longa experiência
Aos 62 anos, e com vasta experiência em embarcações, José Inácio da Silva foi o escolhido para comandar o Laboratório de Ensino Flutuante (LEF). O profissional, que já estava aposentado, se sentiu lisonjeado ao receber um convite que, segundo ele, mistura um sentimento de honra e responsabilidade.
“Pra mim é um aprendizado novo e diferente de tudo o que eu já fiz. Eu fico feliz porque estava em casa, já não pretendia mais trabalhar, mas quando recebi a proposta de trabalhar aqui, eu resolvi conhecer o navio. Hoje eu me sinto muito entusiasmado com essa função, é muito gratificante”, contou o comandante do Ciências do Mar III.
Sonho de infância e de família
Falando em reviravolta na vida, outro aluno que também embarca nessa jornada é o Petrus Pompeu Reis, de 24 anos. Também no oitavo e último período de Oceanografia, ele lembra que a paixão pelo mar já vem de família.
“O desejo surgiu na infância antes do ensino médio. Eu tive um contato muito próximo com o mar e com a natureza por causa da minha família. Minha tia me incentivou no surfe, e esse contato desde novo me despertou a curiosidade de querer entender mais a natureza e como funcionam os processos”, contou o estudante.
No currículo, Petrus já possui experiência na área, porém, em setores não tão ligados ao mar. Para ele, essa expedição será uma forma de unir o conhecimento já adquirido na carreira, com a experiência prática a bordo em alto-mar.
“É muito importante para mim estar nesse embarque porque vou vivenciar, de fato, as operações. Esse conhecimento vai fazer cada vez mais sentido para mim, pois estarei a par de todo o processo, juntando teoria e prática.”
A turma deve ficar em alto-mar até a próxima quinta-feira (16). A navegação teve início na noite de quinta-feira (09), por volta das 18h, quando a embarcação seguiu pelo litoral capixaba em direção à foz do Rio Doce, no Norte do Estado.
Em seguida, o grupo vai mar adentro por cerca de 250km de distância da costa e, por fim, retorna à Vitória.
Convênio entre ES e RJ
A experiência dos estudantes é parte de um convênio firmado em novembro de 2022 entre a Ufes e a Universidade Federal Fluminense (UFF), no Rio de Janeiro, que administra o navio-escola Ciências do Mar III.
A embarcação é compartilhada entre instituições de ensino da região Sudeste que oferecem cursos na área de Ciências do Mar e integra o projeto Laboratório de Ensino Flutuante (LEF), tendo outros três navios “irmãos” espalhados pelo litoral brasileiro. Eles foram desenvolvidos pelo Ministério da Educação (MEC) por meio do Programa de Formação de Recursos Humanos em Ciências do Mar (PPGMAR).