Médicos de um hospital ao sul de Tucumán, na Argentina, realizaram uma cesariana em uma menina de 11 anos estuprada pelo companheiro da avó. A menor deu à luz a um bebê de 600 gramas após insistir por um mês para que os médicos interrompessem a gestação.
De acordo com informações do jornal El País, o governo provincial ignorou o pedido da menina e na noite de terça-feira (26), quando estava com 23 semanas de gravidez, foi submetida a uma cesariana em um hospital público.
A menina chegou com a mãe ao hospital Eva Perón no dia 29 de janeiro. Ela disse que o estômago doía, mas na realidade estava em uma gravidez de 19 semanas. Ela chegou a contar que o namorado da avó a tinha estuprado. Mãe e filha solicitaram a aplicação do artigo da lei que, desde 1921, permite a interrupção legal da gravidez (ILE) em casos de crianças violentadas ou quando há risco para a mãe. A ILE poderia ter sido aplicada em menos de 48 horas, mas diferentes grupos feministas denunciaram que a província atrasou o quanto pôde a decisão até que a saúde do menor tornou inevitável a cesariana.
O secretário da Saúde de Tucumán, Gustavo Vigliocco, disse à imprensa argentina que durante o processo manteve “proximidade com a menina e sua mãe. Avaliamos os riscos, mas ela tem estrutura grande, mais de 50 quilos”, disse.
No entanto, a declaração judicial da menor, divulgada pelo jornal Página 12, contradiz o funcionário. Atendida por uma psicóloga do hospital, a menina foi clara em seu desejo de realizar um aborto. “Quero que tirem isto que o velho colocou em mim”, disse ela.
Entenda o caso
A menina foi estuprada pelo companheiro da avó, que cuidava dela por ordem de um juiz. A mãe havia perdido a tutela da menor depois que o parceiro dela abusou de suas duas filhas mais velhas. Na terça-feira (26) à noite, o Sistema Provincial de Saúde de Tucumán (Siprosa) emitiu um comunicado informando a decisão de interromper a gravidez da menina depois que uma juíza agiu a pedido das organizações Advogadas e Advogados do Noroeste Argentino em Direitos Humanos e Estudos Sociais (Andhes) e Cladem. Mas o texto do Ministério era confuso: terminava com um pedido para que prosseguissem com “os procedimentos necessários a fim de salvar as duas vidas”. “A justiça ordenou que o protocolo seja cumprido, mas o Siprosa acrescentou essa nota com uma clara intenção de fazer pressão”, diz Florencia Vallino, da Andhes.
A cesárea era inevitável. “Entrei no quarto e encontrei uma menina brincando com bonecas em cima da cama. Fui chamada nessa mesma manhã, mas disse que não porque sou objetora. Decidi acompanhar meu marido que não é objetor, porque sabíamos que íamos encontrar uma imagem que nos ia chocar muito”, explicou a médica ao portal de notícias minutouno.com”, disse Cecilia Ousset, o ginecologista do sistema privado que operou a menina junto com o marido, o médico José Gigena.
Na sala de cirurgia, o casal constatou que toda a equipe médica se recusava a participar da intervenção. Viram também que o estado de saúde da menina, afetada pela hipertensão, e as semanas de gestação tornavam o aborto muito perigoso. Decidiram então realizar uma cesariana. “Era mais arriscado continuar com a gravidez do que fazer a cirurgia. Se não interrompêssemos a gravidez, essa menina morreria”, disse a médica.
O médico também falou sobre o ocorrido. Apontamos a responsabilidade do sistema, porque violou todos os direitos da menina. Ela entrou no dia 29 de janeiro e não deveria haver nenhuma dúvida na aplicação do ILE. Não queremos que isso aconteça novamente, que outra menina em Tucumán seja torturada dessa maneira”.