O inquérito policial que apura um caso de racismo na loja Zara em um shopping de Fortaleza, no Ceará, revelou que o estabelecimento emitia um sinal sonoro, alertando quando pessoas “fora do padrão da grife” entravam no local, será encaminhado ao Ministério Público (MP).
Segundo as investigações da polícia, o gerente da loja foi flagrado cometendo uma atitude discriminatória contra a delegada Ana Paula Barroso, que é negra, no último dia 14 de setembro.
Bruno Filipe Simões Antônio, de 32 anos, é de naturalidade portuguesa e foi indiciado pela polícia pelo crime de racismo. A pena é reclusão de 1 a 3 anos.
As imagens do circuito interno mostram o momento em que a vítima é impedida de entrar no estabelecimento.
O assessor jurídico da Associação dos Delegados de Polícia do Ceará, Leandro Vasques, afirma que ainda caberá ação de danos morais: “Vamos aguardar a manifestação do Ministério Público e, paralelo a isso, vamos manejar a ação reparatória de dano moral indenizatória”, declarou Vasques.
E continuou: “A assessoria jurídica não descansará enquanto não assistir à reparação deste dano, bem como a condenação do infrator deste crime imprescritível e inafiançável”.
Duas ex-funcionárias da loja afirmam que um sinal sonoro era emitido para pessoas “fora do padrão da grife”
Segundo a delegada Janaina Siebra, duas testemunhas, que são ex-funcionárias da Zara, confirmaram que a loja emitia um sinal sonoro, alertando “Zara Zerou”, quando pessoas “fora do padrão da grife” entravam na loja.
“Ficou constatado que existia este código interno. Então, a partir do momento em que um cliente entrava na loja e a equipe de profissionais suspeitasse da forma de se vestir ou da cor da pele, o código era utilizado e aquela pessoa deixaria de ser um simples cliente para se tornar um suspeito. Existia essa prática discriminatória muito severa, que chocou todos nós”, relata a delegada.
Ainda de acordo com a polícia, as imagens foram cruciais para a finalização do inquérito: “A loja foi resistente em ceder essas imagens. Ela se recusou por três vezes a nos repassar. Diante disso, foi necessário representar pela busca e apreensão e após a análise, constatamos o tratamento diferenciado a pessoas na mesma circunstância”, explica Siebra.
Filmagens do shopping mostram que, minutos antes da abordagem, pessoas brancas entraram sem máscara na loja e não foram confrontadas por funcionários, inclusive foram atendidas pelo gerente.
As imagens mostram que momentos antes e depois de Ana Paula ser impedida de entrar na Zara, outros clientes em situação semelhante, sem uso correto da máscara e consumindo alimentos, foram atendidos no estabelecimento.
Com a repercussão do caso, a Polícia Civil foi procurada por outras pessoas que disseram ter sido vítimas de racismo na unidade. Os relatos estão sob análise preliminar.
‘Protocolos de proteção à saúde’
Em nota, a Zara Brasil disse que não teve acesso ao relatório da autoridade policial até sua divulgação nos meios de comunicação.
A loja afirmou ainda que vai colaborar com as autoridades para “esclarecer que a atuação da loja durante a pandemia se fundamenta na aplicação dos protocolos de proteção à saúde, já que o decreto governamental em vigor estabelece a obrigatoriedade do uso de máscaras em ambientes públicos”.
A rede prossegue: “Qualquer outra interpretação não somente se afasta da realidade como também não reflete a política da empresa”.
A Zara Brasil destacou ainda contar com 1,8 mil pessoas de diversas raças e etnias, identidades de gênero, orientação sexual, religião e cultura.
Afirmou também não tolerar “nenhum tipo de discriminação e para a qual a diversidade, a multiculturalidade e o respeito são valores inerentes e inseparáveis da cultura corporativa. Acrescentou ainda rechaçar “qualquer forma de racismo, que deve ser combatido com a máxima seriedade em todos os aspectos”.