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Justiça Federal condena três por fraude em construção da sede da Petrobras em Vitória

Entre os denunciados pela força-tarefa da Lava Jato está o ex-gerente da estatal, Celso Araripe, acusado de receber propina para beneficiar o Consórcio OCCH

Foto: Divulgação

A Justiça Federal condenou o ex-gerente da Petrobras Celso Araripe a 15 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele foi denunciado pela força-tarefa da Lava Jato por participação em um esquema que teria fraudado licitações para a construção da sede da estatal na Reta da Penha, em Vitória, em benefício do Consórcio OCCH.

Na mesma ação, também foram condenados o ex-executivo da Odebrecht, Paulo Sérgio Boghossian, por corrupção e lavagem de dinheiro, e o empresário Eduardo de Oliveira Freitas Filho, proprietário da empresa Sul Brasil Construções Ltda, também por lavagem de dinheiro. Ambos foram condenados a nove anos de prisão. 

A decisão é do juiz federal Luiz Antonio Bonat, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que também determinou o pagamento, a título de reparação dos danos, em favor da Petrobras, de R$ 3.576.439,13, valor correspondente às transferências do Consórcio OCCH para a Sul Brasil.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), Celso Araripe solicitou e recebeu propinas do Consórcio OCCH, formado pelas construtoras Odebrecht, Camargo Correa e Hochtief do Brasil, para facilitar a aprovação de aditivos ao contrato para a construção da sede administrativa da Petrobras em Vitória.

O pagamento das vantagens indevidas, segundo as investigações, foi ajustado com Boghossian, então executivo da Odebrecht e representante do consórcio, e realizado entre 2010 e 2014, por meio de um contrato fictício entre a Odebrecht e a empresa Sul Brasil Construções Ltda. De acordo com o MPF, ficou comprovado, no curso da ação, que a contratação da empresa pelo consórcio ocorreu por indicação direta de Celso Araripe.

Ainda segundo as investigações, a Sul Brasil recebeu do Consórcio OCCH o valor de R$ 3.576.439,13, em oito transferências realizadas entre dezembro de 2010 e outubro de 2013. A partir da assinatura desse contrato, Araripe teria passado a receber mensalmente vantagens indevidas, mediante depósitos fracionados em espécie, realizados logo após a concretização de uma série de saques nas contas de Freitas Filho e da Sul Brasil. Além disso, a partir dessa data, segundo a denúncia, os aditivos contratuais do Consórcio OCCH passaram a ser aprovados pela Petrobras.

Estratégia 

De acordo com o procurador da República Roberson Pozzobon, o uso de depósitos fracionados é uma prática já conhecida da força-tarefa nesse tipo de esquema criminoso.

“É uma estratégia para tentar burlar os sistemas de prevenção de lavagem de dinheiro das instituições financeiras, que, de acordo com a Lei 9.613/98 e diretrizes fixadas pelo Banco Central do Brasil, devem comunicar ao Controle de Atividades Financeiras, o Coaf, operações com dinheiro em espécie suspeitas ou de maior valor. No curso da ação conseguimos comprovar que a realização de saques e depósitos fracionados de valores em espécie, a partir de diferentes agências bancárias próximas, foi um dos expedientes utilizados pelos réus para tentar apagar os rastros de seus delitos. Isso foi fundamental para provar que o pagamento de propina de fato aconteceu”, explicou.

Na denúncia da Lava Jato, foram relacionados os depósitos feitos a Araripe a saques realizados em contas de Freitas Filho e de sua empresa, a Sul Brasil, verificando-se a movimentação de quantias equivalentes, na mesma data ou em datas aproximadas, entre as contas dos dois réus. 

Segundo o Ministério Público Federal, os depósitos fracionados de valores em espécie, em favor de Araripe, começaram em setembro de 2010 e foram realizados até março de 2014, totalizando mais de R$ 290 mil e 182 depósitos, a maioria deles em valores de R$ 1.000,00, R$ 1.500,00 e R$ 2.000,00.

“Caminho das pedras”

As provas fornecidas pelos acordos de leniência e de colaboração premiada firmados pelo Ministério Público Federal com executivos das empresas integrantes do Consórcio OCCH foram fundamentais para a investigação do esquema envolvendo a construção da sede da Petrobras em Vitória.

De acordo com o MPF, Carlos José Vieira Machado, um dos colaboradores e então executivo da Odebrecht e integrante do Consórcio OCCH, revelou que, diante de dificuldades em relação à execução do contrato para a construção da sede, ele e Boghossian reuniram-se com Araripe, em julho de 2010. Na ocasião, Araripe teria dito que, para facilitar as negociações com a Petrobras e agilizar o processo de aprovação dos pleitos do consórcio, Freitas Filho deveria ser contratado, pois ele “saberia o caminho das pedras para resolver os impasses” entre o consórcio e a Petrobras.

Ao longo da investigação, a força-tarefa da Lava Jato conseguiu reunir um conjunto de provas que demonstravam que o contrato entre o consórcio e a Sul Brasil foi firmado com o único objetivo de a empresa realizar o pagamento das propinas, uma vez que a Sul Brasil não prestou serviço algum ao consórcio, segundo as investigações. Entre as provas reunidas, destaca-se um documento compromissório, de gaveta e paralelo ao contrato oficial, que atrelava a remuneração da Sul Brasil ao montante de aditivos aprovados, diferente do contrato formal, que previa remuneração fixa.

“Em banho Maria”

De acordo com as investigações da força-tarefa, existe uma série de mensagens trocadas entre Freitas Filho e Boghossian, em que fica clara a atuação de Araripe junto à Petrobras para facilitar os aditivos pedidos pelo Consórcio.

Em uma das mensagens, enviada no dia 18 de janeiro de 2011, Freitas Filho teria sugerido a Boghossian que determinado assunto de interesse do Consórcio OCCH deveria ser postergado para quando Araripe retornasse de férias, pois, sem o ex-gerente, Freitas Filho não possuiria influência sobre a Petrobras. 

“Sem o Celso não tenho qualquer interferência no assunto e durante as férias torna-se muito difícil contato com ele. Portanto, é prudente levar ‘em banho Maria’ até o final do mês. Este será o primeiro assunto a ser tratado na volta dele”, teria dito Eduardo Freitas na mensagem.

A reportagem tentou contato com as defesas dos três réus, mas nenhum dos advogados foi localizado.