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Lei de Acesso à Informação: consulta a dados do coronavírus é dificultada no ES

Produção da TV Vitória enviou diversos pedidos de informação, com base na LAI. Entretanto, em alguns casos, governo estadual dificulta o acesso aos dados. Advogados criticam a postura governamental

Foto: Divulgação / Governo

Dar mais transparência ao governo e disponibilizar à população as informações de caráter público. Esse é o objetivo da Lei de Acesso à Informação (LAI). No Espírito Santo, no entanto, nem sempre o acesso a esses dados é obtido com facilidade. A produção da TV Vitória encaminhou, ao longo das últimas semanas, diversos pedidos de informação ao governo do Estado, via LAI. Todos os pedidos estão, direta ou indiretamente, relacionados à pandemia do novo coronavírus e foram feitos para diversas secretarias e autarquias do Estado. No entanto, em alguns casos, as informações passadas estavam incompletas e disponibilizadas em formatos fechados, que não possibilitavam a atualização dos números.

Um desses pedidos foi feito à Secretaria Estadual de Saúde (Sesa). Foi solicitado que a pasta enviasse dados referentes ao aumento, ao longo da pandemia, do número de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e enfermaria, exclusivos para covid-19, por meio do programa Leito para Todos. A primeira resposta, assinada pela Subsecretaria de Estado de Regulação, Controle e Avaliação em Saúde (SSERCAS), informava que os dados requeridos estavam no painel covid-19. Porém, o painel mostra apenas a quantidade de leitos por dia. Não traz o histórico do crescimento.

A reportagem, então, entrou com um recurso pedindo a informação novamente. Os dados, dessa vez, foram enviados, mas estavam ilegíveis. Mais um recurso foi feito, até que a pasta encaminhou o documento original.

Um outro pedido feito, dessa vez para a Secretaria Estadual de Justiça (Sejus), também apresentou problemas. Foram requeridas informações dos agentes penitenciários do Estado afastados após serem contaminados pela covid-19. O pedido deixava claro que os dados deveriam conter a faixa etária de cada agente, qual unidade prisional trabalha, cidade onde mora e se o (a) agente possuía alguma doença pré-existente. As informações deveriam ser encaminhadas em dados abertos, ou seja, em planilhas que possam ser manipuladas por softwares de computador.

Na resposta, a Sejus, por meio da Ouvidoria da pasta, encaminhou apenas a quantidade de agentes afastados por unidade prisional — sem as informações sobre faixa etária, doenças pré-existentes e residência — em arquivo fechado, ou seja, aquele que não é manipulável em softwares de computador. Na justificativa, a secretaria informou que o sistema do governo estadual não aceita arquivos em formato aberto e, por isso, não poderia enviar a informação da maneira pedida.

Para a Secretaria Estadual de Educação (Sedu) foi pedido a quantidade de estudantes da rede pública estadual que estão estudando durante a pandemia, por meio de alguma plataforma, online ou impressa, disponibilizada pela pasta. As informações deveriam conter esses dados por escola e município. Três recursos já foram apresentados e, até agora, os dados vieram sem as especificações pedidas e em formato fechado. Nenhuma justificativa foi apresentada.

Em vigor desde 2012, a Lei de Acesso à Informação (LAI) tem como objetivo dar mais transparência ao governo e disponibilizar ao cidadão as informações de caráter público. Para o advogado Caleb Salomão, essas dificuldades em conseguir informações junto ao governo estadual contrariam o que prega a LAI.

“Os órgãos do Estado estão adotando conduta inadequada na sua relação com a sociedade e suas demandas por informações. A apresentação, quase sempre genérica, esquiva e com remissão a outras fontes, não cumpre o que a lei determina”, explicou.

A Lei de Acesso à Informação determina que os governos federal, estadual e municipal enviem os dados de forma aberta, que facilite sua manipulação e entendimento da informação. Segundo o advogado Alexandre dos Santos Carvalho, a recusa em enviar os dados, sem uma explicação jurídica fundamentada, compromete a transparência.

“Nesses casos falta a fundamentação [jurídica] para explicar os motivos de não entregar tudo que que é pedido. É um direito do cidadão saber a fundamentação. Não dá para dizer que é feito de forma intencional, mas isso traz falha na prestação do serviço de informação e fere a transparência”, afirmou.

Os advogados acreditam que, por se tratar de informações relativas à pandemia do novo coronavírus, o governo deveria se esforçar em entregar os dados da maneira que está previsto em lei. “É preciso que a administração pública assegure clareza, precisão e segurança quanto à informação solicitada”, afirmou Caleb. “O acesso e a divulgação da informação são essenciais para o combate à doença. [O governo] Poderia dar uma prioridade e um tratamento mais cuidadoso e célere a essas questões”, finalizou.

O que é a Lei de Acesso à Informação

Promulgada em 18 de novembro de 2011, a Lei de Acesso à Informação (LAI) entrou em vigor seis meses depois. A lei tem como objetivo dar mais transparência ao governo e disponibilizar ao cidadão as informações de caráter público, instituindo obrigações, prazos e procedimentos para a divulgação de dados, prevista pela Constituição Federal de 1988.

De acordo com a Agência Senado, a lei vale para os três poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo), para o Ministério Público e para os tribunais de contas. Além do governo federal, estados e municípios são obrigados a garantir o acesso à informação, podendo editar leis próprias para regulamentação. Entidades privadas também devem garantir publicidade a informações referentes ao recebimento e emprego de recursos públicos.

Posicionamento do Governo 

Sobre os pedidos de informação citados, a Secretaria de Controle e Transparência (Secont) ressalta que:

O pedido nº 2020070806, registrado em 18/07,  referente aos dados sobre o aumento do número de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e enfermaria exclusivos para covid-19 por meio do programa Leito para Todos, foi atendido, tendo o autor recebido as respostas solicitadas em 30/07/2020.

Os pedidos 2020070810 e 2020070955, referentes às informações de agentes penitenciários afastados após serem contaminados pela covid-19 e a  respeito da quantidade de estudantes da rede pública estadual que estão estudando por meio de plataformas disponibilizadas pela Secretaria de Educação,  estão em fase de recurso, não cabendo à Secont fazer uma avaliação fora do âmbito da Comissão Mista de Reavaliação de Informações (CMRI), colegiado que preside e que atua como última instância recursal administrativa na análise de negativas de acesso à informação.

A Secont entende que, diante do aumento considerável do volume de informações solicitadas aos órgãos durante a pandemia, e pelo fato de que a pandemia gerou demandas que não eram acompanhadas pelas secretarias, nem sempre estes dados estão disponíveis de forma imediata com o detalhamento que se quer, ou em formato aberto, o que pode envolver consulta a diversas bases para se alcançar o objeto do pedido.

Falhas pontuais no atendimento podem ocorrer. Somente de janeiro a junho deste ano, a Ouvidoria-Geral registrou 1.946 pedidos de acesso à informação. Os dados mostram que houve aumento de 36% no total de manifestações recebidas (reclamações, denúncias, pedidos de informação) neste primeiro semestre, em função da pandemia. Muitas dessas manifestações, como já frisado, se referem a situações novas, que, por sua natureza excepcional, ainda não são provenientes de sistemas integrados.

Importante ressaltar que a Lei de Acesso à Informação (LAI) prevê a possibilidade do autor do pedido de informação recorrer nos casos em que a resposta não é satisfatória ou não é atendida, estabelecendo prazos para atendimento e mecanismos para corrigir possíveis falhas que ocorram no processo.

Quanto à disponibilização das respostas em formato aberto, esclarecemos que essa obrigatoriedade se aplica somente à transparência ativa – ou seja, às informações publicadas nos sítios institucionais -, não abrangendo a transparência passiva (pedidos de informação), como prevê a Lei de Acesso à Informação, em seu artigo 8º, § 3º, inciso III, muito embora seja uma boa prática recomendada pela Secont aos demais órgãos.

O Governo do Estado reitera seu compromisso com a transparência, que faz do Espírito Santo 1º lugar nos dois rankings nacionais que medem a capacidade do poder público de disponibilizar informações sobre a pandemia, elaborados pelas ONGs Transparência Internacional Brasil e Open Knowledge Brasil. Mesmo em um período difícil como o que passamos, o Estado optou por preservar os prazos de atendimento à Lei de Acesso à Informação (LAI), o que mostra a importância dada às demandas do cidadão.