Segurança pública: Espírito Santo teve mais de 500 casos de evasão do sistema prisional em 2019
O governo do Espírito Santo apresentou, em janeiro do ano passado, uma série de medidas para desafogar o sistema prisional do estado. Apesar do trabalho realizado, os presídios continuam superlotados
O encarceramento é uma das punições previstas no Código Penal brasileiro, para pessoas que cometem delitos ou infrações. Quando se fala em evasão, ou fuga do sistema penitenciário, a população tende a ficar em alerta. Entretanto, dentro de um sistema superlotado, o que esses dados representam para a segurança pública do estado?
De acordo com dados de Secretaria de estado de Justiça do Espírito Santo, (Sejus), 525 evasões foram registradas no sistema prisional do estado, no ano passado. Em relação às fugas, foram registrados 15 casos.
A Sejus define como evasão, os casos em que internos do sistema semiaberto, que possuem direito à circulação fora do presídio, seja por saída temporária ou por trabalho, não retornam à unidade. Já a fuga é caracterizada quando o detento empreende uma ação para escapar do presídio, burlando a segurança da unidade, ou em situações de movimentação, seja por audiência de custódia, atendimento médico, ou outros casos.
Segundo o defensor publico, Bruno Fernandes, os dados não são muito significantes, tendo em vista a quantidade de pessoas no sistema prisional do estado e o baixo percentual de detentos que não voltam para o sistema após as saídas temporárias, que é uma das medidas adotadas para a ressocialização.
"No mês de dezembro, mais de 1.500 detentos deixaram as unidades para a saída temporária de Natal e apenas 38 não retornaram. É um número baixo, quando comparado a população carcerária. [...] a questão das evasões é uma consequência da própria estrutura do sistema carcerário, que superlota todas as unidades do estado. Atualmente são 22.869 presos, em um sistema com capacidade para suportar 13 mil", pontuou.
Quem tem direito ao semiaberto?
De acordo com o artigo 112 da Lei de Execução Penal, o detento pode responder em regime aberto, caso a pena prevista seja inferior ou até quatro anos. Quando a pena prevista para o crime for entre 4 a 8 anos, o detento pode responder em regime semiaberto. A pena em regime fechado é prevista para crimes cuja pena seja superior a 8 anos.
Segundo o advogado criminalista, Felipe Martins, o detento que cumprir um sexto da pena, tiver boa conduta, endereço fixo e um parecer favorável da unidade em que ele está preso, pode ter direito à progressão de pena que conduz ao regime semiaberto.
Já nos casos de crimes hediondos, segundo o advogado criminalista Ludgero Liberato, a fração de tempo é calculada de outra forma e a legislação sofreu mudanças recentes, com o pacote anticrime. "Vários crimes classificados como hediondos têm prazo de progressão diferente, podendo chegar a três quintos da pena, em casos de detentos reincidentes, com o novo pacote anticrime", pontuou.
Ludgero explicou que o regime semiaberto e as saidinhas "são medidas necessárias para os detentos conseguirem a ressocialização. O poder público precisa qualificar esses detentos, para que eles sejam reinseridos no mercado de trabalho", afirmou.
O advogado Felipe Martins explica que o baixo número de evasão se deve ao fato de que é mais interessante para o detento permanecer na progressão de pena. "Se o interno se evade da unidade, ele vai constar como procurado da Justiça, terá um novo mandado de prisão em aberto e vai ter mais dificuldades em conseguir os atenuantes da pena".
"Pacote anticrime vai aumentar a população carcerária", diz advogado
O advogado Ludgero Liberato foi enfático em afirmar que as alterações no Código Penal, provocadas pela nova Lei Anticrime vão resultar no aumento da população carcerária no Brasil. "A meu ver, o pacote anticrime vai aumentar a população carcerária, que já está em condições desumanas".
A afirmação foi corroborada pelo defensor público, que apontou problemas nessa realidade. "O pacote anticrime prevê o aumento da pena máxima e punições mais rigorosas [...] isso agrava as consequências do encarceramento e resulta em mais gatos para a população, já que um detento pode custar até 3 mil (aos cofres públicos). Em muitos casos, um detento é mais caro que manter um estudante na escola".
ES reduz população carcerária, mas continua com superlotação
O governo do Espírito Santo apresentou, em janeiro do ano passado, uma série de medidas para desafogar o sistema prisional do estado. Entre as medidas, constam o uso do sistema eletrônico de execução penal; a realização de audiências de custódia por meio de videoconferência; a expansão do uso de tornozeleiras eletrônicas, além da criação de mais vagas no Complexo Penitenciário do Xuri, em Vila Velha.
De acordo com a Defensoria Pública, no primeiro mutirão carcerário do Brasil, realizado no Espírito Santo em setembro do ano passado, foram encaminhados à justiça quase mil solicitações de libertação ou de melhoria da condição de detentos. Metade desses pedidos já foi analisada. Entre outubro e dezembro, houve redução de 1092 internos no sistema penitenciário.
Apesar da redução observada, ainda são quase 9 mil detentos acima da capacidade do sistema. Segundo o defensor público, isso se deve, entre diversos fatores, a defasagem das instituições relacionadas ao Poder Judiciário. "É um quadro bastante compatível com os recursos humanos das organizações. Na Defensoria Pública, temos pouco mais de 10 defensores para atender o estado inteiro, pouco mais de 10 juízes no sistema penal pra fazer esse atendimento, além de defasagem nos próprios servidores da Sejus".
No mutirão realizado em setembro, segundo o defensor, foram analisados mais de 5 mil processos, entre pedidos de progressão de pena, uso de tornozeleira eletrônicas, remissão de pena, entre outros. No total, mais de 600 presos foram direcionados a penas alternativas, deixando o encarceramento. Entre os casos analisados, haviam 80 detentos com penas vencidas, mas que permaneciam em presídios.
O defensor destaca que a curto prazo, o problema do sistema prisional pode ser resolvido com medidas como fortalecimento das instituições, melhoria da tecnologia no sistema penitenciário e judicial, entre outras. "Mas a longo prazo, é preciso um trabalho do poder público, do governo federal, na criação de polícias públicas de assistencialismo", afirmou.