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Escolas do ES apostam no atendimento individual enquanto ensino presencial não retorna

O retorno às aulas presenciais ainda não foi liberado nas cidades em risco alto. Para ajudar no desempenho dos alunos, instituições investem em um contato mais acolhedor


Foto: Reprodução TV Vitória
Acolhimento e atenção especial em aula individual na Escola Americana de Vitória 

A Prefeitura de Vitória anunciou a volta às aulas presenciais na cidade a partir da próxima semana e o governo do Estado já sinalizou que pode flexibilizar o ensino mesmo nas cidades em risco alto. Mas, de fato, a única certeza que se tem até o momento é que, mais uma vez, a volta às aulas presenciais exigirá uma adaptação das escolas, alunos e família. 

As mudanças não têm relação apenas com a contenção da pandemia e segurança com a saúde, mas também devem considerar o acolhimento dos alunos.

Além do isolamento social vivido pelas crianças e adolescentes durante a quarentena, outras questões referentes ao assunto tiveram um impacto grande em suas vidas. Um deles é o receio de contraírem o vírus e, até mesmo, o luto que vivem pela morte inesperada de um parente ou alguém próximo.

Em meio a este cenário de incertezas alguns questionamentos são evidenciados e atravessam o cotidiano de pais e professores: como acolher os alunos é tão importante e como fazer isso de forma virtual e individual?

A diretora pedagógica da Cooperativa Educacional de Linhares (CEL) Queila Gomes Zorzanelli, que atende 404 alunos do ensino infantil e médio, a receita ´´para esse momento parece batida, mas é extremamente eficaz. 

"O acolhimento deve ser feito com carinho, respeito, mantendo o olhar individualizado e, principalmente, demonstrando confiança e afeição. Os vínculos são fortalecidos em todo o tempo, porém neste que estamos vivenciando atualmente, a instabilidade emocional de todos fica muito evidente", avalia Queila.

Para o vice-presidente do Sindicato das Escolas Particulares do Espírito Santo (Sinepe-ES), Eduardo Costa Gomes, o acolhimento é um trabalho de escuta e de conhecimento do que o aluno viveu. 

"O acolhimento vem com o grande objetivo de tentar identificar questões que aconteceram nesse momento de crise. É ter um espaço de fala onde as pessoas se apoiam, ganham força para isso e tem a ajuda de um adulto e de um colega para superar os medos, as angústias".

A psicopedagoga Letícia Regina Souza, da Faculdade Estácio de Sá, também reforça a importância de acolher pais e professores . 

“Os desafios foram e continuam sendo enfrentados tanto por pais quanto por professores. Passado tanto tempo de ensino remoto é inegável a sobrecarga e a exaustão de todos. É claro, colocadas as devidas proporções e diferenças socioeconômicas. Algumas famílias não conseguiram dar respostas eficientes para essa nova demanda. Por isso é fundamental dar atenção e entender o momento individual de cada um. Isso é acolhimento.”

Confira no vídeo o que fala a psicopedagoga sobre o acolhimento:

SAUDADE

Há dois meses tendo aula só de forma remota, Luíza Soares Guerra, de 14 anos, fala da expectativa em voltar para a sala de aula. Ela é aluna do 9º ano do ensino médio na Cooperativa de Ensino de Linhares (CEL) e afirma sentir muita falta do contato com os colegas

Foto: Acervo Pessoal/Reprodução/ Facebook
Luiza sente falta dos convívio com os amigos

"As aulas on-line estão sendo um desafio para todos nós, principalmente em relação a saudade, faz falta o contato com nossos amigos e professores, porque passamos grande parte do nosso tempo com eles, passam a ser como uma família para nós. No entanto, apesar de algumas dificuldades iniciais, como a de se concentrar ou ainda problemas com a internet, tudo está indo bem, os nossos professores são sensacionais e a escola está dando muito suporte. Mas estamos ansiosos para voltar o presencial, apesar do distanciamento, será ótimo matar a saudade!". 

Os pais têm papel fundamental neste atípico retorno às aulas. Se antes a adaptação escolar já exigia atenção especial, agora há diversos pontos a mais a se considerar. A dona de casa Lorena Soares, mãe de duas adolescentes, diz que é nítida a mudança de comportamento das  filhas quando o assunto é voltar ao convívio com os colegas de classe.

"Quando a escola voltou de forma mista, era perceptível a mudança nelas. Elas ficaram mais felizes, com mais energia para estudar. Chegavam em casa contando sobre coisas dos amigos. Mas, também entendo que precisamos ter cautela e cuidados com a saúde. É muito difícil viver nessa divisão", revela.

Para a médica infectologista Carolina Salume, o desafio tem sido fazer com que o filho Benjamin, de 4 anos, não perca a conexão com a escola. Ele estuda na Escola Americana de Vitória (EAV), e começou a ser alfabetizado no ano passado.

Foto: Reprodução TV Vitória
Benjamim no atendimento individual na EAV

"O Benjamin tinha acabado de entrar na escola quando começou a pandemia no ano passado e tivemos que nos adaptar muito rápido a essa nova realidade. Tivemos que desenvolver maneiras de manter a conexão dele com a escola e isso tem dado certo. O Benjamin está sendo alfabetizado e a nas aulas online ele dispersa muito, quer mostrar para os coleguinhas as coisas dele. A atenção e o acolhimento que a escola tem dado nesse sentido, tem sido fundamental. É desafiador, mas tem dado certo".

Manter a conexão entre os alunos e a escola é uma tarefa árdua e que exige muita dedicação. Na Escola Americana de Vitória, um aplicativo foi criado para que os alunos não perdessem o vínculo com os colegas e professores. E, a estratégia tem dado certo, é o que avalia a psicóloga da unidade, Beatriz Lavor.

"Estabelecemos um canal de comunicação muito aberto com as famílias e isso tem trazido retornos positivos. Os professores também estão empenhados em preparar aulas mais lúdicas e dinâmicas. Através de um aplicativo tantos os pais quanto os alunos podem ver a trajetória escolar dos estudantes. Lá, eles compartilham fotos, vídeos atividades e isso faz com que essa conexão com a escola não se perca. E essa sensação de pertencimento é nítida quando eles retornam para as aulas individuais."

Enquanto as aulas presenciais não são liberadas, muitas unidades começaram o atendimento presencial individual, mas através de agendamento. Duas vezes na semana, por duas horas, o aluno vai até a escola e tem contato direto com o professor, como uma aula particular, mas tendo contato com o ambiente escolar do qual faz parte e estava afastado.

Para a diretora pedagógica Queila, da Cooperativa Educacional de Linhares, esse contato, mesmo que rápido, já é um grande avanço para os alunos, em especial para aqueles que têm dificuldade com as aulas remotas. Um exemplo é o Lorenzo, de 10 anos, que tem déficit de atenção e precisou de um atendimento diferenciado.

Foto: Acervo pessoal
Marcela e o filho Lorenzo, aluno da CEL

"Ele se distrai com facilidade, vai muito ao banheiro, vai beber água, fica passeando pela casa. E sempre que terminava a aula ele reclamava de cansaço, dor de cabeça. Conversamos com a professora e a pedagoga dele e demos esse retorno. A escola foi procurando alternativas, que também não deram certo. Foi então, que me falaram da possibilidade dele retornar e fazer a aula individual. Tomando todos os cuidados, testamos e o resultado foi ótimo. O Lorenzo conseguiu assimilar muito mais o conteúdo das aulas", conta a mãe do menino, a empresária Marcela Ilha Lisboa. 

Agora, Lorenzo vai todo os dias para a escola e, com a ajuda de um monitor,  acompanha de lá as aulas dos professores. "Foi muito legal, me sentia muito ansioso em casa. Acho que aprendi mais perto da professora, fiquei bem feliz."

IMPACTO

O impacto da pandemia da Covid-19 na educação, desde quando as escolas foram fechadas, foi grande e agora é revelado em números: em 2020, quase 78 mil crianças e adolescentes ficaram de fora da escola no Espírito Santo devido à crise sanitária. Resultados de um levantamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), os dados referem-se aos alunos que abandonaram os estudos e também àqueles que não tiveram acesso a materiais de atividades não presenciais. 

Esses números, colocaram o Estado em 15º lugar no ranking de frequência escolar nos Estados durante a pandemia. Para a Unesco, os impactos do fechamento das escolas acarreta altos custos sociais e econômicos para as pessoas nas diferentes comunidades e particularmente grave para os alunos mais vulneráveis. Entre os aspectos mais sentidos estão: aprendizagem interrompida; má nutrição - muitas crianças dependem das refeições fornecidas pelas escolas; estresse para professores; altos custos econômicos; pais despreparados para a educação à distância; aumento das taxas de abandono escolar e isolamento social. 

Segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca de 44 milhões de crianças e adolescentes passaram da sala de aula para o ambiente online devido à pandemia em 2020 no Brasil. Destes, 5,5 milhões não conseguiram continuar o aprendizado em casa, abandonando os estudos.

Uma das primeiras medidas tomadas por governos de todo o mundo no começo da pandemia de Covid-19, em março de 2020, foi o fechamento das escolas. Após um ano, em 73 países os alunos ainda estão fisicamente longe das salas de aula. O Brasil foi um dos países onde as escolas ficaram fechadas por mais tempo e, ainda hoje, 18 estados mantém o ensino apenas de maneira remota, enquanto os outros tentam equilibrar uma forma híbrida entre o presencial e o ensino a distância.